A temperatura política não para de subir nesse final de 2021, projetando um início de 2022 bastante quente politicamente.
A temperatura já vinha elevada por conta da entrada do ex-juiz parcial Moro na corrida presidencial, animando os 'mercados' e a principal empresa de mídia com a possibilidade de uma "terceira via", mesmo sendo Moro um digno representante da extrema direita antidemocrática.
Mas a temperatura se elevou ainda mais com o debate das Federações partidárias e com as especulações sobre a possibilidade de Geraldo Alckmin ser vice de Lula com a possível ida ao PSB, agitando bastante o campo de esquerda.
Questionamentos legítimos e importantes inundaram as redes sociais e os grupos políticos: fazer uma frente de esquerda ou uma frente ampla? Aderir às Federações partidárias ou não? Alckmin de vice é uma grande sacada política ou um erro histórico? O importante é derrotar Bolsonaro e Moro ou também temos de derrotar o neoliberalismo?
Os principais institutos de pesquisa apontam Lula com 56% dos votos válidos e uma taxa de rejeição baixa, na casa dos 30%. Isso mostra uma tendência de vitória de Lula em 2022, inclusive no primeiro turno Além disso, as duas candidaturas da extrema direita, Bolsonaro e Moro, estão em situação ruim com rejeição na casa de 60%..
Isso daria a Lula e ao PT um conforto para se fazer uma aliança restrita no campo de esquerda ou ainda é necessário, diante de adversários antidemocráticos, fazer uma aliança ampla ao centro?
Na última entrevista do jornalista Breno Altmann, no canal Opera Mundi (veja aqui), José Dirceu defendeu uma aliança ampla para derrotar Bolsonaro já no primeiro turno e estabelecer um governo de reconstrução. Mas há, dentro do PT, como o deputado Rui Falcão, e dentro do PSOL, quem defenda uma aliança restrita ao campo de esquerda.
Esse debate é essencial.
Do ponto de vista político, para viabilizar uma derrota de Bolsonaro (e de Moro), e de construção de uma base congressual sólida para um governo de reconstrução, tendo a concordar com José Dirceu, mas com a ressalva de que o programa econômico não pode tergiversar com o sentido de contraponto ao neoliberalismo, revogando o teto de gastos, a independência do Banco Central, reconstruindo direitos sociais perdidos desde 2016 e reformando a estrutura tributária.
Sem uma mudança econômica anti-neoliberal não haverá possibilidade de reconstrução e isso precisa ser um debate fundamental da aliança anti-fascismo.
Não podemos esquecer que desde 2015, incluindo erros do início do segundo mandato de Dilma do ponto de vista do programa econômico, estamos em uma posição de recuo defensivo. O golpe de 2016 foi uma ruptura com o pacto democrático de 1988 e o resultado foi um assalto da elite financeira aos cofres do Estado alicerçado no avanço anti-democrático e no partido militar, que sustentou a prisão ilegal de Lula e a eleição de Bolsonaro em 2018, tendo ampla participação no governo.
Levando em conta que Moro não vai decolar porque foi desmascarado em sua farsa anti-corrupção e não tem a caneta presidencial, chegamos à conclusão de que nosso adversário é Bolsonaro, seus militares e, por enquanto, o Centrão.
Derrotar Bolsonaro é a tarefa número 1. Para isso, entendo, é necessário uma aliança política mais ampla que a esquerda. A vitória eleitoral precisa ser robusta e a posse precisa ser garantida, com uma ampla base congressual para se governar sobre a terra arrasada que será deixada pelos governos militarizados de Temer e Bolsonaro.
Esse foi o sinal dado do jantar deste domingo (19/11/21) organizado pelo grupo jurídico Prerrogativas: fortalecer a base democrática para garantir a transição política de 2022 para 2023.
Para além de desarmar na sociedade o veneno bolsonarista e lavajatista, o governo Lula irá enfrentar uma economia arrasada, com trabalho precarizado, parque industrial destruído, endividamento público recorde, inflação, desemprego de 14 milhões e 20 milhões passando fome. Governaremos diante de uma elite financeira incapaz de olhar o Brasil como um projeto coletivo. Os desafios serão enormes.
Repito, para além de derrotar Bolsonaro, Moro e os venenos do bolsonarismo e do lavajatismo, vamos precisar superar o modelo neoliberal, retomando a atuação do Estado, os investimentos públicos, a geração de empregos, a distribuição de renda e o desenvolvimento industrial e tecnológico.
Precisamos mudar a desastrosa política externa do Bolsonaro e aproveitar as mudanças que estão se iniciando no sistema capitalista, diante do fracasso neoliberal, para desenvolver nosso parque industrial e tecnológico sem alinhamento ideológico com nenhuma grande potência.
Dentro da ampla aliança política é fundamental o fortalecimento do núcleo de esquerda e centro-esquerda, com PT, PSB, PCdoB, PSOL, Rede e setores do PV, da Rede e do PDT. Para isso, vejo, apesar das dificuldades e desafios, a Federação como um bom caminho para ajudar os partidos menores a superar a cláusula de barreira imposta por reformas políticas conservadoras e costurar a aliança em um acordo ideológico e programático que ajude a sustentar o governo de reconstrução.
Como alinhavar a Federação é um desafio colocado.
É NECESSÁRIO TER ALCKMIN DE VICE?
Ter Alckmin de vice não é algo fácil nem absolutamente necessário. Sua saída do PSDB se deu por conta do domínio de BolsoDória, que conduziu o partido à extrema direita. Alckmin não é nem será um homem de esquerda e até o PSB sabe disso. Alckmin é um alicerce do tucanato paulista que implanta o neoliberalismo no estado há 30 anos e nada vai apagar isso.
A articulação do seu nome, indo para o PSB ou para o PSD, com o monitoramento de Lula, só se circunscreve na conjuntura de enfrentamento do projeto proto-fascista de Bolsonaro e Moro. É a construção de um simbolismo que desarme a campanha de ódio estabelecida na sociedade e que deu, não nos esqueçamos, 58 milhões de votos a Bolsonaro em 2018, com mamadeira de piroca e tudo. Muitos desses 58 milhões de eleitores são antigos eleitores de Lula que agora, aos poucos, retornam.
Numa situação normal de temperatura e pressão, Alckmin não seria uma escolha. Talvez o vice hoje estaria sendo discutido entre Márcio França, Flávio Dino (lembremos que Manuela D'avila foi a vice do PCdoB em 2018) ou uma empresária desenvolvimentista.
Mas, precisamos refletir, qual o papel do Lula na escolha do seu vice? O que está pensando o melhor presidente da história, segundo pesquisas? Qual o sentimento político do homem que ficou 580 dias preso injustamente às portas de enfrentar uma campanha duríssima e, se eleito, um governo de enormes dificuldades?
Todo o campo de esquerda precisa entender que foi a luta de Lula e sua popularidade histórica que sustentou esse campo de pé no Brasil nesses anos de avanço proto-fascista. Sem Lula, onde estaríamos hoje?
Na questão da vice, Lula deu poucos sinais contundentes, mas não rejeitou a especulação Alckmin, nem nenhuma outra. Penso que sua opinião é a mais importante nessa conjuntura, pois há também nessa articulação a equação paulista. Haddad tem sido uma figura presente ao lado de Lula em todos os eventos e a conquista do governo de São Paulo é, também, algo muito importante para o jogo político nacional. Sem Alckmin e com a aliança PT e PSB, Haddad desponta como favorito para levar o PT a governar o estado pela primeira vez, interrompendo 28 anos de PSDB e derrotando BolsoDória.
A questão de fundo é que estamos iniciando um movimento de avanço após anos de recuo defensivo e esse avanço tem que se dar dentro do cenário do acúmulo de forças na sociedade atual. Qual o estado de espírito da sociedade brasileira, da classe trabalhadora para as eleições de 2022 e para um novo governo Lula?
O voto em Lula é mais amplo que o campo de esquerda, isso é um fato. E o que deseja, pelo que luta esse eleitor do Lula?
Pergunto: qual é hoje o nível de consciência política e organização do povo brasileiro?
O desafio é dialogar com a massa do povo brasileiro ampliando sua consciência política e organização, apontando mudanças mais profundas.
Aqui novamente concordo com Josè Dirceu quando ele afirma que vivemos uma disputa de forças no Brasil e na América do Sul, com um cenário de recuperação paulatina do campo popular e democrático.
A nossa tarefa como militantes locais, e aqui falo como um militante de esquerda de Ribeirão Preto, é atuar para melhorar as nossas organizações (partidos, sindicatos, movimentos sociais), principalmente nas periferias, onde o trabalhador, apesar de todo o sofrimento, ainda está fortemente impactado pela narrativa anti-política e individualista. Nossas periferias votam na direita, votam na opção do pastor (geralmente de direita) ou não votam, desiludidos com a política conforme eles a enxergam.
Que um novo governo popular e democrático se estabeleça em 2023 e que sejamos capazes de aprender com a história: apesar de absolutamente importante, políticas sociais, emprego e distribuição de renda não bastam para tornar uma sociedade politizada e preparada para evitar golpes que lhe retirem direitos. É preciso consciência política e organização social, construída diariamente, na militância. Trazer o próximo governo para uma pauta de esquerda com apoio social é uma tarefa de todos nós.
Que venha 2022 e a vitória.
Ricardo Jimenez - editor do Blog O Calçadão
Perfeita análise. Concordo plenamente com vc. Somo, adicionalmente ao que disseste, que o fato do Lula cogitar a colocar Alckmin como vice é sintomático dessa estrutura política, desse sistema político ser ingovernável (em certo sentido). Em suma: ilustra mais uma consequência do modelo político que temos, do que uma causa. (Roberto Barros)
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