Páginas

quinta-feira, 21 de outubro de 2021

Assentados da Fazenda da Barra denunciam descaso dos governos federal e municipal com o assentamento

 

Organizadores entendem que a Reunião Pública foi a primeira de muitas que virão.
Fotos: Filipe Augusto Peres 

Nesta quarta-feira (20), na Câmara Municipal de Ribeirão Preto, em Reunião Pública para debater os problemas do assentamento da Fazenda da Barra, assentados denunciaram descaso do poder executivo em relação aos assentamentos.


Chamada pelo Coletivo Ramon Todas as Vozes (PSOL) e o vereador França (PSB), durante a reunião, assentados e assentadas reclamaram da falta de apoio do poder público municipal para que os assentamentos possam se desenvolver. Tanto a organização da reunião como a condução da mesa foi realuzada pela co-vereadora Mileide Melo.

Co-vereadora Mileide Melo (PSOL) foi responsável pela organização e condução da Reunião Pública.


Questões como falta de saneamento básico, falta de água encanada, má condições das estradas e falta de apoio local à agricultura familiar regional, produzida sem o uso de agrotóxicos, foram alguns dos elementos levantados pelos presentes.

O vereador Ramon Faustino destacou que os problemas que acometem os assentamentos Mário Lago, Índio Galdino e Santos Dias são antigos e estruturais. Para o vereador, o descaso dos governos federal e municipal gera um sentimento de abandono na população que vive no território de reforma agrária da Fazenda da Barra.

"O sentimento que a gente tem em relação à prefeitura e ao poder público é o abandono de uma área importantíssima para a nossa cidade, uma área antiga, com problemas crônicos também antigos, recorrentes que não saem do papel."

Faustino relatou, ainda, que as reivindicações dos assentados serão levadas à prefeitura. 

Ramon Faustino destacou que os problemas estruturais são antigos e atingem questões como Educação, Transporte, Produção, Água e Saneamento Básico.

Neusa Paviato, da Direção Estadual do MST, lembrou que os mais de 1700 hectares do assentamento de reforma agrária é uma conquista da classe trabalhadora. Paviato reforçou que a desapropriação da área não se deu, somente, pelo não cumprimento da função social da terra, como manda o artigo 5 da Constituição, mas também pela questão ambiental, uma vez que o antigo proprietário estava degradando totalmente a área.

"[...]a gente conquistou ela (a Fazenda da Barra) por não cumprimento da função social e ambiental, que vinha sendo degradado, aquele espaço, um espaço rico dentro de Ribeirão Preto".

Tendo participado de todo o desenvolvimento e lutas do assentamento Mário Lago, Neusa Paviato lembrou que 18 anos de reivindicações não são 18 dias.


Presidente a Cooperativa Orgânica Agroflorestal Comuna da Terra, militante do MST e assentado pela Reforma Agrária, Lucinei Ferreira (Nei) reforçou o discurso de Neusa e Ramon sobre as dificuldades que os assentados passam pelo esquecimento  do governo federal, assim como do governo municipal. De acordo com Nei, a falta de apoio do poder público dificulta o trabalho de recuperação da área devastada pelo antigo proprietário.
"O antigo proprietário destruiu, desmatou toda a área e hoje, nós vemos que é muito difícil recuperar, principalmente por conta de não termos nenhum tipo de apoio do governo federal. O governo municipal, acredito, também tem uma parcela de responsabilidade, mesmo porque o assentamento fica dentro do território de Ribeirão Preto". 

O Presidente da Comuna da Terra enalteceu o papel que os assentados vem tendo para lutar pela preservação da água que os ribeiro-pretanos bebem. 
"É impossível falar que só o governo federal seria o responsável por aquela área. [...] A gente ajuda a preservar a água que toda Ribeirão Preto bebe e é um sonho nosso estarmos nessa área para podermos ajudar a preservar e produzir." 

Nei lembrou que a luta atual do MST não é apenas produzir, mas também preservar e desenvolver o meio ambiente.
"Hoje, a nossa luta, não é apenas produzir mas, também, preservar, trabalhar com a agrofloresta, com agroecologia. Nós temos a consciência de que só produzir não é suficiente, mas que é preciso produzir com consciência".  

O agricultor familiar lembra que com menos da metade do assentamento produzindo, o território já produz alimentos sem agrotóxicos para entregar nas escolas de Ribeirão Preto e região. 
"Se o governo acreditasse, se todo o assentamento estivesse produzindo, a Fazenda da Barra pode produzir alimentos para toda Ribeirão Preto e região, até porque a Comuna, produz, hoje, alimentos para as prefeituras de Ribeirão Preto, Franca, Pontal, Guariba. [...] É uma capacidade imensa de produção de alimento desperdiçada dentro de Ribeirão Preto". 
Lucinei Ferreira, presidente da Comuna da Terra, destaca o potencial de produção de alimentos saudáveis que a Fazenda da Barra possui, se tiver apoio público.

Presidente do CONSEAN (Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional), Luciano Botelho, trouxe em sua fala a memória de que em 2020, o Ministério Público Federal, diante da recusa do governo de Duarte Nogueira em implementar o saneamento no PDS da Barra, condenou tanto a Prefeitura como oe Departamento de Água e Esgoto do município (DAERP) a oferecerem projeto de implementação da rede de saneamento básico no assentamento rural.  
"Olha a que ponto nós chegamos. Do MPF ter de entrar com uma ação obrigando o poder público a fazer aquilo que ele já deve fazer, obrigando a dar água e esgoto de qualidade".

Em relação ao INCRA, Luciano lembrou que o assentamento Mário Lago é uma referência nacional quando se pensa no modo de produção agroflorestal, mas que esta só foi conquistada porque alguns produtores conseguiram acesso à água. 
"Aqueles que não tem acesso à água não tem como produzir. Nesse sentido, produzir é um ato de resistência. [...] Não foi feita a distribuição de água, foi feita com mangueira de irrigação. Uma mangueira que, no seu interior, vai parando lodo e colônias de bactérias. Ou seja, os assentados estão tomando cloriformes fecais estafilococos. É disso que estamos falando. Nós não temos a dignidade necessária de investimento público, as pessoas não tem uma dignidade para uma vida plena e saudável. De 2016 para cá, nem preciso falar, a política pública não existe para assentamento". 
Presidente do COMSEAN, Luciano Botelho trouxe a atual ação civil pública que o MPF move contra a prefeitura de Ribeirão Preto, obrigando-a a levar água e saneamento básico à população.

Em sua fala, o vereador França chamou atenção para a importância da Reforma da Agrária, não apenas para os assentados, para a população da cidade. 
"É inadmissível e não dá para ter uma qualidade de vida em um bairro com 50.000 pessoas. Isso a sociedade precisa entender. A alternativa a isso é a reforma agrária. Ela é importante para que se resolva o problema dos bairros nas cidades. Você vai diminuir a quantidade de pessoas, o que diminui os problemas. Mas para isso é preciso ter uma política de reforma agrária".  

França lembrou que em 2010 houve um TAC (Termo de Ajuste de Conduta) entre o INCRA, o Ministério Público Estadual e o PDS da Fazenda da Barra. De acordo com o vereador psbista, o fato de o TAC não ter incluído o município gerou o problema. 
"A fazenda está dentro do município e o TAC não inclui o município. Aí é que entra o imbróglio de toda a situação". 

Para o vereador o que ocorre com os assentamentos da Fazenda da Barra é uma proposta política de destruição do governo Nogueira.
"Por que uma política de destruição? Nós estamos no coração do agronegócio deste país. É inadmissível um país que é campeão em produção de grãos e você ter a população passando fome porque quem controla isso é meia dúzia que não quer a Reforma Agrária".

E fez uma denúncia:
"O Ministério Público, o Incra, tem insistido para o prefeito da cidade se inscrever no programa Plataforma + Brasil, que a grana está lá. A verba está lá nesse programa: Plataforma Mais Brasil"
França denunciou que o prefeito não se inscreveu na Plataforma +Brasil porque não quis e não quer.

Para a vereadora Judeti Zilli, do Coletivo Popular Judeti Zilli (PT), existem duas Ribeirão Preto, uma que existe da avenida 9 de Julho para cima e outra que existe da região da 9 de Julho para baixo. De acordo com Judetti, quem vive no PDS da Barra, na região Norte e nas grandes periferias sentem o efeito da ausência das políticas públicas em todas as dimensões.
"Estamos falando de todo um sistema que privilegia o capital em detrimento à vida".

Judetti reforçou que todos que estiveram presentes, de alguma forma, caminham na contramão da exterminação capitalista. Para Zilli, o que há em cada um é um compromisso de vida política, de transformação do sistema.
" A gente vai na contramão de tudo isso. Eu quero pontuar o nosso dever de nos comprometermos com nossa causa que foi justamente isso que nos trouxe até aqui. Cada um de nós que participamos dessa atividade temos um compromisso na vida, extremamente político, de transformação de tudo isso e, grosso modo, em linhas gerais, é contra este sistema capitalista, neoliberal, machista, racista que exclui a vida".

A co-vereadora pelo mesmo mandato, presidenta da ONG Casa da Mulher, Adria Maria reforçou as palavras de Judeti e chamou a atenção para que se construa propostas de enfrentamento.
A vereadora Judeti Zilli fala observada por Neusa Paviato.

A importância da produção do assentamento Mário Lago e da parceria do MST com a UMM e a Rede Agroflorestal 

Integrante da União dos Movimentos de Moradia e liderança da Comunidade Cidade Locomotiva, Platinir Nunes disse que o poder público pouco ou nada fez pelas comunidades urbanas em Ribeirão Preto e pelo PDS da Barra. Platinir lembrou a importância da parceria entre o MST e a UMM diante do descaso do governo municipal com a população em situação de vulnerabilidade. A liderança falou sobre as diversas ações solidárias que o MST, em parceria com a Rede Agroflorestal, realizou, em várias comunidades urbanas ao longo da pandemia.
"Esse casamento (UMM/MST) nos alimentou na pandemia. Estou falando de 20 comunidades, milhares de famílias onde tivemos onde tivemos a oportunidade de termos 42 toneladas de alimentos saudáveis doados ás comunidades". 
Juliana Sena e Platinir Nunes acompanham as lutas da cidade e do campo.

Os incêndios criminosos e criminalização dos assentados

Agrônomo, ligado à Rede Agroflorestal, Joaquim Lando pediu aos vereadores que prestem atenção à questão do fogo que ocorre todo ano no assentamento. Joaquim lembrou que o poder público ignora as chamas que ocorrem no PDS da Barra e que os incêndios, sempre criminosos, são injustamente imputados à comunidade.

"O assentamento sofre todo ano o flagelo do fogo. Ano a ano, novas áreas, novos espaços são queimados, inclusive de reservas. E como tudo o que acontece lá, vivemos o descaso do poder público em relação àquilo. O descaso, inclusive, da sociedade, porque nós vemos a pauta negativa na imprensa local falando de um incêndio, atribuindo-o, muitas vezes, à própria comunidade a responsabilidade por um ato que não é dela. O incêndio é sempre criminoso. Sempre!"
Agrônomo, Joaquim Lando já vivenciou, na prática, o combate às chamas no Assentamento Mário Lago.

A negação do poder público para a construção da escola no assentamento 

Manuela Aquino, da Direção Estadual do MST, afirmou que os direitos da classe trabalhadora não são garantidos, que entrar na terra é apenas a primeira trincheira da luta pela terra.
"Hoje, não só com os assentados de reforma agrária no Brasil, mas com a classe trabalhadora em geral, os direitos não são garantidos. Eles são conquistados pelas classes trabalhadoras do campo e da cidade através de muita luta".

Ligada ao Setor Estadual de Educação, Manuela fez um recorte das várias movimentações realizadas para que a escola fosse implementada no assentamento Mário Lago ao longo de várias gestões diferentes.

"Eu acompanho desde 2010 a relação da Secretaria de Educação, da prefeitura, de diversas gestões do município em relação à escola do assentamento. [...] Nós tivemos várias movimentações ao longo desses anos em relação à escola e acho importante trazer este histórico um pouco neste espaço e ver um pouco a contribuição dessa casa nesta luta pela escola. Nós já tivemos empenhos de recursos para a construção da escola do assentamento. Na gestão da Darcy Vera (ex-prefeita) teve uma movimentação com o INCRA pedindo a concessão de uso do espaço já definido pela comunidade a muitos anos atrás. O INCRA deu esse uso de concessão pelo uso de dez anos, a prefeitura pediu e disse que era muito pouco, pediu outro documento de 20 anos. Na gestão passada do Nogueira, quando a Suely Vilela era a Secretária da Educação, a Secretaria Municipal da Educação se comprometeu, a prefeitura se comprometeu a construir a escola e nada aconteceu".

Aquino recordou que em reunião com o atual Secretário Municipal da Educação, Felipe Miguel, viu a escola do assentamento Mário Lago na lista de escolas que seriam construídas. Para a militante do MST, o poder público não quer a permanência das pessoas no território de reforma agrária.

"Eu tive reunião presencial com o Felipe Miguel. Ele já me mostrou a lista destas novas construções de escolas que estavam no projeto do município e a escola do assentamento Mário Lago estava lá. [...] foi empenhado recurso dessa gestão. Só me resta entender que há uma falta de vontade política de não querer a permanência dessas pessoas lá, porque negar educação para as crianças é negar permanência no território", encerrou.
Para Manuela Aquino, a falta de vontade política revela que o poder público não deseja que as pessoas vivam no PDS da Barra.

Realizaram falas, também, Lucas Caetano, Presidente do Sindicato da Agricultura Familiar, Donavan, pela juventude do assentamento Mário Lago e Madalena Caetano, Presidenta da Cooperativa Cooperluna.

Veja a Reunião Pública completa neste link.

Mais fotos














co-vereadora Adria Maria (PT)





Paulo Honório 

Donavan

Madalena Caetano

Lucas Floriano da Silva












Nenhum comentário:

Postar um comentário