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sábado, 22 de junho de 2019

Consea: democracia e vida vs autoritarismo e morte


Essa semana uma nova disputa envolvendo o governo de Jair Bolsonaro, o Congresso Nacional e a Sociedade Civil aconteceu e expôs, mais uma vez, o caráter anti-democrático do atual governo.


Entenda

Em fevereiro deste ano o governo editou a Medida Provisória 870 que reformulava a organização do Executivo, principalmente a diminuição do número de ministérios. A MP também trazia no seu bojo a extinção do CONSEA (Conselho Nacional de Segurança alimentar), transferia o poder de demarcação de terras indígenas da FUNAI (ligada ao Ministério da Justiça) para o Ministério da Agricultura e transferia o COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) do Ministério da Economia para o Ministério da Justiça.

Após diversas manifestações da Sociedade Civil a respeito das alterações contidas na MP 870, em 27 de maio último o Congresso votou os pontos da MP impondo derrotas ao governo: manteve o COAF no Ministério da Economia, devolveu a demarcação de terras indígenas para a FUNAI e recriou o CONSEA, alocando-o no Ministério da Cidadania.


Ruralistas e Agronegócio: a polêmica

No último dia 18 de junho, o governo Bolsonaro transformou a MP 870 na Lei 13844/2019, porém algumas alterações feitas pelo Congresso, como a recriação do CONSEA, foram vetadas. Pior, o governo enviou ao Congresso, em 19 de junho, a MP 886, retransferindo a demarcação de terras indígenas para o Ministério da Agricultura.

Na Câmara dos Deputados, o deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) denunciou a atitude do governo como anti-democrática e um deboche ao Congresso Nacional, solicitando à Presidência do Congresso que rejeite de pronto a MP 886 como forma de restabelecer o equilíbrio constitucional entre os poderes da República.

A Sociedade Civil também reagiu denunciando que os acordos de Bolsonaro com o agronegócio, e a utilização indiscriminada de agrotóxicos, e com os interesses dos ruralistas nas terras indígenas e também nas áreas de Unidades de Conservação levaram o governo a desfazer, de maneira truculenta, uma decisão tomada pelo Congresso Nacional.


Afinal, o que é o CONSEA?


O CONSEA foi criado pela primeira vez em 1993, funcionando por um ano, no governo do Presidente Itamar Franco. Foi uma proposta vinda da sociedade civil através do movimento Ação da Cidadania contra a Fome, organizado pelo sociólogo Betinho.

O órgão seria recriado em 2003, no governo do Presidente Lula, como um espaço de participação da sociedade civil e de assessoramento do governo no estabelecimento do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e a Política Nacional de Segurança Alimentar, vinculados aos preceitos definidos pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO).

O trabalho do CONSEA foi fundamental para a elaboração da Lei Orgânica Alimentar e Nutricional de 2006 que, aliada às políticas de distribuição de renda e financiamento da agricultura familiar, foi responsável pela saída do Brasil do mapa da fome da ONU em 2014.

O CONSEA atua na proteção e incentivo da produção de alimentos orgânicos, na proteção dos alimentos tradicionais, como as PANC's (Plantas Alimentícias Não Convencionais) e sementes caboclas, na fiscalização do comércio de alimentos ultra-processados e na fiscalização do uso de agrotóxicos na agricultura.

Ou seja, a Política Nacional de Segurança Alimentar construída de 2003 a 2018, com importante participação do CONSEA, aponta para o incentivo no Brasil da produção e comercialização de alimentos saudáveis, produzidos majoritariamente pelas pequenas e médias propriedades rurais, de agricultura familiar, por assentados da reforma agrária e por comunidades tradicionais (como os povos indígenas).

É exatamente por isso que o CONSEA desagrada tanto Bolsonaro e seus aliados ruralistas e do agronegócio.


O papel do STF

O Congresso Nacional irá rever os vetos presidenciais na MP 870, havendo a possibilidade de derrubada dos vetos. Se isto acontecer, a decisão final sobre a legalidade dos atos caberá ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Além dos assuntos referentes à medida Provisória 870, o STF também deverá se pronunciar a respeito de outros atos de caráter polêmico do governo, como o decreto presidencial 9759/2019 que extingue centenas de conselhos populares.


Coletivo Banquetaço

Segundo Fúlvio Lermando, do Conselho Municipal de Segurança Alimentar de Ribeirão Preto e membro do Coletivo Banquetaço (que em fevereiro realizou um movimento nacional contra a extinção do CONSEA - veja aqui o movimento em RP), "o STF deve se pronunciar sobre a inconstitucionalidade do decreto que extinguiu os conselhos. Teremos, também, uma audiência na Procuradoria Geral da República (PGR) para termos mais elementos para um pedido de inconstitucionalidade junto ao STF e vamos atuar junto ao Congresso para acompanhar a votação dos vetos na MP 870".

Banquetaço em fevereiro
Ribeirão Preto
Foto: Filipe Peres

Fúlvio - Conselho de SEgurança Alimentar de RP
Opinião

A agenda do atual governo flerta com a morte (no campo, no trânsito, na alimentação, nas cidades), com o armamento indiscriminado (aliás o Senado também derrubou o decreto das armas e o assunto vai parar, certamente, no STF) e com o autoritarismo, sempre tentado rebaixar a importância da política e das instituições democráticas. A Sociedade Civil busca responder com a agenda da democracia e da vida.


Blog O Calçadão

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