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segunda-feira, 4 de março de 2024

Brasil terá 41% da população com obesidade em 2035, aponta relatório

País terá 41% da população com obesidade em 2035
Imagem: Atlas da Obesidade


Atlas Mundial da Obesidade destaca crescimento dos casos de obesidade em países em desenvolvimento.

Publicado no último dia 2 de março pela Federação Mundial da Obesidade,  o “Atlas Mundial da Obesidade” prevê que até 2035, o número de crianças com obesidade dobre entre meninos e aumente mais de 100% entre meninas. De acordo com o relatório, o problema não se resume mais aos países desenvolvidos. O texto alerta para o crescimento exponencial em países em desenvolvimento, sendo o consumo de ultraprocessados uma das causas. Para o Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional de Ribeirão Preto, é preciso atacar aspectos estrutuais.

Segundo o relatório, isso significa que mais de 1,5 bilhão de adultos e quase 400 milhões de crianças estarão vivendo com obesidade dentro de 12 anos, a menos que medidas significativas sejam tomadas.

De acordo com o relatório, se medidas de prevenção e tratamento não forem aprimoradas, o impacto econômico do sobrepeso e da obesidade pode ultrapassar US$ 4,32 trilhões anualmente até 2035. Isso representa quase 3% do Produto Interno Bruto (PIB) global, equivalente ao impacto financeiro causado pela pandemia de COVID-19 em 2020.

Problema não se restringe aos países de alta renda

O relatório destaca que o problema não está restrito aos países de alta renda. Segundo o texto, os níveis de obesidade estão aumentando mais rapidamente em países de baixa e média-baixa renda, onde os recursos e a capacidade de resposta são muitas vezes limitados. Deste modo, até 2035, estima-se que o impacto econômico do sobrepeso e obesidade seja de mais de US$ 370 bilhões por ano apenas nesses países.

O parecer da Federação Mundial da Obesidade enfatiza a necessidade de ação urgente por parte dos governos e formuladores de políticas e recomenda implementação de planos de ação nacional e a adoção das Recomendações da Organização Mundial da Saúde para a Prevenção e o Manejo da Obesidade são consideradas cruciais para enfrentar esse desafio de saúde global.

Brasil

De acordo com o relatório, a partir de um crescimento de 2,8% nos casos de obesidade, o Brasil, se nada for feito, terá 41% da sua população obesa em 2035. Se o recorte for feito apenas em crianças, este crescimento será de 4,4%, o que levará a um impacto em 3% do PIB nacional. Veja a tabela abaixo. 



Subsídio aos ultraprocessados

A partir dos dados que constam no inquérito Olhe para a Fome e no estudo Premature Deaths Attributable to the Consumption of Ultraprocessed Foods in Brazil , tendo-os debatidos por pesquisadores  na mesa temática Tributação de Alimentos e Saúde, durante a 344ª Reunião Ordinária do Conselho Nacional de Saúde (CNS) em Julho de 2023, o Conselho Nacional de Saúde afirmou que alimentos ultraprocessados como achocolatados e macarrão instantâneo recebem alíquota zero no país, o refrigerante recebe subsídio enquanto que uma abóbora orgânica chega à mesa do consumidor com uma alíquota de 18%.

Ainda de acordo com o CNS, a disparidade atinge, principalmente, as minorias étnicas e de baixa renda, em que , 65% dos lares comandados por pessoas pretas e pardas convivem com restrição de alimentos, sendo o aumento do consumo de ultraprocessados, nos últimos dez anos, , mais expressivo entre a população esta população, além de indígenas, moradores da área rural e das regiões norte e nordeste.

Para COMSEAN, é preciso atacar aspectos estruturais 



Realizada em agosto de 2023, no Instituto Federal de Sertãozinho,  a Conferência Regional de Segurança Alimentar e Nutricional da Regional de Ribeirão Preto apontou a necessidade de se considerar os determinantes estruturais e macrodesafios para soberania e segurança alimentar e nutricional. 

Aspectos como a reforma agrária popular, o acesso a água de qualidade, a produção de alimentos, prioritariamente, livre de agrotóxicos e a indispensável discussão sobre mudanças climáticas, bem como adequações e mitigações de seus efeitos perpassaram o debate do Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional da região. O debate foi dividido em 3 princpais eixos. Veja abaixo, os encaminhamentos da Conferência. 

EIXO 1 - DETERMINANTES ESTRUTURAIS E MACRODESAFIOS PARA A SOBERANIA E SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL:

1.      Programa de Educação Alimentar e Nutricional (EAN):


·  Parcerias contínuas com universidades, OSCs, ONGs, e movimentos sociais.

·   Ações nas escolas, unidades de saúde, e equipamentos sociais.

·  Enfoque em aproveitamento integral dos alimentos, PANC, hortas agroecológicas, entre outros.

·   Distribuição de material impresso e áudio visual para orientação.


2.      Agricultura Urbana


· Criação de um programa de agricultura urbana com incentivos fiscais.

·  Estímulo à criação de hortas comunitárias em terrenos públicos e/ou privados.

·  Parcerias com instituições religiosas e OSCs para implantação de hortas.

·  Priorização de apoio técnico remunerado para agricultores familiares.


3.      Assistência Técnica e Políticas para Agricultura Familiar


·  Garantia de assistência técnica para pequenos produtores.

·  Incentivos financeiros para capacitações de agricultores familiares.

·  Criação de políticas públicas específicas para a agricultura familiar.

·  Implantação de Feiras Livres dos produtos da zona rural.


4.      Tributação e Compras Públicas


·  Redução da tributação sobre alimentos orgânicos/agroecológicos.

·  Ampliação das compras públicas da agricultura familiar.

· Estímulo à criação de associações e cooperativas de agricultores familiares.

·  Promoção de ações para diminuição do desperdício de alimentos.

EIXO 2 - SISTEMA NACIONAL DE SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL (SISAN) E POLÍTICAS PÚBLICAS GARANTIDORAS DO DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA:

1.      Atendimento Diversificado e Cozinhas Comunitárias


·  Estratégias para atendimento de diversos públicos, principalmente em municípios menores.

·  Apoio ao abastecimento do Bom Prato e Cozinhas Comunitárias com produtos de agricultores familiares.

·  Criação de novas cozinhas com orientações técnicas e remuneração para cozinheiras.


2.      Profissionais de Nutrição


·  Garantia de profissionais de nutrição no âmbito escolar e na área da saúde.

·   Foco especial na primeira infância até 1000 dias e gestantes.


3.      Acesso a Água Potável e Saneamento Básico


·  Garantia de acesso a água potável para assentados e comunidades em vulnerabilidade.

· Estratégias para diagnóstico e monitoramento de famílias em insegurança alimentar.


4.      Bancos de Alimentos e Distribuição


·   Criação de bancos de alimentos para demandas emergenciais.

·   Distribuição de cestas básicas e alimentos in natura.

· Fornecimento de hipoclorito de sódio para higienização dos alimentos.

EIXO 3 - DEMOCRACIA E PARTICIPAÇÃO SOCIAL

1.      Comunicação e Participação Social


·  Ampliação dos meios de comunicação para fomentar informações sobre segurança alimentar.

·  Criação de espaços de escuta sobre hábitos alimentares.


2.      Reativação de Conselhos Municipais e Participação Estudantil


· Fomento à reativação dos conselhos municipais vinculados ao SISAN.

·  Estímulo à participação de estudantes universitários nas políticas de segurança alimentar.


3.      Manutenção de CONSEAs e CAISAN’s

·  Criação de políticas e mecanismos para garantir a manutenção de conselhos estaduais e municipais relacionados à segurança alimentar.


Para Joaquim Lauro Sando, da Direção Regional do MST e integrante

do COMSEAN a alimentação não adequada pode causar diferentes

problemas em crianças e adolescentes, tendo a obesidade como o seu

principal problema visível. De acordo com Sando, diversas ações

podem ser tomadas para combater a insegurança alimentar.


"A alimentação inadequada causa diversos problemas em crianças  e  adolescentes, um  dos principais, senão o mais relevante é a obesidade infantil. Os cuidados com a alimentação devem começar bem cedo, a partir daquilo que é servido em casa, mas também no ambiente escolar, sendo este último o melhor local para introdução de políticas de saúde pública, previstas a partir Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948),  bem como  no artigo 6º da Constituição Federal,  na Lei nº 11.947/05, nas Resoluções nº 380/05 e 358/05, do Conselho Federal de Nutricionistas e  Resolução FNDE nº 38/09, dentre outras, ou seja, alimentação adequada é prevista na legislação e dever de todo gestor público.

Cabe destacar a importância do fornecimento na merenda escolar de alimentos oriundos da agricultura familiar e assentamentos da reforma agrária, conforme previsto nas diretrizes do PNAE. Ao ser servido para crianças e adolescente no ambiente escolar uma merenda  orgânica, agroecológica, equilibrada, livre de agrotóxicos, além de promovermos uma alimentação adequada e, consequentemente, saúde, esse programa federal contribui para aumentar a renda de agricultores familiares e camponeses, estimulando a produção de alimentos orgânicos e agroecológicos, valorizando o trabalho no campo e promovendo a saúde de todos.

Outra medida ainda não muito difundida, mas de suma importância é a implantação de hortas nas escolas, pois além de colaborar com o ensino de práticas de plantio, introduz conceitos de sustentabilidade e preservação ambiental, demonstrando aos alunos que é possível produzir sem uso de veneno, e mais do que isso a possibilidade do desenvolvimento de novos hábitos alimentares, contribuindo dessa forma com a segurança alimentar e redução das doenças causadas por uma alimentação inadequada". 

Joaquim Lauro Sando durante oficina doCurso de Formação de Agentes Populares de Agroecologia,
ministrada na Comunidade da Paz em 2021
Foto: Filipe Augusto Peres

Luciano Botelho, da Direção Estadual do MST e presidentedo COMSEAN falou sobre a atuação do MST no combate à insegurança alimentar e às ações que o COMSEAN tem tomado no município para combater tal problema. 


"A Obesidade é reflexo de um sistema alimentar tomado pela indústria alimentícia, responsável pela produção de ultraprocessados, que são compostos químicos nutricionais que não poderiam ser chamados de alimentos. Porém, as consequências da desigualdade social que reduzem a capacidade de compra da maior parte da população pobre levam ao consumo destes produtos, atraídas principalmente pelo preço reduzido ou pela facilidade de acesso.

Diante deste cenário, o MST se propõe há muito tempo a produzir alimentos saudáveis com o propósito de garantir acesso a toda população. No entanto, diante das dificuldades tecnológicas e da falta de incentivo por parte das políticas públicas, os custos de produção dos alimentos agroecológicos são elevados, o que limita o acesso dos mais pobres a estes produtos, que em comparação com os ultraprocessados têm um preço mais alto. Por este motivo, o MST vê o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) como exemplos fundamentais da garantia de acesso à classe trabalhadora a alimentos saudáveis produzidos pelos assentamentos, e defende que esses programas devem ser ampliados e potencializados em conjunto com investimentos em infraestrutura e tecnologia para a produção na reforma agrária.

É importante destacar que o MST na Região de Ribeirão Preto doou mais de 40 toneladas de alimentos agroecológicos às comunidades no período da pandemia de Covid-19, demonstrando a efetividade da reforma agrária na produção de alimentos, em contraponto ao agronegócio regional que não respondeu e nem responderá às necessidades alimentares da população, pois o único objetivo deste setor, que domina os investimentos públicos, é a geração de lucro.

Ou seja, por um lado, o agronegócio está preocupado com a produção de commodities e a indústria alimentícia está cada vez mais preocupada com a expansão do consumo de ultraprocessados, ambos visando apenas o lucro e recebendo as mais diversas benesses do Estado. Por outro lado, estão os agricultores familiares e o MST lutando cotidianamente para garantir a produção de alimentos saudáveis, ainda com o desafio de atingir as pessoas mais pobres, em detrimento da falta de investimento por parte do Estado. É óbvio que vivemos uma pandemia de obesidade, criada por esta dinâmica do sistema capitalista, que visa o lucro acima do ser humano.

Nesse contexto, o COMSEAN de Ribeirão Preto vem provocando este debate desde a sua recriação em 2018, buscando inicialmente permitir o acesso de toda a produção do assentamento Mário Lago (PDS da Barra) na Merenda Escolar do município de Ribeirão Preto, e fortalecendo o debate sobre alimentação saudável e acessível à população, o que levou inclusive à participação na construção de projeto de lei municipal para combater a obesidade infantil, a partir de um diagnóstico e a retirada de cantinas de escolas públicas. Um importante debate foi realizado por meio do Fórum de Soberania e Segurança Alimentar da Câmara Municipal, onde se discutiu o tema da obesidade com a participação de especialistas, que apresentaram os diversos impactos do consumo de alimentos ultraprocessados, tanto na saúde quanto para os cofres públicos.

Em suma, é evidente que a Obesidade se tornou um problema grave, não apenas nos aspectos estéticos, mas como reflexo de uma má alimentação incentivada pela indústria alimentícia e apoiada em diversos aspectos pelas esferas públicas, seja na omissão ou na parceria direta. Cabe à sociedade organizada em Conselhos ou Movimentos Sociais como o MST lutar constantemente para possibilitar um sistema alimentar saudável, acessível e diverso, que não se restrinja apenas à qualidade do alimento, mas que valorize toda a cadeia em que ele é produzido, desde a necessidade de uma reforma agrária agroecológica até o acesso pleno aos alimentos saudáveis por meio de políticas públicas que incentivem essa mudança e denunciem a prejudicialidade dos alimentos ultraprocessados".

Luciano Botelho, Presidente do COMSEAN e militante do MST pela Direção Estadual.
Foto: Filipe Augusto Peres






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