Trabalhadoras acompanham com preocupação reunião realizada na Nova Vila União sobre o fim da ADPF 828 e o iminente risco de despejo. Fotos: Filipe Augusto Peres |
Por Filipe Augusto Peres
Com o risco de a ADPF 828 não ser prorrogada no próximo dia 31, neste sábado (26), em Ribeirão Preto, a comunidade urbana Vila Nova União realizou uma reunião com as mulheres da comunidade para debater a ordem de reintegração de posse apontada para a vida das 350 famílias que ali residem. Cerca de 100 mulheres estiveram presentes à reunião chamada pela União dos Movimentos de Moradia (UMM) e pela Frente de Advogadas e Advogados pela Democracia (FAD).
Moradora da comunidade Vila Nova União desde 2016, Madalena
Ribeiro (63), afirma que foi viver no local devido a uma grande necessidade financeira.
A idosa diz que caso o despejo ocorra, não terá para onde ir. Em sua fala, Madalena
ainda ressaltou que criou um sentimento de pertencimento com o território, com
todos os moradores da comunidade e que este fato influencia diretamente em sua qualidade
de vida:
“A maioria das pessoas que moram perto de mim são amigos e amigas [...]. Até a condição de alimentação da gente melhorou. Isto é muito importante para a idade que a gente está, pois já tenho 63 anos. Eu me sinto muito feliz por estar aqui, por este e outros motivos: a minha saúde, que é perto (a comunidade urbana) do posto, o mercado que é perto. Tudo isso faz parte da minha felicidade em morar aqui”.
Moradora, Madalena Ribeiro (63) criou pertencimento no território e se sente feliz por estar perto de amigos e estruturas públicas de saúde e educação. |
Um dos argumentos apresentados nacionalmente pela Campanha é que os efeitos econômicos e sociais afetaram de modo mais direto e intenso famílias que já viviam em situação de vulnerabilidade, tornando mais grave a situação desses núcleos. Para o Despejo Zero, o desemprego junto à crise econômica reduziu ainda mais a renda da população.
O caso da moradora Driele Souza representa bem tal situação.
Desempregada, vivendo faz 5 anos na VNU, Driele teve a sua filha recentemente.
“Eu vim morar na comunidade por causa de serviço (falta de). Tenho apenas o Bolsa Família que recebo por causa dela. Fora isso, a única ajuda que tenho é cesta que a própria comunidade me dá e o leite que consigo junto ao CRAS (Centro de Assistência de Referência Social)”.
Assim como a moradora Madalena Ribeiro, Driele também diz que
não tem para onde ir, caso o despejo se concretize.
“Eu não tenho lugar para ir. Não sou de Ribeirão Preto. Eu vim faz 8 anos por causa de serviço, mas agora, como não estou trabalhando, não terei para onde ir”.
Desempregada, Driele Souza e filha não têm para onde ir |
Liderança comunitária, Wallace Bill, falou sobre o medo que as trabalhadoras e trabalhadores da comunidade estão sofrendo com a possibilidade de despejo.
"A gente sofre por não estarmos sendo ouvidos. Mais uma vez temos uma movimentação contra a comunidade, o que preocupa todas as moradoras e moradores, até pelo vencimento da Lei do Despejo Zero que irá acontecer no próximo dia 31 em todo o país, o que nos deixa vulnerável para que o prefeito possa realizar a remoção as famílias da Vila Nova União".
Bill também relatou a facilidade de, caso o governo tenha vontade política, se realizar a Regularização Fundiária Urbana no local.
"A comunidade Vila Nova União está em uma área municipal, que pertence à prefeitura, de fácil urbanização. Não é uma área insalubre, sem desmoronamentos, alagamentos, que se encaixa facilmente na Reurb (Regularização Fundiária Urbana), que é a lei 13.465/2017, a lei que poderia, simplesmente, realizar a urbanização da comunidade".
Por fim, Wallace lembrou que o despejo das 350 famílias lançará diretamente na rua 1200 pessoas em situação de vulnerabilidade.
"Em 2020, nós protocolamos na Secretaria de Planejamento, foi o primeiro protocolo realizado em Ribeirão Preto sobre o Reurb para a comunidade Vila Nova União, pedindo um estudo que efetive a urbanização dessas famílias na comunidade. Estamos falando de 350 famílias, 1200 pessoas que não sabem o que irá lhes acontecer no dia de amanhã".
Wallace Bill lembra que são 1200 pessoas que serão atiradas à rua pelo governo de Duarte Nogueira. |
Ilegalidades no processo de despejo das 350 famílias da Comunidade Vila Nova União
Coordenador Regional da União dos Movimentos de Moradia, em
Ribeirão Preto, Mauro Freitas denuncia uma série de irregularidades cometidas
pelo governo de Duarte Nogueira (PSDB/SP) contra os moradores da Vila Nova
União.
“Em janeiro do ano passado (2021) foi solicitado e protocolado na prefeitura um pedido de regularização fundiária e a prefeitura não deu andamento ao pedido. Quando se tem um processo de regularização fundiária, o processo de reintegração também deve parar. No caso, a prefeitura não retirou o processo de reintegração de posse e deu prosseguimento”.
Freitas chama a atenção que a violência contra os Direitos
Humanos cometida pela Prefeitura Municipal de Ribeirão no tocante ao processo da
VNU repercute, também, em outras 54 comunidades urbanas que estão com o pedido de reintegração
de posse avançadas.
“Isso repercute, também, em outras comunidades de Ribeirão Preto que ainda não tiveram o andamento de seus processos de regularização fundiária levados adiante. São 54 comunidades que estão aguardando a sua regularização e a prefeitura alega que não possui recursos para realiza-la”.
Mauro Freitas (UMM) em fala às mulheres da Vila Nova União |
Violência da sentença: a ameaça de um novo Pinheirinho
Integrante do FAD/RENAP (Frente de Advogadas e Advogados
pela Democria e Rede Nacional
de Advogados e Advogadas Populares), a advogada Flávia Meziara
denuncia a violência tanto da sentença quanto do acórdão contra as famílias da
VNU.
“Tanto a sentença de 1º grau como o acórdão determinam a demolição das casas de alvenaria e a remoção das famílias. Essa comunidade conta com casas de alvenaria, comércio, cozinha comunitária. É uma comunidade totalmente estruturada pelo povo trabalhador que aqui vive”.
Da esquerda para a direita: Rafael Bezerra, Flávia Meziara e Guilherme Piantino integram a FAD/RENAP |
Recurso Especial no STJ e pedido de Reurb
Durante o ato, o FAD/RENAP anunciou que entrará com processo e com recurso especial em Brasília junto ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) para reverter a sentença.
Outro ponto levantado pelo FAD foi que, assim com Mauro
Freitas o fez, a advogada Flávia Meziara também lembrou que já faz mais de 1
ano que a Frente de Advogadas e Advogados pela Democria entrou com pedido de Reurb
(Regularizaçã Fundiária Urbana).
“Na época, nós apresentamos toda a documentação necessária para que uma comunidade tenha direito ao Reurb. Acontece que a prefeitura municipal não tem dado andamento a este processo administrativo. Esta Reurb têm todos os requisitos legais para que se possa dar andamento ao processo e suspender o processo judicial, porque o processo judicial de reintegração de posse sobre uma comunidade que está em processo de Reurb não pode caminhar”
Vigília no dia 30 de março
No dia 30 de março, trabalhadoras e trabalhadores do campo e da cidade realizarão uma vigília nacional em frente a diversos órgãos públicos exigindo a prorrogação da ADPF 828. No estado de São Paulo já estão confirmadas atividades referentes ao #ProrrogaSTF em Campinas, São Paulo, Santos e Ribeirão Preto.
Responsável por realizar a luta jurídica contra a remoção
das 350 famílias da comunidade urbana, a Frente de Advogadas e Advogados pela
Democracia ressalta a importância de as moradoras e moradores das comunidades
lutarem contra o despejo no próximo dia 30.
“Em Ribeirão Preto, o cenário é muito grave em relação às
reintegrações de posse das comunidades, principalmente na Comunidade Vila Nova
União. Por isso, estamos chamando o povo para lutar na próxima quarta-feira
(30), em que iremos fazer uma vigília na porta da prefeitura. Esta comunidade
já possui uma sentença de 1º grau além de um acórdão para que aconteça a
remoção dessas famílias deste local.
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