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quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

PARCERIA PARA INGLÊS VER

Estudo técnico para escolha do livro para licitação cita termos da parceria. Educação alega que acordo só foi firmado após licitação.

por Ailson Cunha
para o Blog O Calçadão, 01 de dezembro de 2021.

A Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto firmou, em outubro, um acordo de cooperação com a Editora da Universidade de Cambridge (Cambridge University Press, CUP). O acordo é assinado pelo Secretário da Educação, Felipe Elias Miguel, pelo professor e assessor pedagógico de língua inglesa, José Ricardo de Oliveira Cunha, e pelo Diretor da Editora da Universidade de Cambridge no Brasil, João Sabino Madureira Neto. A parceria visa a capacitação de professores e a realização de outras atividades relacionadas e não contempla a transferência de recursos financeiros. Contudo, o Blog O Calçadão apurou que o acordo previa a adoção de material didático (saiba mais aqui).

Esse material didático foi adquirido agora em outubro por meio de licitação. O edital de licitação 338/2021, tinha como objeto aquisição de livros didáticos de língua inglesa para o ano letivo de 2022, mas especificava as marcas dos livros a serem adquiridos:

Livro

Aluno

Professor

Game Changer Level 1

Student's Book and Workbook with Digital Pack

3005

44

Game Changer Level 2

Student's Book and Workbook with Digital Pack

3044

45

Game Changer Level 3

Student's Book and Workbook with Digital Pack

2845

41

Game Changer Starter

Student's Book and Workbook with Digital Pack

Editora: Cambridge University Press

3148

45

American Guess What! 1A Combo with Online Resources.

Editora: Cambridge University Press

14742

273

Total parcial

26.784

448

Total

27.232

 Acontece que a licitação de bens de marca específica fere o §5º do art. 7º e o §7º inciso I do art. 15º da Lei Federal nº 8.666/93 (que estabelece as normas sobre licitações e contratos administrativos), a saber:

Art. 7o As licitações para a execução de obras e para a prestação de serviços obedecerão ao disposto neste artigo e, em particular, à seguinte sequência:

§ 5o É vedada a realização de licitação cujo objeto inclua bens e serviços sem similaridade ou de marcas, características e especificações exclusivas, salvo nos casos em que for tecnicamente justificável, ou ainda quando o fornecimento de tais materiais e serviços for feito sob o regime de administração contratada, previsto e discriminado no ato convocatório.

Art. 15. As compras, sempre que possível, deverão:

§ 7o Nas compras deverão ser observadas, ainda:

I - a especificação completa do bem a ser adquirido sem indicação de marca;

 

Também fere os incisos II e XVI, alínea a, item 1, do art 3º do Decreto Municipal 80/2020:

Art. 3º. Para fins do disposto neste Decreto, considera-se:

II - bens e serviços comuns - bens cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações reconhecidas e usuais do mercado;

XVI - termo de referência - documento que de verá conter:

a) os elementos que embasam a avaliação do custo pela administração pública, a partir dos padrões de desempenho e qualidade estabelecidos e das condições de entrega do objeto, com as seguintes informações:

1. a definição do objeto contratual e dos métodos para a sua execução, vedadas especificações excessivas, irrelevantes ou desnecessárias, que limitem ou frustrem a competição ou a realização do certame;

 

Por outro lado, o §5º do art 7º também estabelece que tais licitações são possíveis quando for tecnicamente justificável. Para o advogado e especialista em licitações, Rodrigo Camargo, há possibilidade de compra de livro didático específico, inclusive com inexigibilidade de licitação, pois há jurisprudência no Supremo Tribunal Federal, STF, e em órgãos de controle, desde que a compra seja amparada por um estudo com rigor técnico. Para o especialista, quando a Prefeitura renuncia ao rigor técnico do PNLD (Plano Nacional do Livro Didático) deve ter o mesmo rigor em seu estudo técnico formado por especialistas para a escolha do livro.

O Blog O Calçadão conseguiu, via Lei de Acesso à Informação, LAI, acesso aos documentos desse processo, que inclui o estudo técnico, pareceres jurídicos e outros documentos.

A necessidade de estudo técnico para a licitação foi apontada inclusive pela Procuradora Geral do Município, Ana Maria Seixas Paterlini, quando acionada para análise e manifestação.

 

“Ressalta-se, no entanto, que não obstante a escolha de determinado livro didático esteja no campo do poder discricionário da autoridade pública, ela deve estar baseada em estudo técnico conclusivo que a justifique. Nesse sentido, a escolha da autoridade competente pelo livro de inglesa específico está baseada no estudo técnico preliminar realizado pela equipe pedagógica, fls. 69/78, firmada por três servidores, mas sem a indicação dos correspondentes cargos públicos, o que se sugere seja complementado, em atendimento ao §§ 5º e 6º do art. 7º da Lei nº 8.666/93” (Parecer nº 860/2021).

 


Esse Estudo Técnico Preliminar da SME foi realizado em agosto e é assinado por três servidores: Cláudia Maria Remonti (PEB III – Secretária Adjunta), José Ricardo De Oliveira Cunha (PEB III – Assessor pedagógico) e Jeremias Ricardo Carvalho (PEB III – Chefe da divisão de gestão pedagógica).


 Ele apresenta uma consideração inicial em que defende o ensino de língua inglesa desde as séries iniciais e em seguida, a justificativa para a compra do livro. Para tanto, apresenta que a rede irá utilizar a metodologia “CLIL” – “Content and Language Integrated Learning” (Aprendizado Integrado de Conteúdo e Linguagem) “aquela que melhor se adequa a todas essas demandas, sendo hoje uma das metodologias mais amplamente difundidas e empregadas em diversos contextos educacionais nacionais e internacionais” (Estudo Técnico preliminar). Também apresenta como justificativa o processo de avaliação do conhecimento com base no Quadro Europeu Comum de Referência (Common European Framework of Reference, CEFR).

A partir desses dois critérios, o estudo da SME diz que encontrou na Editora da Universidade de Cambridge as qualificações:

ao buscar por uma editora que pudesse tanto viabilizar o fornecimento de materiais didáticos de qualidade reconhecida e em consonância com a abordagem metodológica escolhida, como também disponibilizar o acesso para os professores de língua inglesa da Rede a cursos de formação e de capacitação linguística e metodológica para sua melhor implantação e execução, a Secretaria Municipal da Educação encontrou na Editora da Universidade de Cambridge (CUP) todos esses elementos citados, além de outros a serem destacados posteriormente. (Estudo Técnico Preliminar)

 

Contudo, esse mesmo estudo não especificou, em nenhum momento, quais outras editoras foram procuradas, consultadas ou analisadas (se é que existiriam), nem tampouco por qual ou quais motivos e critérios elas foram excluídas do processo. O que fica evidente no estudo é que houve um diálogo entre a SME e a CUP até no sentido de orientação, conforme vemos a seguir:

“Falando mais especificamente desses materiais, a editora ofereceu diversas coleções e títulos, que foram cuidadosa e criteriosamente analisados e selecionados, levando-se em conta os referenciais educacionais e pedagógicos norteadores desta Rede - dentre os quais, a BNCC (Base Nacional Comum Curricular) e o Referencial Curricular da Rede Municipal de Ribeirão Preto - juntamente com o maior alinhamento possível com a metodologia “CLIL”, que norteará todo o trabalho pedagógico em consonância com os referenciais supracitados, e sem abrir mão da já citada autenticidade dos conteúdos linguísticos em língua inglesa”. (Estudo Técnico Preliminar)

 

Em outro trecho do documento, fica evidente que a SME mantinha um diálogo com a Editora da Universidade de Cambridge, já em agosto, durante a realização do Estudo Técnico o que pode torna-lo parcial ao buscar definir o livro didático mais adequado a ser adotado na rede municipal de Ribeirão Preto. O estudo traz inclusive cláusulas do acordo de cooperação que a Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto viria firmar com CUP depois:

a Editora da Universidade de Cambridge (CUP) já se colocou à disposição para promover ações em conjunto com a Secretaria Municipal da Educação, com vistas a complementar este processo de formação continuada. Tanto para os professores regentes, como também para os especialistas, a Editora da Universidade de Cambridge (CUP) ajudará na capacitação e desenvolvimento dos mesmos, para que possam melhor se preparar para a implementação da metodologia, assim como da operacionalização dos materiais didáticos. (Estudo Técnico Preliminar)

No próprio estudo, que é datado de 11 de agosto de 2021, já são citados os serviços que seriam oferecidos pela CUP na parceria entre a Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto e a CUP que viria a ser firmada apenas em 25 de outubro: “Teste online de nivelamento; Curso online assíncrono para desenvolvimento e aprimoramento linguísticos; Capacitação síncrona online dos materiais que serão adotados” (Estudo Técnico Preliminar).

Por fim, vale destacar que o estudo aponta uma estreita relação entre os conteúdos dos livros da CUP e os conteúdos cobrados no exame de proficiência de Cambridge (óbvio, não?!):

“Vale a pena ressaltar que todos os exames de proficiência linguística de Cambridge foram criteriosamente pensados e desenvolvidos com base no QECR, documento norteador que serve de referência para a autenticidade e validade de diversos outros exames de proficiência de língua estrangeira”. (Estudo Técnico Preliminar)

O estudo destaca a importância que é ter um exame de proficiência de Cambridge, mas não menciona que há tantos outros exames de proficiência aceitos por empresas e universidades em programas de pós-graduação, como por exemplo:

  • TOEFL (Test of English as a Foreign Language);
  • IELTS (International English Language Testing System);
  • TOEIC (Test of English for International Communication); 

Não questionamos a defesa do ensino de língua estrangeira nas séries iniciais (importante para rede municipal!), nem tampouco a boa qualidade dos materiais da Editora da Universidade de Cambridge (inegável). O que se questiona aqui é a ausência de outras editoras no processo que podem/poderiam oferecer materiais didáticos de qualidade equivalente aos materiais (e serviços) oferecidos pela CUP criando uma competição saudável que poderia trazer benefícios aos cofres públicos. Segue uma lista de editoras possíveis:



A Prefeitura foi cuidadosa em realizar uma compra de livros por meio de pregão eletrônico, aponta Camargo, mas isso não significa que necessariamente houve observância dos princípios constitucionais relacionados ao dinheiro público como economicidade, eficiência, pois houve uma especificação do produto o que restringiu competição no processo licitatório o que poderia tornar o preço mais caro. O especialista também aponta que a parceria entre a Prefeitura e a CUP não foi exatamente ‘sem custos’, uma vez que houve aquisição de grande quantidade de material didático da própria editora. Nesse sentido, Camargo ressalta que deve ‘haver um controle rígido’, seja da Câmara Municipal de Ribeirão Preto, responsável por fiscalizar o executivo, seja pelos órgãos de controles, “se foi vantajoso para o município, se foi vantajoso para a educação municipal a escolha desse sistema... no sentido econômico e de eficiência”.

O Outro lado

Em nota enviada ao Blog O Calçadão, a SME afirma que a parceria foi realizada após a aquisição do material didático realizada por meio de processo licitatório. A SME também afirma que teve parecer favorável ao acordo e que tem autonomia para escolha do material. (veja nota completa abaixo)

Nota da SME sobre a Parceria com a CUP e a licitação dos livros da CUP

A Secretaria da Educação informa que a aquisição do material didático foi realizada por meio de processo licitatório e o acordo de cooperação com a editora foi firmado após o certame. Esclarecemos ainda que o acordo de cooperação, sem custo, possui Parecer Jurídico favorável da Procuradoria Geral do Município e consiste na capacitação dos professores da rede. Os dois processos são públicos.

 Informamos também que a Secretaria Municipal da Educação, de acordo com o artigo 70 da LDB, tem autonomia para a escolha do material didático da sua rede.  Secretaria da Educação

Um comentário:

Unknown disse...

E agora????
PSDB...NADA ACONTECE!😷👀🖤

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