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sábado, 12 de junho de 2021

Mbeme e a Necropolítica - por Matheus Arcaro

             
            O camaronês ACHILLE MBEMBE (1957-) tornou-se merecidamente conhecido por conta de seu ensaio lançado em 2011, que leva o título de seu principal conceito: necropolítica.


O ponto de partida do intelectual africano é a noção de biopoder, de Michel Foucault (1926-1984). Foucault assevera que a sociedade disciplinar (aquela que diz o que é ou não é normal) exerce poder sobre os corpos dos indivíduos e sobre as populações de modo geral. O biopoder atua extraindo do corpo humano sua força produtiva e regulando as massas para gerir taxas de natalidade e fluxos migratórios, por exemplo.

Mbembe vai além de Foucault com a noção de necropolítica. Em uma frase, a necropolítica é o poder de ditar quem pode viver e quem deve morrer. A vida e a morte passam a ser do âmbito da gestão do poder. Até hoje, mesmo depois dos horrores do holocausto e do fascismo, alguns discursos de Estado chancelam regimes autoritários e extermínios populacionais, mesmo que indiretamente.

Além da morte executada pela violência do Estado, é preciso pensar no direito de expor pessoas à morte, que colocam alguns indivíduos na condição mortos-vivos, em um estado constante de tensão entre vida e morte. Pensemos, como exemplo, na morte por afogamento de milhares de africanos tentando uma vida melhor na Europa ou nos mexicanos mortos ao tentarem entrar nos EUA.

É preciso pensar também em como a necropolítica está entranhada no dia-a-dia das ditas democracias. Olhando para o Brasil, reflitamos: quais os corpos mais expostos à morte, seja pelo tráfico, seja pela polícia, seja pela fome? Ou seja, quais corpos são mais “matáveis”? A resposta, infelizmente, é óbvia: os corpos negros, indígenas e pobres. Há vidas que, mesmo nas democracias, são menos valiosas que outras. Sendo mais enfático: há vidas que o sistema considera descartáveis.

Por fim, suponhamos que estivéssemos numa pandemia que compromete o aparelho respiratório e não há respiradores para todos. Quem teria prioridade?

  

*Matheus Arcaro é mestre em Filosofia Contemporânea pela Unicamp. Pós-graduado em História da Arte. Graduado em Filosofia e também em Comunicação Social. É professor, artista plástico, palestrante e escritor, autor do romance O lado imóvel do tempo (Ed. Patuá, 2016), dos livros de contos Violeta velha e outras flores (Ed. Patuá, 2014) e Amortalha (Ed. Patuá, 2017) e do livro de poesia Um clitóris encostado na eternidade (Ed. Patuá, 2019). Também colabora com artigos para vários portais e revistas.
site: www.matheusarcaro.art.br

 

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