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segunda-feira, 30 de outubro de 2017

O projeto golpista é de recolonização do Brasil - Márcio Pochmann

Da RBA

Depois de quase três anos de uma explosiva recessão no sistema produtivo brasileiro, as privatizações do governo Temer revelam-se mais do que a venda de bens e serviços públicos. O programa em curso, anunciado como suposto remédio para atrair investimento e crescimento, representa mesmo a desnacionalização profunda do patrimônio nacional, apontando claramente para um processo de conversão neocolonial.

Pelo projeto português, o sentido colonial de mais de três séculos no Brasil foi a exploração a qualquer custo e a mais rápida possível submetida à absorção exclusiva pela coroa lusitana. Na atual conversão neocolonial, o patrimônio nacional passa a ser adquirido pelo capital estrangeiro que em seu benefício passará a comandá-lo.
Enquanto o capital estadunidense parece se concentrar mais nas fontes petrolíferas, o capital chinês indica se apropriar de tudo o mais, sem que se perceba qualquer sinal de reação de uma possível presença da burguesia nacional. Na França do liberal Macron, defensor das forças de mercado, nota-se que a simples ameaça de aquisição pelo capital chinês de um estaleiro privado francês foi respondida pela estatização, como uma espécie de reflexo dos interesses da burguesia daquele país.
Posições similares também podem ser identificadas tanto nos Estados Unidos como na Inglaterra, ambos liderados por governo neoliberais. Diante do acirramento da competição intercapitalista, parcela importante dos governos tem procurado defender os seus sistemas nacionais de produção e de emprego da força de trabalho, salvo onde os interesses econômicos dominantes terminaram por jogar a toalha.
Esse parece bem ser o caso brasileiro, onde o cabresto neocolonial vem sendo rápida e passivamente assumido. Pelo governo Temer, a palavra privatização do setor público não assume o sentido similar do passado, uma vez que transcorre desacompanhado, em geral, da presença de capitalistas nacionais, quase sempre tomado pelo capital estrangeiro. Tanto assim que nas primeiras aquisições, o capital chinês que avança é justamente o estatal.
Percebe-se que não se passa de uma questão ideológica, como para os neoliberais, que apostam sempre no capital privado por entender ser superior na administração ao setor público. Na venda do patrimônio nacional, o governo Temer só não permite estatal nacional, uma vez que tem estado presente o capital estatal estrangeiro.
No mesmo sentido, observa-se também que devido ao desespero rentista, o governo atual vem se desfazendo rapidamente e a qualquer custo do setor público para simplesmente engordar o seu caixa e, assim, garantir consistência às combalidas finanças públicas aos credores da dívida pública. A proposta orçamentária para o ano de 2018 enviada ao Congresso Nacional pode ser consagrada, por exemplo, como uma peça de ficção e que deve, se aprovada, liquidar com uma parcela importante das políticas públicas nas áreas sociais.
De forma concreta, o avanço do capital chinês sobre energia e infraestrutura, entre outros, pode estar indicando o ingresso do Brasil pela porta dos fundos no grande projeto Rota da Seda que se volta, a princípio, à integração na Eurásia. Ao se contabilizar até o momento a presença, por exemplo, do capital chinês no Brasil, percebe-se um traço marcante sobre a região Norte, parte necessária da vinculação com a Eurásia pelo pacífico.
Isso evidentemente pode ser apenas uma parte de um todo, ainda não conhecido plenamente. Na consideração a respeito da venda de terras aos estrangeiros, bem como outros projetos em curso sobre infraestrutura para o transporte, podem estar consolidando o sentido neocolonial intrínseco ao processo atual de desnacionalização do governo Temer.
Marcio Pochmann é professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho, ambos da Universidade Estadual de Campinas.

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