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quinta-feira, 14 de agosto de 2025

Soberania

 



abrir mercado
é abrir porta de pedra:
não para o lucro de poucos,
mas para o pão de todos

porta de pedra não se empurra
com moeda do norte;
ela cede à força
de mãos em mutirão

a semente cruza o próprio mar
permanece em solo próprio
brota sem veneno,
alimenta quem planta
e quem come

se a porta do norte
se fecha com cadeado,
há sulcos no sul
onde a chave é enxada

o sul traz
arroz das águas lentas
outro envia
mel do cerrado vivo

partilhamos
milho crioulo e feijão de corda;
os mais distantes
semeiam trigo orgânico entre ervas nativas

entre rios que irrigam hortas
e ventos que espalham pólen,
circula o comércio sem patrão,
onde o peso não é moeda
mas medida de confiança

o que se vende
não é mercadoria,
é alimento livre
de dívida e de fome

o que se compra
não é produto,
é a certeza de comer
sem envenenar a terra

o mar próprio é mercado
quando leva mudas entre irmãos
o rio é mercado
quando troca peixe por raízes

o mapa é pedra bruta
talhada em caminhos de feira
e o globo é pilão de barro
que gira com as mãos dos povos

soberania é isso:
não pedir ao patrão global
que abra a porteira;
é plantar na cerca,
derrubar o arame,
e fazer do chão ocupado
uma roça coletiva


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Soberania

  abrir mercado é abrir porta de pedra: não para o lucro de poucos, mas para o pão de todos