Família na Comunidade Nova Vila União, em Ribeirão Preto.
Fotos: Filipe Augusto Peres
|
Para
o CONDEPE, reintegrações de posse e remoções forçadas contrariam manifestações
da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, do Grupo de Apoio às Ordens
Judiciais de Reintegração de Posse do Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo e do Ministério Público do Estado de São Paulo. Neste período de pandemia,
o município de Ribeirão Preto aparece atrás apenas da Grande São Paulo em
número de ações e reintegrações. Todas estão relacionadas diretamente com a
prefeitura, o governo municipal de António Duarte Nogueira.
Em
ofício publicado no último dia 16 de junho, o CONDEPE (Conselho Estadual de
Defesa da Pessoa Humana) condenou as reintegrações de posse que estão ocorrendo
em todo o Estado de São Paulo em plena pandemia de covid-19. Para o Conselho,
as seguidas reintegrações de posse violam os direitos humanos uma vez que violam
o direito à dignidade da pessoa humana.
O
documento salienta que a pandemia do novo Coronavírus evidenciou e agravou de
forma dramática as profundas desigualdades sociais na sociedade brasileira.
Contrário às reintegrações, o órgão ressalta a existência na Constituição que
protegem a dignidade da pessoa humana que justifica a não remoção das famílias.
No texto, o CONDEPE cita como exemplos o o Estatuto das Cidades, que estabelece
as diretrizes gerais da política urbana, e a Lei Federal nº 13.465/2017, que
dispõe sobre a regularização fundiária rural e urbana, sobre a liquidação de
créditos concedidos aos assentados da reforma agrária e institui mecanismos
para aprimorar a eficiência dos procedimentos de alienação de imóveis da União
são normas que viabilizam a segurança na posse de pessoas moradoras de
assentamentos precários, em áreas urbanas ou rurais.
O
Conselho destaca que a pandemia de Covid-19 é a maior crise sanitária do século
XX e que, diante de seu alastramento, os mais pobres, estejam estes nas
periferias urbanas, estejam estes nos assentamentos rurais e urbanos, são os
mais atingidos econômica e socialmente. Para ele [..] “os efeitos de
remoções nesse atual cenário são imprevisíveis, mas certamente representam a
diminuição de chances de sobrevivência daqueles que ficam desprovidos de teto
no momento que circula um vírus que já causou mais de 40 mil[1]
mortes no país.”
E
destaca que tanto os governos como o sistema de justiça devem tomar ações
imediatas para mitigar os efeitos da pandemia, assim como mediar os conflitos
que rodeiam as periferias urbanas, as áreas rurais, os território quilombolas e
as populações tradicionais devem ser mediados para garantir a sobrevivência das
famílias diretamente atingidas e lembrou que
[...]
“o Procurador-Geral de Justiça do Estado de Seção Paulo expediu o Aviso nº
168/2020-PGJ, para que os membros do Ministério Público [...] avaliassem a
possibilidade de requererem em cada uma das ações judiciais específicas a
suspensão das ordens de reintegração de posse enquanto perdurarem as
necessárias medidas de isolamento social e de enfrentamento da doença.”
Acampamento Campo e Cidade Paulo Botelho, em Jardinópolis/SP. |
O
CONDEPE ainda cita o Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos
(ONU Habitat), de 14 de maio de 2020, em que este documento recomenda aos
governos de todo o mundo a adoção de medidas emergenciais que atendam as
necessidades básicas de comunidades ou bairros vulneráveis como alimentos,
água, saneamento, higiene e cuidados primários de saúde
[...]
“além de medidas específicas para garantir o direito à moradia adequada, como a
proibição dos despejos devido a atrasos de aluguel, o adiamento de pagamentos
de financiamentos, a suspensão de despejos forçados” entre
outras.
Ainda
citando o documento da ONU Habitat, o CONDEPE ressalta que a Organização das
Naões Unidas chama a atenção das nações que
[...]
“os Estados Membros das Nações Unidas têm a obrigação de respeitar, proteger e
cumprir o direito à moradia adequada como parte do direito a um padrão de vida
adequado. Negar aos moradores e comunidades este direito durante a pandemia da
COVID-19 pode ter consequências devastadoras, incluindo maior exposição à
COVID-19 e outras infecções, além da exposição à insegurança e violência, perda
de renda e acesso limitado a redes de segurança socioeconômica e serviços
básicos, incluindo cuidados de saúde. O despejo e remoção de moradores e
comunidades antigas, particularmente de assentamentos informais, durante a
pandemia não só violaria seus direitos fundamentais, como também poderia expor
tanto eles quanto o resto da população local a um maior risco de exposição ao
vírus.”
O
Conselho Estadual de Defesa da Pessoa Humana lembra que existem soluções
indicadas na Resolução nº 10/2018, do Conselho Nacional de Direitos Humanos,
que podem ser adotadas
[...]
soluções garantidoras de direitos humanos e medidas preventivas em situações de
conflitos fundiários coletivos rurais e urbanos, traz uma série de
recomendações para a garantia do direito à moradia, primando pela
autocomposição e em última instância por formas que evitem medidas violentas
contra os atingidos e possam garantir o direito à terra ou moradia.
e
lembra que o Conselho Nacional de Justiça, em sua resolução nº 313, de 19 de
março de 2020,entende que durante a pandemia de covid-19 o direito à moradia
deve ser garantido e que formas de violentas contra os atingidos devem ser
evitadas. E ainda, ao estabelecer as regras
[...]
“para o funcionamento do Poder Judiciário durante a vigência da pandemia do
coronavírus, listando matérias que serão obrigatoriamente apreciadas neste
período, deixou de apontar a necessidade de decisões acerca de pedidos de
reintegração de posse e consequente despejos forçados.”
Após remoção forçada, morador caminha entre os escombros na Comunidade das Mangueiras, em Ribeirão Preto. |
E
reforça que medidas que levem a remoções ou reintegrações de posse durante o
período de pademia
[...]
“escancaram de forma dramática as desigualdades sociais no Estado mais rico da
Federação, onde a terra urbana e rural está concentrada na mão de poucos, sem,
no entanto, cumprir a sua função social.”
No
documento o CONDEPE entende que as ações de despejo e reintegração intensificam
as violações de direitos das populações e que ao dar sequência a tais ações, o
poder público e o sistema de justiça direcionam as populações atingidas a uma
situação de maior precariedade. O Conselho Estadual de Defesa da Pessoa Humana,
no texto, lista e denuncia as ameaças ou ações concretas de remoções durante a
pandemia de coronavírus envolvendo o poder público ou agentes privados e cita
24 casos ocorridos ou em andamento em todo o Estado.
Neste
contexto de violações dos Direitos Humanos, entre remoções forçadas e mandados
de reintegrações de posse durante a pandemia, a região de Ribeirão Preto figura
com 5 casos, atrás da Grande São Paulo, sendo 4 relacionados diretamente com o
município de Ribeirão Preto, ações ligadas diretamente à prefeitura, ao governo
municipal, e uma referente ao município de Jardinópolis.
O
caso de reintegração de posse em Jardinópolis é o único que seguiu as manifestações
da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, do Grupo de Apoio às Ordens Judiciais
de Reintegração de Posse do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e do
Ministério Público do Estado de São Paulo. A reintegração foi temporariamente
suspensa em prol das famílias acampadas com a finalidade de conter a
disseminação do vírus causador da Covid-19. Veja os casos abaixo:
Reintegração
de Posse em Ribeirão Preto – Vila União
Comunidade Vila Nova União, em Ribeirão Preto/SP |
A
decisão judicial, de 4 de junho, autorizou a remoção de 300 famílias na
Comunidade Vila Nova União em plena pandemia de Covid-19. A medida contraria as
manifestações da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, do Grupo de Apoio
às Ordens Judiciais de Reintegração de Posse do Tribunal de Justiça do Estado
de São Paulo e do Ministério Público do Estado de São Paulo.
decisão
judicial de 4 de junho 2020, no âmbito do Processo nº
1020856-46.2016.8.26.0506, autorizou-se a remoção de 300 famílias da Comunidade
Nova Vila União, bairro Vila Albertina, em plena vigência da pandemia do
COVID-19, contrariando manifestações da Defensoria Pública do Estado de São
Paulo, do Grupo de Apoio às Ordens Judiciais de Reintegração de Posse do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
e do Ministério Público do Estado de São Paulo
Clique no link abaixo para ler a matéria publicada pelo Blog O Calçadão:
Vistoria Judicial na Comunidade Cidade Locomotiva
A determinação de de vistoria judicial com
força policial, agendada para 15 de abril de 2020, no terreno da Comunidade da Cidade Locomotiva, onde moram 370 famílias, em
ação de reintegração de posse.
Depois de intensa mobilização popular e
manifestação de entidades da sociedade civil e deste Conselho
Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana – CONDEPE, a pedido da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, a vistoria foi suspensa.
Reintegração
de Posse em Ribeirão Preto, no Bairro Jardim Itaú
No Jardim Itaú, famílias em situação de vulnerabilidade carregam sacolas de doação de alimentos realizada pelo MST. |
A
sentença de 1º de junho, determinou a remoção de 10 famílias em área
institucional da Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto, no Bairro Jardim Itaú,
sendo que a comunidade está incluída em processo de Regularização Fundiária que
abrange a totalidade de 64 famílias.
A
comunidade pede que estas famílias que serão removidas, que não estavam
incluídas no ajuste de conduta, sejam incluídas no processo de Regularização
Fundiária.
Intervenção
com demolição na Comunidade das Mangueiras
Pessoas caminham sobre escombros após remoção forçada na Comunidade das Mangueiras. |
Em
28 de maio de 2020 na Favela das Mangueiras, bairro de Vila Virgínia em
Ribeirão Preto, comunidade com mais de 30 anos de existência, Prefeitura
Municipal ingressou na localidade sem mandado judicial, e promoveu a remoção de
30 moradias de alvenaria que estavam sendo reconstruídas.
Clique nos links abaixo para ler as matérias relacionadas ao assunto publicadas pelo Blog O Calçadão:
Intervenção
com demolição na região do Aeroporto Leite Lopes
Na
manhã do dia 14 de abril de 2020, sem mandado judicial, debaixo de chuva, em
meio a pandemia do coronavírus, o Departamento Geral de Fiscalização da
Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto acionou contingente da Guarda Civil
Metropolitana, acompanhado de uma retroescavadeira, e procedeu a derrubada de
15 barracos de moradores da Rua Porto Ferreira, esquina com a Rua Descalvado,
na região do Aeroporto Leite
Clique no link abaixo para ler a nota de repúdio emitida pela União dos Movimentos de Moradia:
Incêndio
no Acampamento Campo e Cidade Paulo Botelho, do MST
Acampada observa árvore totalmente carbonizada em área devastada por incêndio criminal no acampamento Campo e Cidade Paulo Botelho. |
No
dia 28 de abril de 2020, as cerca de 100 famílias do acampamento Campo-Cidade
Paulo Botelho, organizadas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e
UMM foram surpreendidas por incêndio na mata próxima a área do acampamento. De
acordo com a direção regional do MST, “é flagrante o atentado contra o
acampamento por esse incêndio ocorrido
no dia 28 de abril, visando, simultaneamente, atacar fisicamente e
acelerar a reintegração de posse”.
Conforme
nota anteriormente publicada pelo Movimento Sem Terra, as famílias
reivindicam que o INCRA apresente o mapa
de todas as terras públicas hoje administradas pela União que vem sendo
utilizadas de forma irregular e ilicitamente pelo agronegócio no Estado de São
Paulo e exige que o Instituto de Colonização e Reforma Agrária faça a vistoria
dessas áreas para que possa, assim, agilizar o processo de reforma agrária
parado há cerca de 3 anos no Estado de São Paulo.
Neste
caso, ao menos por hora o efeito foi contrário, considerando que a Juíza da
Comarca de Jardinópolis suspendeu temporariamente a medida liminar de
reintegração de posse em favor dos assentados. Assim manifestou a Juíza:
“Mantenho a suspensão do cumprimento da liminar de reintegração de posse, pelos
mesmos motivos já explicitados na decisão de pag. 288, no que concerne à
necessidade de adoção de condutas com a finalidade de conter a disseminação do
vírus causador da Covid-19”.
Clique nos links abaixo para ler matérias relacionadas ao caso publicadas pelo Blog O Calçadão:
O
CONDEPE encerra o documento pedindo que o Tribunal de Justiça do Estado de
São Paulo recomende aos integrantes do Poder Judiciário paulista que, durante a
pandemia de Covid-19, o estado de calamidade pública instituído pelo Decreto
Estadual se abstenham de pronunciar sentenças de reintegração de posse e
despejos e que proceda para a suspensão da execução dos mandados expedidos.
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