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domingo, 11 de agosto de 2019

Ser professor no Brasil: uma luta cotidiana

3 mil reais por mês por 40h
Um dos mais baixos salários do mundo para o trabalho de professor

Segundo dados do IBGE e do INEP há, no Brasil, cerca de 2,5 milhões de brasileiros e brasileiras aptos a exercer a profissão docente, mas 40% deles estão fora da sala de aula exercendo outras atividades.

Dentre os que estão exercendo a profissão, 85% está na educação básica e 15% na educação superior. 70% dos profissionais da educação básica são mulheres entre 30 e 39 anos. 85% dos profissionais docentes da educação básica tem formação superior e 80% tem alguma complementação ou formação pedagógica (diploma de licenciatura ou pedagogia).

Com a Constituição de 1988 e, principalmente, com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de 1996 o cenário educacional brasileiro apontava para uma expansão da oferta de matrículas em todos os níveis e também da formação docente.


Entre 2000 e 2017 foram abertos no Brasil por volta de 10 mil cursos de licenciatura, 85% deles no setor privado da educação superior, muito devido à expansão do Prouni. Houve, também, um avanço significativo na produção acadêmica sobre educação, com milhares de mestrados, doutorados e pós-doutorados nas áreas de pedagogia, didática, avaliação, inclusão etc.

Como não há exemplo no mundo de país que tenha feito seu desenvolvimento sem pesados investimentos em educação e na valorização da profissão docente, houve, também, um esforço nas esferas do poder público no Brasil para um reforço orçamentário da educação pública, em parte voltado para uma tentativa de valorização dos profissionais da educação, em específico os professores: Fundeb, Lei do Piso etc. 

Mas tanto o salto educacional necessário quanto a valorização docente não aconteceram a contento, assim como não avançou a contento a consolidação do Estado de Bem-Estar Social brasileiro, a partir das garantias dos direitos sociais contidos no artigo 6º da Constituição de 1988.

O modelo neoliberal introduzido no Brasil a partir dos anos 1990 entrou em conflito com os preceitos do Estado de Bem-Estar Social da Constituição, pois desviou os recursos orçamentários destinados para os direitos sociais para o pagamento das dívidas contraídas com o setor financeiro, realidade que se aprofundou drasticamente a partir da guinada de 2016. 

E a educação pública, assim como a saúde pública, a aposentadoria e a assistência social, se tornou uma vítima desse conflito. Hoje, apesar de um relativo sucesso do ponto de vista da pesquisa científica realizada nas universidades públicas brasileiras, nossa educação básica se coloca entre as piores do mundo em termos de resultados comparativos.

E em termos de valorização do professor do ensino básico, nós também figuramos entre os piores. A última pesquisa da ONG Varkey Foundation indica que o Brasil figura nas últimas posições em um ranking de 45 países no quesito valorização do professor.

Mas, afinal, o que significa valorizar o professor?

1. Salário: não existe valorização de uma profissão sem valorização salarial. Hoje os professores recebem em média 3 mil reais para 40 horas de trabalho no setor público e 2,5 mil reais para 40 horas no setor privado para o ensino básico. Um dos menores salários pagos no Brasil para profissões que exigem nível superior.
PS: muitas vezes os profissionais docentes têm de trabalhar em mais de uma escola com jornadas exaustivas que superam as 60 aulas semanais para ganhar um rendimento melhor. O índice de adoecimento e abandono da profissão por parte dos melhores talentos é enorme.

2. Estrutura de trabalho: a imensa maioria dos professores não têm à sua disposição a estrutura necessária para desenvolver o seu trabalho. O básico é lousa e giz. Salas ambiente, número adequado de alunos por sala, bibliotecas, laboratórios e computadores são artigos de luxo nas escolas do Brasil.

3. Plano de Carreira: se um determinado setor econômico deseja atrair os melhores talentos é fundamental que se ofereça aos profissionais a oportunidade de evoluir na carreira. Tanto na questão salarial quanto na questão laboral. Evoluir por produtividade e por especialização é o básico requerido. A realidade docente no Brasil é extremamente perversa nesse sentido, pois não viabiliza um cenário futuro de melhoria aos profissionais da educação, fazendo com que os mais jovens não de sintam atraídos pela docência. Não à toa que os cursos de licenciatura estão em crise no Brasil por falta de procura.

4. Gestão democrática: uma das coisas que mais beneficiam os ambientes educacionais é a possibilidade de construção dos projetos educacionais a partir da participação direta dos professores, alunos, pais e comunidade. É a tal gestão democrática incluída na legislação com a LDB de 1996 mas quase nunca executada na prática. A regra é a imposição de cima para baixo, desmotivando os professores e rompendo um sentimento muito importante para o trabalho educacional que é o sentimento de pertencimento com relação ao projeto elaborado e desenvolvido. A possibilidade de professores, alunos e comunidade escolherem pelo voto a equipe gestora da escola, incluindo o diretor, é visto como um fantasma pelos governos de plantão.

5. Setor sócio-pedagógico: muitas vezes os professores se sentem solitários e impotentes para resolverem uma quantidade grande de problemas que recaem sob sua responsabilidade. São problemas de ordem pedagógica, de ordem emocional, de ordem social que criam um ambiente de estresse e angústia para o docente. Ter um setor sócio-pedagógico na escola para auxiliar o professor na tarefa de resolver problemas é fundamental e pode fazer grande diferença no resultado final do trabalho.

Nessa altura do texto muitos devem estar pensando que esse tipo de escola e de valorização de professores é um sonho em se tratando de Brasil. Mas não é. Existe um modelo de escola pública que tem tudo isso e apresenta resultados tão bons ou melhores do que as melhores escolas particulares e até das tão atualmente propaladas escolas militares.

São os Institutos Federais, modelo escolar criado em 2008 e do qual tratamos neste artigo: Institutos Federais, o melhor modelo de educação pública.

A educação em tempo integral e de modo integrado, unindo o ensino propedêutico ao ensino técnico-profissionalizante é o que de melhor o Brasil já construiu em termos de educação pública. E mais, nos Institutos Federais há a obrigação de atender 50% das matrículas com alunos oriundos de escolas públicas do ensino fundamental e há a orientação programática e pedagógica de atuar para a melhoria da região onde a escola é implantada.

Portanto, neste próximo dia 13 de agosto todos os professores do Brasil têm motivos para defender a educação pública e a sua valorização profissional visando a implantação no Brasil inteiro de um modelo comprovado de sucesso.

E mais, os professores precisam urgentemente lutar pela sua liberdade de cátedra, pela sua liberdade intelectual e profissional diante do avanço de uma ideologia extremista e fundamentalista que hoje anda de mãos dadas com o neoliberalismo retirando direitos de todos os trabalhadores e cidadãos.

Blog O Calçadão





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