Que o Ensino Médio precisa ser reformado é ponto pacífico. Que qualquer reforma que mexa nos alicerces da educação básica deve ser feita a partir de um amplo diálogo nacional, idem.
Mas eis que o governo Temer, que se constituiu na esteira de um golpe, de uma usurpação do poder cassando-se 54 milhões de votos, resolve decretar por Medida Provisória uma 'reforma do Ensino Médio'.
Toda a comunidade acadêmica, os atores educacionais brasileiros, foram excluídos desse debate, bem ao gosto do modo tucano/mercadista de governar, tão conhecido por nós paulistas há 24 anos.
E como os grupos coxinhas, que vestem camisa da CBF/Nike, fazem campanha para tucanos, gostam do Cunha e torcem por Temer, andam espalhando por aí que Dilma 'também faria a reforma', nós já começamos dizendo: é verdade.
Mas qual a diferença do que Dilma propunha do que é imposto agora?
Dilma, assim como no governo Lula, visava as mudanças educacionais pautadas no Plano Nacional de Educação, inclusive com perspectivas de ampliação do financiamento, como a aplicação dos 10% do PIB e a valorização salarial dos profissionais da educação, somada à lei que destinaria recursos dos royalties do pré-sal para fortalecer essa política.
Todos os avanços educacionais dos últimos 13 anos que incluíram milhões de novos estudantes nos ensinos superior e técnico vieram dessa visão da educação como um direito universal.
O orçamento da Educação cresceu 218% em 13 anos, saindo de 18 bi em 2002 para 218bi em 2014, com inclusão de recursos muito superiores à inflação e à variação do PIB.
Os mais de 600 campi do Instituto Federal de Educação Básica, Técnica e Tecnológica espalhados pelo país por Lula e Dilma apontam para essa realidade: a possibilidade da população jovem e trabalhadora acessar o ensino superior técnico ou de licenciatura, com professores bem pagos, selecionados em concursos exigentes e incentivados a realizar pós-graduação e aperfeiçoamento contínuo, com estrutura adequada para oferecer um ensino amplo e em tempo integral.
Os equívocos existentes na proposta feita por Dilma certamente seriam motivo de debates como os que ocorreram nas várias Conferências para debater a educação realizadas no período do PT. Jamais seria algo imposto de cima para baixo.
A 'reforma Temer/Mendonça' não visa nada disso. É um arremedo de reforma feita sob medida para a agradar ao 'mercado' e ao pensamento neoconservador que luta pelo tal projeto 'Escola Sem Partido', uma tentativa torpe de amordaçar a liberdade de cátedra dos professores não-alinhados ao golpismo que ora se impõe, principalmente contra os professores de Humanas.
Somada à PEC 241, que procura congelar o investimento público por 20 anos, inclusive em saúde e educação, a tal 'reforma' aponta para o sucateamento da educação básica pública abrindo um viés privatista, como já ocorre em algumas administrações estaduais tucanas.
Se a PEC 241 estivesse valendo desde 2003, o orçamento da Educação seria 72 bi em 2014, ou seja, um terço do valor real, impossibilitando os avanços na oferta que ocorreram no período e que permitiram a inclusão de milhões de jovens.
Assim como ocorre no pré-sal e na Petrobrás, com fatimentos e privatizações à conta-gotas, é o pensamento tucano que está por trás da 'reforma Temer/Mendonça'.
Sem o respaldo do financiamento público, que estará congelado por 20 anos, as esferas públicas municipais e estaduais, já asfixiadas por um modelo econômico que destina 45% das arrecadações para o pagamento de juros e dívidas (recursos que não serão afetados, obviamente, pela PEC 241) e que concentra recursos na União, não terão condições de implementar as mudanças da 'reforma', ou seja, a ampliação da oferta de tempo na escola para o período integral e a oferta de cursos técnicos.
É aí que entra a agenda tucana: entregar parte da rede, aquela em melhor estado e com mais potencial, para as OSs, as tais Organizações Sociais, ONGs ligadas aos grandes conglomerados empresariais da área de educação particular. Transformar a carreira pública docente numa carreira terceirizada, como já ocorre com outros profissionais da educação dentro do sistema atual.
Assim, a parte do sistema considerada 'filé mignon', como as escolas centrais, será 'administrada por ONGs, as outras, nas periferias e rincões do Brasil, permanecem com o setor público, abandonadas e repletas de jovens também abandonados, como já se vislumbra hoje em dia.
Para os jovens mais 'avançados' haverá um prêmio neoliberal: receberão um vaucher, uma bolsa de estudos, que possibilitará que ele estude em uma escola particular e tenha, quem sabe, a chance de sentar num banco de universidade.
Assim voltamos aos anos 90: pobres completamente excluídos da universidade, da formação superior e do direito à uma educação de qualidade e uma educação pública inoperante e distante do que preconiza a Constituição de 1988: educação como um direito universal de todo o cidadão.
A 'reforma educacional Temer/Mendonça' é parte da reformulação do Estado comandado pelo golpismo e pela agenda neoliberal (aquela que sofreu quatro derrotas seguidas para o PT e que agora volta a partir de um golpe na democracia): Estado mínimo para o povo e Estado máximo para o setor financeiro e rentista.
O Calçadão
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