Ex-presidente do Uruguai José Mujica na II Feira Nacional da Reforma Agrária |
"A terra não pode ser um calvário de pobreza, tem que
ser também um instrumento de libertação, para compaixão e poesia, e não apenas
para negócios. Tem que colocar a alma para plantar. Terra plantada sem alma é
um fracasso".
De origem camponesa e com discurso socialista, Mujica
criticou também o uso desenfreado de tecnologias no campo e os impactos no meio
ambiente e na biodiversidade. "O homem nunca teve os meios que tem hoje.
Se pensarmos, tecnicamente, pela acumulação de capital e conhecimento, o homem
poderia lidar com as misérias fundamentais, reverter muitos desastres. Uma
civilização que inventou as mais incríveis tecnologias, mas hoje é dominada por
elas, e não o contrário. Isso porque o motor dessa energia formidável é a
ganância. Já faz mais de 30 anos que os homens da ciência nos disseram o que
tínhamos que fazer, e por incompetência política não fizemos", afirmou.
Na opinião do ex-presidente, a resistência camponesa e a
união entre os povos latino-americanos são passos fundamentais para a
transformação dessa realidade.
"Por isso estou aqui, além de ser latino-americano,
porque o mundo está padecendo pela pressão do capital financeiro e das grandes
empresas. Não há crise ecológica, há crise política. Faltou luta política para
intervir nos interesses. O continente latino-americano, o mais rico em recursos
naturais, é o mais injustiçado. Para sermos fortes, temos que ter coragem de
nos juntarmos. Eu creio no destino desafiador da América Latina, mas ninguém
vai nos dar nada de graça, sem lutas sociais não há mudança", acrescentou.
Mujica também defendeu a importância do MST e declarou apoio
aos militantes do movimento no atual contexto político brasileiro. "Os
lutadores sociais são a base da história, tem sido desde sempre. Por isso estou
aqui e seguirei estando. O fracasso que tivemos será irreversível para a
natureza, mas temos que criar novas realidades nessas condições, e não viver de
nostalgia. A terra não deve ser propriedade privada, ela pertence à humanidade,
e muito mais do que um problema de concentração de terra, o Brasil está
sofrendo uma dicotomia de sua própria história. Só resolvemos esse paradigma
com luta de classes e luta social".
Em relação à relevância da Feira Nacional da Reforma
Agrária, Mujica destacou o papel essencial da produção de alimentos na cultura
humana. "Nada é mais importante do que a comida, e ela vem do cultivo e do
trabalho da terra. Temos que cuidar da saúde e da cultura. Se perdemos o ofício
de cozinhar perdemos a essência da cultura humana", afirmou.
José Mujica participou também da Conferência
"Alimentação Saudável: um Direito de Todos e Todas", com a atriz
Letícia Sabatela, o ex-Ministro da Saúde Alexandre Padilha, a apresentadora
Bela Gil e a liderança do MST, João Pedro Stedile. O evento ocorre na manhã
deste sábado (6) na Feira Nacional da Reforma Agrária, que vai até este domingo
(7), às 19h.
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