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sábado, 20 de junho de 2020

Em ofício direcionado a todos os casos ocorridos no Estado, Conselho Estadual de Defesa da Pessoa Humana condena remoções e reintegrações de posse realizadas pela prefeitura de Ribeirão Preto, incêndio criminoso realizado contra acampados do MST no acampamento Campo e Cidade Paulo Botelho e pede as suas imediatas suspensões


Família na Comunidade Nova Vila União, em Ribeirão Preto.
Fotos: Filipe Augusto Peres


Para o CONDEPE, reintegrações de posse e remoções forçadas contrariam manifestações da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, do Grupo de Apoio às Ordens Judiciais de Reintegração de Posse do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e do Ministério Público do Estado de São Paulo. Neste período de pandemia, o município de Ribeirão Preto aparece atrás apenas da Grande São Paulo em número de ações e reintegrações. Todas estão relacionadas diretamente com a prefeitura, o governo municipal de António Duarte Nogueira.

Em ofício publicado no último dia 16 de junho, o CONDEPE (Conselho Estadual de Defesa da Pessoa Humana) condenou as reintegrações de posse que estão ocorrendo em todo o Estado de São Paulo em plena pandemia de covid-19. Para o Conselho, as seguidas reintegrações de posse violam os direitos humanos uma vez que violam o direito à dignidade da pessoa humana.


O documento salienta que a pandemia do novo Coronavírus evidenciou e agravou de forma dramática as profundas desigualdades sociais na sociedade brasileira. Contrário às reintegrações, o órgão ressalta a existência na Constituição que protegem a dignidade da pessoa humana que justifica a não remoção das famílias. No texto, o CONDEPE cita como exemplos o o Estatuto das Cidades, que estabelece as diretrizes gerais da política urbana, e a Lei Federal nº 13.465/2017, que dispõe sobre a regularização fundiária rural e urbana, sobre a liquidação de créditos concedidos aos assentados da reforma agrária e institui mecanismos para aprimorar a eficiência dos procedimentos de alienação de imóveis da União são normas que viabilizam a segurança na posse de pessoas moradoras de assentamentos precários, em áreas urbanas ou rurais.

O Conselho destaca que a pandemia de Covid-19 é a maior crise sanitária do século XX e que, diante de seu alastramento, os mais pobres, estejam estes nas periferias urbanas, estejam estes nos assentamentos rurais e urbanos, são os mais atingidos econômica e socialmente. Para ele [..] “os efeitos de remoções nesse atual cenário são imprevisíveis, mas certamente representam a diminuição de chances de sobrevivência daqueles que ficam desprovidos de teto no momento que circula um vírus que já causou mais de 40 mil[1] mortes no país.”

E destaca que tanto os governos como o sistema de justiça devem tomar ações imediatas para mitigar os efeitos da pandemia, assim como mediar os conflitos que rodeiam as periferias urbanas, as áreas rurais, os território quilombolas e as populações tradicionais devem ser mediados para garantir a sobrevivência das famílias diretamente atingidas e lembrou que
[...] “o Procurador-Geral de Justiça do Estado de Seção Paulo expediu o Aviso nº 168/2020-PGJ, para que os membros do Ministério Público [...] avaliassem a possibilidade de requererem em cada uma das ações judiciais específicas a suspensão das ordens de reintegração de posse enquanto perdurarem as necessárias medidas de isolamento social e de enfrentamento da doença.”


Acampamento Campo e Cidade Paulo Botelho, em Jardinópolis/SP.


O CONDEPE ainda cita o Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU Habitat), de 14 de maio de 2020, em que este documento recomenda aos governos de todo o mundo a adoção de medidas emergenciais que atendam as necessidades básicas de comunidades ou bairros vulneráveis como alimentos, água, saneamento, higiene e cuidados primários de saúde
[...] “além de medidas específicas para garantir o direito à moradia adequada, como a proibição dos despejos devido a atrasos de aluguel, o adiamento de pagamentos de financiamentos, a suspensão de despejos forçados” entre outras.

Ainda citando o documento da ONU Habitat, o CONDEPE ressalta que a Organização das Naões Unidas chama a atenção das nações que
[...] “os Estados Membros das Nações Unidas têm a obrigação de respeitar, proteger e cumprir o direito à moradia adequada como parte do direito a um padrão de vida adequado. Negar aos moradores e comunidades este direito durante a pandemia da COVID-19 pode ter consequências devastadoras, incluindo maior exposição à COVID-19 e outras infecções, além da exposição à insegurança e violência, perda de renda e acesso limitado a redes de segurança socioeconômica e serviços básicos, incluindo cuidados de saúde. O despejo e remoção de moradores e comunidades antigas, particularmente de assentamentos informais, durante a pandemia não só violaria seus direitos fundamentais, como também poderia expor tanto eles quanto o resto da população local a um maior risco de exposição ao vírus.”

O Conselho Estadual de Defesa da Pessoa Humana lembra que existem soluções indicadas na Resolução nº 10/2018, do Conselho Nacional de Direitos Humanos, que podem ser adotadas
[...] soluções garantidoras de direitos humanos e medidas preventivas em situações de conflitos fundiários coletivos rurais e urbanos, traz uma série de recomendações para a garantia do direito à moradia, primando pela autocomposição e em última instância por formas que evitem medidas violentas contra os atingidos e possam garantir o direito à terra ou moradia.  

e lembra que o Conselho Nacional de Justiça, em sua resolução nº 313, de 19 de março de 2020,entende que durante a pandemia de covid-19 o direito à moradia deve ser garantido e que formas de violentas contra os atingidos devem ser evitadas. E ainda, ao estabelecer as regras
[...] “para o funcionamento do Poder Judiciário durante a vigência da pandemia do coronavírus, listando matérias que serão obrigatoriamente apreciadas neste período, deixou de apontar a necessidade de decisões acerca de pedidos de reintegração de posse e consequente despejos forçados.”


Após remoção forçada, morador caminha entre os escombros na Comunidade das Mangueiras, em Ribeirão Preto.


E reforça que medidas que levem a remoções ou reintegrações de posse durante o período de pademia
[...] “escancaram de forma dramática as desigualdades sociais no Estado mais rico da Federação, onde a terra urbana e rural está concentrada na mão de poucos, sem, no entanto, cumprir a sua função social.”

No documento o CONDEPE entende que as ações de despejo e reintegração intensificam as violações de direitos das populações e que ao dar sequência a tais ações, o poder público e o sistema de justiça direcionam as populações atingidas a uma situação de maior precariedade. O Conselho Estadual de Defesa da Pessoa Humana, no texto, lista e denuncia as ameaças ou ações concretas de remoções durante a pandemia de coronavírus envolvendo o poder público ou agentes privados e cita 24 casos ocorridos ou em andamento em todo o Estado.

Neste contexto de violações dos Direitos Humanos, entre remoções forçadas e mandados de reintegrações de posse durante a pandemia, a região de Ribeirão Preto figura com 5 casos, atrás da Grande São Paulo, sendo 4 relacionados diretamente com o município de Ribeirão Preto, ações ligadas diretamente à prefeitura, ao governo municipal, e uma referente ao município de Jardinópolis.
O caso de reintegração de posse em Jardinópolis é o único que seguiu as manifestações da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, do Grupo de Apoio às Ordens Judiciais de Reintegração de Posse do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e do Ministério Público do Estado de São Paulo. A reintegração foi temporariamente suspensa em prol das famílias acampadas com a finalidade de conter a disseminação do vírus causador da Covid-19.  Veja os casos abaixo:

Reintegração de Posse em Ribeirão Preto – Vila União


Comunidade Vila Nova União, em Ribeirão Preto/SP


A decisão judicial, de 4 de junho, autorizou a remoção de 300 famílias na Comunidade Vila Nova União em plena pandemia de Covid-19. A medida contraria as manifestações da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, do Grupo de Apoio às Ordens Judiciais de Reintegração de Posse do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e do Ministério Público do Estado de São Paulo.

decisão judicial de 4 de junho 2020, no âmbito do Processo nº 1020856-46.2016.8.26.0506, autorizou-se a remoção de 300 famílias da Comunidade Nova Vila União, bairro Vila Albertina, em plena vigência da pandemia do COVID-19, contrariando manifestações da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, do Grupo de Apoio às Ordens Judiciais de Reintegração de Posse  do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e do Ministério Público do Estado de São Paulo

Clique no link abaixo para ler a matéria publicada pelo Blog O Calçadão:


Vistoria Judicial na Comunidade Cidade Locomotiva

A determinação de de vistoria judicial com
força policial, agendada para 15 de abril de 2020, no terreno da Comunidade da Cidade Locomotiva, onde moram 370 famílias, em
ação de reintegração de posse.
Depois de intensa mobilização popular e
manifestação de entidades da sociedade civil e deste Conselho
Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana – CONDEPE, a pedido da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, a vistoria foi suspensa.

Reintegração de Posse em Ribeirão Preto, no Bairro Jardim Itaú


No Jardim Itaú, famílias em situação de vulnerabilidade carregam sacolas de doação de alimentos realizada pelo MST.


A sentença de 1º de junho, determinou a remoção de 10 famílias em área institucional da Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto, no Bairro Jardim Itaú, sendo que a comunidade está incluída em processo de Regularização Fundiária que abrange a totalidade de 64 famílias.
A comunidade pede que estas famílias que serão removidas, que não estavam incluídas no ajuste de conduta, sejam incluídas no processo de Regularização Fundiária.

Intervenção com demolição na Comunidade das Mangueiras


Pessoas caminham sobre escombros após remoção forçada na Comunidade das Mangueiras.


Em 28 de maio de 2020 na Favela das Mangueiras, bairro de Vila Virgínia em Ribeirão Preto, comunidade com mais de 30 anos de existência, Prefeitura Municipal ingressou na localidade sem mandado judicial, e promoveu a remoção de 30 moradias de alvenaria que estavam sendo reconstruídas.

Clique nos links abaixo para ler as matérias relacionadas ao assunto publicadas pelo Blog O Calçadão


Intervenção com demolição na região do Aeroporto Leite Lopes

Na manhã do dia 14 de abril de 2020, sem mandado judicial, debaixo de chuva, em meio a pandemia do coronavírus, o Departamento Geral de Fiscalização da Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto acionou contingente da Guarda Civil Metropolitana, acompanhado de uma retroescavadeira, e procedeu a derrubada de 15 barracos de moradores da Rua Porto Ferreira, esquina com a Rua Descalvado, na região do Aeroporto Leite

Clique no link abaixo para ler a nota de repúdio emitida pela União dos Movimentos de Moradia:



Incêndio no Acampamento Campo e Cidade Paulo Botelho, do MST


Acampada observa árvore totalmente carbonizada em área devastada por incêndio criminal no acampamento Campo e Cidade Paulo Botelho.


No dia 28 de abril de 2020, as cerca de 100 famílias do acampamento Campo-Cidade Paulo Botelho, organizadas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e UMM foram surpreendidas por incêndio na mata próxima a área do acampamento. De acordo com a direção regional do MST, “é flagrante o atentado contra o acampamento por esse incêndio ocorrido  no dia 28 de abril, visando, simultaneamente, atacar fisicamente e acelerar a reintegração de posse”.
Conforme nota anteriormente publicada pelo Movimento Sem Terra, as famílias reivindicam  que o INCRA apresente o mapa de todas as terras públicas hoje administradas pela União que vem sendo utilizadas de forma irregular e ilicitamente pelo agronegócio no Estado de São Paulo e exige que o Instituto de Colonização e Reforma Agrária faça a vistoria dessas áreas para que possa, assim, agilizar o processo de reforma agrária parado há cerca de 3 anos no Estado de São Paulo.
Neste caso, ao menos por hora o efeito foi contrário, considerando que a Juíza da Comarca de Jardinópolis suspendeu temporariamente a medida liminar de reintegração de posse em favor dos assentados. Assim manifestou a Juíza: “Mantenho a suspensão do cumprimento da liminar de reintegração de posse, pelos mesmos motivos já explicitados na decisão de pag. 288, no que concerne à necessidade de adoção de condutas com a finalidade de conter a disseminação do vírus causador da Covid-19”.

Clique nos links abaixo para ler matérias relacionadas ao caso publicadas pelo Blog O Calçadão:



O CONDEPE encerra o documento pedindo que o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo recomende aos integrantes do Poder Judiciário paulista que, durante a pandemia de Covid-19, o estado de calamidade pública instituído pelo Decreto Estadual se abstenham de pronunciar sentenças de reintegração de posse e despejos e que proceda para a suspensão da execução dos mandados expedidos.







[1] Dados do consórcio  de veículos de imprensa apontou 47.897 mortes no dia 19 de junho.

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