O Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais ‘Anísio Teixeira’, INEP, divulgou durante a
semana os resultados das escolas no Exame Nacional do Ensino Médio, ENEM 2014. Este
ano o INEP foi mais ágio e conseguiu divulgar estes dados agora no início de
agosto, o que em tese pode contribuir para melhorar a qualidade das escolas
ainda este ano ao indicar a elas suas áreas mais problemáticas que, por sua
vez, pode proporcionar um debate entre educadores e provocar um ajuste nas suas
metodologias e práticas. Trata-se de um avanço, pois, no ano passado, o INEP só
divulgou tais resultados no início de dezembro quando os estudantes já haviam
finalizado o ano e realizado o ENEM e os principais vestibulares do país. Além
disso, as aulas já haviam sido encerradas e muitos professores já estavam de
férias, de tal modo que os resultados do ano passado podem não ter sido tão bem
analisados e debatidos pela comunidade escolar. E é justamente a análise e o
debate desses resultados pela comunidade escolar a finalidade de sua divulgação
pelo INEP.
Como uma forma de contribuir
um pouco para tal análise e debate gostaria de fazer algumas considerações
sobre estes resultados e compará-los aos resultados do ano anterior uma vez que
já no ano passado tive a oportunidade de escrever sobre o assunto para o blog O
Calçadão (leia aqui).
Em primeiro lugar, devemos
ressaltar que os resultados divulgados pelo INEP (veja aqui) são bem mais completos
que os resultados divulgados por outros meios de comunicação. Alguns jornais,
por exemplo, se limitam a divulgar apenas a média das escolas nas áreas de
avaliação do ENEM e uma média dessas notas, com a qual fazem uma classificação
das escolas. Infelizmente a grande parte da população, incluindo gestores e
educadores, só tem acesso a esses dados, prejudicando muito o debate.
Este ano, o INEP divulgou
três conjuntos de dados sobre as escolas:
1º)
Características da escola: Nesse conjunto de dados o INEP divulga
dados sobre a escola:
a) Dependência
administrativa: se a escola é municipal, estadual, federal ou privada;
b) Número de alunos no
Censo: quantidade de alunos matriculados no 3º ano do Ensino Médio da escola de
acordo com o Censo escolar.
c) Porte da escola: de
acordo com o número de alunos a escola é classificada em um porte (menor que 30
alunos, entre 30 e 60 alunos, entre 60 e 90 alunos ou mais que 90 alunos);
d) Número de participantes no
ENEM. Quantidade absoluta de alunos que realizaram o exame. Escolas com poucos participantes
(menor que 10) não têm seus resultados divulgados.
e) Taxa de participação:
porcentagem de alunos participantes no exame. Escolas com baixa taxa de
participação (menor que 50%) também não têm seus resultados divulgados. Isso
explica porque muitas escolas, principalmente estaduais não estão na lista.
2º)
Indicadores: Conjunto de dados sobre o perfil dos alunos
e professores da escola:
a) Indicador de permanência
na escola: indica qual a porcentagem de tempo do Ensino Médio aluno cursou na
escola. Esse dado é importante, pois muitas escolas ‘caçam’ bons alunos no
último ano em busca de melhorar a nota da escola no ENEM.
b) Indicador de nível
socioeconômico (INSE): de acordo com a renda da família do estudante, são
indicados INSE da escola. Algumas pesquisas relacionam o INSE com o desempenho
dos alunos.
c) Indicador de formação
docente: Indica a porcentagem de docentes com formação em nível superior.
d) Faixa de formação
docente: Com base no Indicador de formação docente são estabelecidas faixas de
formação docente.
e) Taxa de aprovação, reprovação
e abandono: taxas da escola com base nos dados do Censo escolar.
3º)
Desempenho da escola: Para cada uma das quatro áreas avaliadas
(Linguagens; Matemática; Ciências Humanas e Ciências da Natureza) e para a
Redação, o INEP divulga um conjunto de dados sobre o desempenho médio da
escola:
a) Média: média dos alunos da
escola na área de conhecimento ou na redação.
b) Média dos 30 melhores:
média dos 30 melhores alunos da escola na área do conhecimento. Esse número
pode indicar grandes desigualdades na escola.
c) Percentual de alunos por
nível: o INEP também mostra a porcentagem de alunos da escola subdivididos em 5
níveis de proficiência em cada área.
Esse conjunto de dados a
respeito de uma escola ou de um conjunto de escolas de uma cidade pode fornecer
informações importantes tanto para professores e gestores como para pessoas da
comunidade escolar visando a melhoria da escola/sistema de ensino. É
importante, portanto, que as pessoas responsáveis por essas informações nas
escolas as divulguem e a partir dela promovam debates sobre os rumos da
educação.
Taxa
de participação: O INEP divulgou dados de 45
escolas em Ribeirão Preto (veja aqui), sendo 12 estaduais, uma municipal e 32
da rede privada. Esse número é inferior ao número de escolas existentes na
cidade, pois conforme já foi mencionado, o INEP não divulga as notas de escolas
com número de participantes inferior a 10 e com taxa de participantes menor que
50%. Chama a atenção novamente o grande número de escolas da rede estadual que
não tiveram seus dados divulgados provavelmente devido à baixa taxa de
participação que mesmo nas escolas estaduais que tiveram seus dados divulgados
gira em torno de 60% de participação. Além disso, quando verificamos o INSE das
escolas, só encontramos escolas com INSE médio alto, alto ou muito alto nos
dados divulgados. Ora, ou em Ribeirão Preto não tem pobre, ou o pobre de Ribeirão
Preto não faz o ENEM.
Já havia comentado em outro
post (aqui) que esse é um dado revelador, pois comprova que a exclusão ocorre
antes mesmo do exame de seleção. Sem o ENEM o estudante fica fora dos
principais programas educacionais do governo (PROUNI, FIES, SISU, SISUTEC).
Cabe nos perguntar, portanto: por que isso ocorre? Nem a Secretaria Estadual de
Educação nem a Diretoria Regional de Ensino mencionam o resultado. Mas o fato é
que grande parte dos alunos do ensino médio formados em escolas estaduais
sequer chegam a realizar o exame demostrando falta de compromisso e/ou
motivação com próprio futuro, e isto é, em grande parte, fruto de políticas
públicas mal elaboradas resultando em um sistema de ensino precário e falido. E
ainda por fim, somos obrigados a assistir aos mandos e desmandos do Governador
Geraldo Alckmin.
INSE: Novamente quando analisamos
o quadro do desempenho das escolas de Ribeirão Preto, verificamos que as
escolas de maior desempenho médio têm INSE alto ou muito alto, da mesma forma como ocorre no Brasil todo. Isto é um ‘tapa
na cara’ dos defensores da meritocracia: qual o mérito de se ter um pai rico
que pode pagar uma escola cara para seu filho, com excelente estrutura, climatizada,
com computadores e projetores em salas, onde professores jamais faltarão e que
lhe garantirá, ao final do ensino médio, tirar boas notas no ENEM? Não há
meritocracia nisso, há injustiça social se refletindo no ENEM. Um médico hoje
que ganha 20mil reais pode pagar 2mil reais de mensalidade em uma escola que
dará condições ao filho de cursar medicina em uma universidade pública. Uma
empregada doméstica que ganha 1,5mil reais mensais colocará seu filho em uma
escola pública estadual onde, possivelmente, ele nem sequer será motivado a
realizar o ENEM que dirá fazer medicina em uma universidade pública.
Enfim... É um ciclo que
precisa ser quebrado. E a ruptura desse ciclo só ocorrerá por meio da educação,
por meio de bom investimento em educação, por meio de compromisso dos gestores,
por políticas públicas decentes em educação. Algumas coisas estão sendo feitas, mas ainda é pouco. É preciso mais. O ENEM mostra isso. O resultado do ENEM só comprova mais do mesmo: ainda estamos longe de ser a tal 'Pátria Educadora'.
Ailson Vasconcelos da Cunha,
professor e doutorando. Um eterno aprendiz.
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