Este artigo não pretende jogar luz nas sombras e nem apresentar uma tese que explique definitivamente o governo Dilma e suas misteriosas contradições. É apenas uma tentativa de repassar os fatos desde que Dilma recebeu do povo, por direito constitucional, seus mandatos presidenciais.
É preciso dizer que Dilma e, principalmente, Cardoso, devem seus cargos públicos à existência e ao trabalho de uma única pessoa: Lula. Essa é a maior verdade de todas, pois nenhum dos dois teria condições de estar onde estão sem os votos que vieram através de Lula, e isso é fato.
Escrevo isso porque acho que esse é um ponto crucial a partir do qual se pode sondar a relação entre Lula e Dilma ao longo dos anos e é fundamental para tentar entender muitas coisas.
Desde 2010 que esta relação não é bem resolvida, principalmente na montagem do governo Dilma, e essa percepção aumentou a partir de 2013 quando, de verdade, Dilma passou a ser cobrada como Presidente.
Sempre se sentiu no ar uma tentativa tênue de descolamento do governo Dilma do período Lula, principalmente no que diz respeito ao julgamento moral/seletivo/midiático que vem desde o mensalão. Isso se precipitou em 2013, em meio às manifestações já controladas pela mídia.
Sob a batuta de Mercadante e Cardoso, o governo Dilma se colocou de joelhos ao discurso moralista e seletivo da mídia. Essa vacilação política, construída pela dupla responsável por buscar um caminho de distanciamento do período Lula, foi que abriu brechas para toda a crise que vivemos hoje.
O caso Petrobrás é exemplar. A incrível demora em dar respostas políticas e técnicas contundentes no início da crise, quando a mídia contestava a compra de Pasadena, foi decisiva para dar força à Lava Jato.
Sob a direção de Cardoso e Mercadante, Dilma não disputou a opinião pública, apenas se restringiu a dar respostas à mídia e, jogando o jogo no campo do adversário, colocou seu governo e o projeto político de mais de uma década sob a espada do inimigo.
Talvez se a doença de Lula tivesse sido fatal nada disso estaria acontecendo, pois sem Lula a direita teria voltado ao poder em 2014. Mas a sua vitória sobre o câncer embaralhou o jogo político e fez brotar o ódio em todos os cantos. O fantasma Lula já assustava em 2014, tanto a direita quanto o estafe de Dilma, pois sua candidatura seria imbatível naquele momento.
Como já escrevemos outras vezes, a vitória de Dilma (por causa de Lula) e a possibilidade da volta do ex-Presidente em 2018 precipitou o golpismo. Daí, os olhos de todos se voltam para Cardoso, o mais longevo Ministro da Justiça da República, quando se descobre que no seio das investigações há um verdadeiro estado de exceção montado por setores dissidentes do aparelho de Estado, sob as barbas do Ministro, para perseguir o PT e Lula.
A situação se torna mais grave quando em meio ao maior processo de caça e aniquilamento do PT e de Lula, o Ministro dá uma entrevista para a mídia tradicional dizendo que o maior legado do governo Dilma será o combate à corrupção. Como?
Setores dissidentes do aparelho de Estado em aliança com a mídia promovem vazamentos seletivos contra Lula e o PT, grampos ilegais na carceragem da PF não são investigados, o tesoureiro do PT é preso (por que só ele se outros tesoureiros de partidos manipularam recursos da mesma fonte?), desvios de investigação na Lava Jato e na Zelotes mirando Lula e aliviando para a própria mídia e para sonegadores, Eduardo Cunha livre, leve e solto comandando votações na Câmara enquanto José Dirceu mofa na carceragem da PF do Moro e Aécio (citado cinco vezes na Lava jato) posa de bastião da oposição e isso é que vai ser o legado de Dilma na opinião do Cardoso?
A reação de profundo desagrado da mídia com a mudança de Cardoso pelo Procurador baiano Wellington César, ligado a Jaques Wágner, já mostra qual era o papel que desempenhava o ex-Ministro: parceiro da mídia!
Não acredito que a mudança representará uma revolução, até porque Cardoso conseguiu que o golpismo ganhasse grande poder na opinião pública. Mas se o novo Ministro começar já dando sequência nas investigações do grampo ilegal na carceiragem e outras denúncias de abuso de poder já será um avanço.
Mas mudança maior é a que envolve Dilma, Lula e o PT. Dilma e seu governo são um mistério quase insondável. Se elegeu com a força de Lula e o compromisso com sua base social mas iniciou o governo nos braços do 'mercado'. Foi salva do impeachment por causa da mobilização da Frente Brasil Popular mas inicia 2016 acenando uma Reforma da Previdência para o 'mercado'. Aprova no Parlamento a lei dos royalties do pré sal para a educação e saúde mas fecha acordo com Serra e Renan na última hora para abrir as reservas às petroleiras internacionais falidas e, sob críticas, falta à festa de aniversário do partido.
Cresce uma interrogação na cabeça do petismo: para onde vai Dilma? A mudança de Cardoso da Justiça para a Advocacia-Geral coloca o ex-Ministro onde sempre devia ter estado, ao lado da defesa pessoal de Dilma e abre brecha para o crescimento de Lula no governo. A tríade lulista está formada quase um ano e meio depois da posse: Barbosa na Fazenda, Wágner na Casa Civil e um novo Ministro da Justiça ligado a ele.
Só o futuro dirá o que vai acontecer, principalmente após o discurso de Lula no aniversário do PT. Mas há algo inescapável: a história fará jus à passagem de Cardoso pela Justiça, se fará.
Ricardo Jimenez
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