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quinta-feira, 15 de maio de 2025

João Pedro Stedile apresenta programa do MST para enfrentar a crise climática e alimentar com agroecologia em escala

 

O modelo capitalista de produção de alimentos não alimenta o povo 
Fotos: @filipeaugustoperes

MST contrapõe o modelo de produção do agronegócio com ciência, tecnologia popular e soberania alimentar


Na manhã de sábado (10), durante a conferência “Agroecologia: produzir alimentos e enfrentar a crise climática”, realizada na 5ª Feira Nacional da Reforma Agrária, em São Paulo, João Pedro Stedile, da Coordenação Nacional do MST, compartilhou com o público uma ampla reflexão sobre o percurso do movimento e os caminhos traçados para enfrentar os desafios impostos pela crise ambiental, social e alimentar no Brasil. 


Diante de um grande público, o militante agradeceu a presença de Carlos Nobre e homenageou figuras centrais para a história da agroecologia no país, como Ana Maria Primavesi, em que reafirmou o papel das mulheres e da ciência popular na construção do projeto político do movimento.


Grande público 

Stedile relembrou que, nos primeiros anos do MST, a luta concentrava-se na conquista da terra. No entanto, com o avanço do agronegócio e da financeirização da agricultura, o movimento compreendeu que apenas o acesso à terra não era suficiente para resolver os problemas estruturais da sociedade.


“Não basta ocupar a terra. Precisamos produzir comida saudável, enfrentar os crimes ambientais e oferecer uma alternativa viável à população. […] Agroecologia não é retórica. […] A agroecologia tem que ser para todo mundo e, portanto, para garantir alimentos para todo mundo, tem que ter escala.”


Ao longo de sua fala, o dirigente ressaltou que o agronegócio não produz comida, mas commodities voltadas à exportação. 


“Esse modelo não alimenta o povo brasileiro. Reproduz a lógica colonial e agrava a desigualdade social”, afirmou. 


Em contraponto, o MST tem apostado na agroecologia como caminho concreto para a soberania alimentar. 


“Agroecologia não é retórica, é ciência. É um sistema de produção que precisa ser aplicado em larga escala”, destacou. Para isso, o movimento tem apostado em estratégias práticas e estruturantes”.


Agroecologia é ciência 

Dentre as iniciativas apresentadas, Stedile lembrou do compromisso assumido pelo MST de plantar 100 milhões de árvores em todo o território nacional. A proposta, segundo ele, vai além da simbologia e deve se tornar uma política pública permanente. 


“Nosso sonho é ver árvores plantadas ao longo de todas as rodovias federais. Já existe norma técnica que permite isso. O que falta é decisão política”


Ainda sobre a proteção ambiental, João Pedro anunciou a criação de um Conselho Popular para fiscalizar e sugerir ações da campanha de reflorestamento, ampliando o diálogo com a sociedade civil.


O militante também apresentou o plano do movimento para massificar a produção de alimentos saudáveis. Isso inclui investimentos em sementes crioulas e orgânicas, instalação de fábricas de fertilizantes orgânicos e a importação de máquinas agrícolas adaptadas à realidade da agricultura familiar. “Quem não controla as sementes, não controla a agricultura”, afirmou, ao destacar que o MST está desenvolvendo acordos com instituições internacionais para resgatar variedades como o trigo orgânico, além de ampliar a produção de soja e milho livres de transgênicos.


Sobre os fertilizantes, Stedile ressaltou a ausência de interesse do capital privado em atender a agricultura camponesa: 


“Entrem aí na internet, procurem onde comprar um saco de adubo orgânico. Não tem. Os capitalistas não se interessam pra isso nem pra ganhar dinheiro.” 


Ele anunciou a construção de fábricas com tecnologia chinesa capaz de transformar resíduos orgânicos em adubo em apenas sete dias. 


“Vamos começar com uma unidade em Nova Santa Rita, no Rio Grande do Sul, e depois expandir para Curitiba, Belo Horizonte, Feira de Santana e Ceará.”


Fábricas com tecnologia chinesa serão construídas 


No campo da mecanização, o MST está apostando na implantação de pequenas indústrias de maquinário voltadas ao cultivo em áreas reduzidas, adaptadas à realidade dos assentamentos e comunidades tradicionais. 


São  áquinas agrícolas voltadas à produção em áreas de até um hectare com base em experiências chinesas. O MST pretende montar estas fábricas em regiões historicamente excluídas do processo industrial brasileiro, como o interior do Maranhão e o Norte do país.


“Nós vamos trazer uma pequena máquina colheitadeira de arroz que é do tamanho de uma Kombi e custa R$ 22 mil. E a fábrica vai ser instalada em Açailândia, no meio da Amazônia, para fazer o povo de lá voltar a plantar arroz com sua origem ancestral.”


Segundo ele, essa descentralização é estratégica. 


“A nossa burguesia não é nacional. Tem raiva do nosso povo, tem raiva de preto, de quem não é paulista. Coloca todas as fábricas no Sudeste. Nós vamos levar para o interior, para o Nordeste, para a Amazônia, para que o povo seja dono da fábrica”.


Stédile também criticou a burguesia brasileira.


“A burguesia brasileira tem raiva do povo. Por isso concentra suas fábricas no Sudeste. Nós vamos levar as máquinas para o interior, para que o povo seja dono do seu próprio processo produtivo”, defendeu.


Stedile também anunciou que o movimento trabalha para substituir as caldeiras a lenha das agroindústrias por energia solar concentrada, com tecnologia acessada por meio de acordos internacionais. Para ele, é inadmissível que a agricultura camponesa ainda dependa de lenha para processar seus produtos. 


“Se a Embrapa e as universidades não assumirem essa tarefa, nós vamos resolver isso com os comunistas da China, que têm compromisso com o bem coletivo e não com o lucro”, disse.


Se o governo brasileiro não colaborar, a China colabora


João Pedro encerrou com um convite ao diálogo com a ciência e com as instituições públicas. Segundo ele, o MST está disposto a firmar parcerias com pesquisadores, universidades, a Embrapa e governos, para transformar a agroecologia em uma agricultura de escala capaz de fornecer os 167 alimentos que a Conab se dispõe a comprar. 


“Temos um horizonte enorme para garantir comida saudável na mesa do povo brasileiro. Mas para isso precisamos ousar, enfrentar o sistema e apostar na aliança entre ciência, luta social e soberania popular”, concluiu.



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