AGRICULTURA
Para ANFFA, da forma como está, PL 1293/21 impede os agentes federais de regularem e fiscalizarem a atividade agropecuária colocando o interesse privado acima da proteção da coletividade.
A Câmara dos Deputados está discutindo a implementação de PL que autoriza os produtores e a indústria a implantar programas de autocontrole sobre a segurança dos seus produtos e, praticamente, impede a ação dos auditores fiscais federais agropecuários de regularem e fiscalizarem a atividade.
O Projeto de Lei
1293/21, do Poder Executivo, que substitui a legislação atual de defesa
sanitária por um novo modelo de fiscalização agropecuária, baseado em programas
de autocontrole executados pelos próprios agentes regulados (produtores
agropecuários e indústria), tramita na Câmara dos Deputados a passos largos.
De acordo com o
governo, o PL do autocontrole atende uma exigência do mercado, dando maior
autonomia e responsabilização aos fabricantes de insumos e produtos
agropecuários, “permitindo que o Estado direcione as ações de controle para as
atividades de maior risco”.
Todo o processo será “autoauditável”
Segundo o PL, os produtores e a indústria deverão implantar programas de
autocontrole sobre a segurança dos seus produtos, contendo registros sistematizados
e auditáveis de todo o processo produtivo, desde a recepção da matéria-prima
até o produto final.
Os próprios
produtores serão responsáveis pelas medidas para recolhimento de lotes em
desconformidade com o padrão legal e os procedimentos de autocorreção, cabendo ao
Ministério da Agricultura estabelecer os requisitos básicos necessários ao
desenvolvimento dos programas de autocontrole e elaborar manuais de orientação
para o setor produtivo. Os manuais de orientação serão realizados em
parceria com as empresas, o setor privado responsável pelo autocontrole.
Programa de Incentivo à Conformidade em Defesa da Agropecuária
Para tratar dos procedimentos aplicados pela defesa agropecuária, o PL criará o Programa de Incentivo à Conformidade em Defesa Agropecuária. De acordo com o PL, a aceitação será de livre escolha,
mas quem aderir terá o benefício de não sofrer autuação, multa, caso cometa alguma irregularidade sanitária, bastando adotar as medidas corretivas indicadas na notificação. Outros incentivos ainda serão definidos em regulamento.
Em troca, as empresas
e produtores participantes deverão compartilhar com a fiscalização
agropecuária, em tempo real, dados operacionais e de qualidade.
Registro
O
projeto também prevê medidas voltadas ao registro e rotulagem de produtos por
meio eletrônico. A ideia dos propositores da bancada ruralista é que o
Ministério da Agricultura coloque à disposição este serviço para receber pedidos
de registro, cadastro ou credenciamento dos estabelecimentos para a concessão dos
documentos que possuam parâmetros ou padrões normatizados.
Multas
A
proposta do governo também atualiza o valor das multas aplicadas nas infrações
constatadas durante a fiscalização agropecuária. Inicialmente, o valor seria de
até 150% do valor atribuído ao lote do produto, se este estiver identificado na
natureza comercial da atividade e o valor especificado na nota fiscal ou
fatura. Caso não esteja, a multa variaria entre R$ 100 e R$ 300 mil, conforme a
classificação do agente infrator e a natureza da infração (leve, moderada, grave),
sendo que, caso a multa fosse paga em até 20 dias, o valor seria reduzido em 25%.
O texto também impõe regras às medidas cautelares que poderão ser aplicadas
pelos auditores fiscais federais agropecuários e o processo administrativo de
fiscalização agropecuária.
Deputado Domingos Sávio, relator da proposta na Comissão de Agricultura Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados |
Entretanto, nesta quarta-feira
(14), relator do Projeto de Lei 1293/21, o deputado Domingos
Sávio (PSDB-MG), anunciou, em audiência na Comissão de Agricultura da Câmara
dos Deputados, a intenção de mudar a gradação das multas cobradas por quem
descumprir normas de defesa agropecuária, além da diminuição substantiva no
limite máximo a ser pago pelo infrator quando este tiver especificado o valor
de seu lote.
A proposta do relator
segue os interesses dos empresários do agronegócio e deve limitar o novo valor
a R$ 50 mil.
Para o relator Domingos
Sávio a punição não pode ser “exagerada”.
“A punição tem que
estar presente, mas sem exagero. Em vez de termos três tipos de punição (leve,
moderada e grave), estamos trabalhando para dividir em quatro grupos: leve,
moderada, grave e gravíssima”.
ANFFA critica PL do autocontrole
Em nota publicada no dia 16 de abril, o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Agropecuários criticou
o PL 1293/21 da forma como está elaborado. De acordo com a ANFFA, garantir
o cumprimento das legislações que cuidam da defesa agropecuária e dos
compromissos internacionais assinados pela União, cabe exclusivamente ao poder
público, ao Estado., É ele quem deve exercer o poder de polícia e, consequentemente, desenvolver
as atividades de vigilância e defesa sanitária vegetal e animal, a inspeção e
classificação de produtos de origem vegetal e animal, seus derivados,
subprodutos e resíduos de valor econômico e a fiscalização dos insumos e dos
serviços usados nas atividades agropecuárias.
“O
PL 1.293/2021 define Defesa Agropecuária como“estrutura constituída de normas e
ações que integram sistemas públicos e privados, destinada à preservação ou à
melhoria da saúde animal, da sanidade vegetal e da inocuidade, da identidade,
da qualidade e da segurança de alimentos, insumos e demais produtos
agropecuários”. ‘A
Fiscalização Agropecuária é definida como ‘atividade de controle, supervisão,
vigilância, auditoria e inspeção agropecuária, no exercício do poder de polícia
administrativa, com finalidade de verificar o cumprimento da legislação’.
As duas definições expressam a completude
da atividade e sua sujeição ao regime jurídico administrativo, de direito
público, como expressão do poder de polícia e atividade exclusiva de Estado”.
Já existe o SUASA
O Sindicato afirma
que a participação da sociedade organizada, dos interesses econômicos nas
atividades de Defesa Agropecuária, com a intenção de promover a saúde, as ações
de vigilância e defesa sanitária dos animais e dos vegetais já são organizadas no
Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária - SUASA, do qual
participam os serviços e instituições oficiais; os produtores e trabalhadores
rurais, suas associações e técnicos que lhes prestam assistência; os órgãos de
fiscalização das categorias profissionais diretamente vinculadas à sanidade
agropecuária; e as entidades gestoras de fundos organizados pelo setor privado
para complementar as ações públicas no campo da defesa agropecuária.
Para a ANFFA, a simples previsão de programas de “autocontrole” não é inovação. É
pressuposto para a sua adoção que haja meios efetivos de auditoria e controle
por parte da Defesa Agropecuária, para manutenção de sua validade, e ressalvas
para que
“[...]em nenhum momento o “autocontrole” possa impedir ou
limitar a capacidade de atuação e intervenção do Poder Público.
Contudo, a simplificação administrativa, as
limitações à atividade regulatória do Estado e a atuação da do setor privado em
ações de defesa agropecuária não podem ser colocados acima do interesse
público, e impedir o exercício de atividades de regulação e fiscalização, ou
desautorizar seus agentes, colocando o jus imperium em
segundo plano, quando necessário à proteção da coletividade”.
De acordo com o sindicato, sob o pretexto de colaboração, o PL 1293/21, na prática, autoriza o setor
privado a invadir as prerrogativas e atividades exclusivas de Estado. A ANFFA afirma
que os interesses privados não podem ser mais importantes do que o interesse
público.
“Em lugar de adotar medidas de
fortalecimento institucional aderentes aos princípios defendidos pelo TCU e
compatíveis com a Constituição, o PL 1.293/2021, em alguns momentos, coloca em
risco a separação de responsabilidades entre o poder público e a iniciativa
privada e contribui para uma redução do papel da fiscalização, a pretexto de
conferir maior capacidade de atuação dos agentes privados em atividades
produtivas, cuja necessidade e importância é reconhecida, mas que não pode se
dar à revelia da supremacia do interesse público.
O Anffa Sindical alerta: na forma
proposta, o PL 1.293/2021 requer um exame mais aprofundado, à luz de riscos e
danos à sociedade”.
Fontes: Agência Câmara de Notícias e ANFFA
Edição: Filipe Augusto Peres
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