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quarta-feira, 28 de maio de 2025

Às custas de quem? Relatórios revelam como a concentração de riqueza, terras e privilégios fiscais aprofunda a desigualdade no mundo e no Brasil


Meritocracia não existe: sessenta por cento da riqueza dos bilionários têm origem em heranças, monopólios e conexões políticas

Documentos da Oxfam, CPT expõem que a concentração de patrimônio, terra e a crise da tributação alimentam a fome, a pobreza e a exclusão social, enquanto fortalecem uma elite econômica global


Enquanto líderes mundiais e grandes empresários se reuniam no Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça, para debater os rumos da economia global, a Oxfam publicou no dia 20 de janeiro de 2025 o relatório “Às custas de quem? – A origem da riqueza e a construção da injustiça no colonialismo”. O documento lança luz sobre a aceleração da concentração de riqueza nas mãos de uma minoria e sobre como esse processo aprofunda desigualdades em escala global e nacional.


De acordo com o relatório, 


desde 2020, quase dois terços de toda a nova riqueza criada globalmente foram apropriados pelo 1% mais rico da população mundial”


No mesmo período, 


“a fortuna dos bilionários cresceu quatro vezes mais rápido do que a renda do restante da população”(OXFAM, 2025). 


Além disso, o documento destaca que


 “cinco indivíduos detêm atualmente uma fortuna superior à riqueza combinada de metade da população mundial”


evidenciando uma realidade marcada pela extrema concentração patrimonial.


No Brasil, a mesma lógica se reproduz. Segundo o relatório, 


“seis bilionários brasileiros concentram uma riqueza equivalente à da metade mais pobre da população nacional” (OXFAM, 2025). 


Esse quadro não se restringe às finanças, mas também se materializa na estrutura fundiária do país.


Concentração de terras amplia desigualdade e limita a soberania alimentar no Brasil


Embora o relatório de 2025 não trate diretamente da questão fundiária, levantamentos anteriores da Oxfam Brasil, como Terrenos da Desigualdade”, além de dados atualizados da Comissão Pastoral da Terra (CPT, 2024), reforçam que a concentração de terras segue como um dos pilares da desigualdade econômica no país.


O relatório da Oxfam (2016) é taxativo ao afirmar que 


“menos de 1% das propriedades agrícolas no país detêm quase metade da área rural brasileira”


Especificamente, 


propriedades com mais de 1.000 hectares representam apenas 0,9% dos estabelecimentos, mas concentram 45% da área total”


No outro extremo, 


“pequenas propriedades com até 10 hectares correspondem a 47,8% dos estabelecimentos, mas ocupam apenas 2,3% da área rural”.


Relatórios recentes da CPT (2024) reforçam que 


“a financeirização da terra, o avanço do agronegócio e a grilagem seguem intensificando os conflitos no campo e aprofundando a concentração fundiária”


Além disso, segundo a Oxfam (2016), 


“729 pessoas físicas e jurídicas no Brasil possuem imóveis rurais com dívidas superiores a R$ 50 milhões cada junto à União, totalizando aproximadamente R$ 200 bilhões”


A soma dessas áreas seria suficiente para “assentar mais de 214 mil famílias”.


O mesmo relatório destaca que a lógica da concentração também atinge o acesso ao crédito: 


“grandes propriedades acessam cerca de 43% do crédito rural, enquanto os pequenos produtores, que correspondem a mais de 80% dos estabelecimentos, ficam com uma parcela entre 13% e 23%”


Paradoxalmente, são esses pequenos produtores que “garantem mais de 70% dos alimentos que chegam às mesas da população brasileira”.


Arquitetura fiscal perpetua privilégios e amplia as desigualdades globais


O relatório da Oxfam (2025) conecta diretamente a concentração patrimonial à crise da arquitetura fiscal global. 


Segundo o documento, 


um terço da riqueza dos bilionários está atualmente oculto em paraísos fiscais”, o que representa uma evasão que drena trilhões dos cofres públicos, enfraquecendo os sistemas de proteção social.


Além disso, a publicação aponta que 


o 1% mais rico paga, proporcionalmente, muito menos impostos do que qualquer trabalhador comum”


uma realidade sustentada por sistemas tributários regressivos que priorizam impostos sobre o consumo e sobre a renda do trabalho, enquanto oferecem isenções ou baixa tributação sobre lucros, dividendos e grandes fortunas.


O documento também  afirma que 


“os mesmos bilionários e líderes políticos que discursam sobre justiça social e sustentabilidade em Davos são, frequentemente, os que mantêm práticas econômicas que aprofundam a desigualdade e comprometem os recursos ambientais”


A publicação reforça ainda que 


“sessenta por cento da riqueza dos bilionários têm origem em heranças, monopólios e conexões políticas”


desmontando o discurso meritocrático frequentemente utilizado para justificar esse acúmulo.


Desigualdade não é uma fatalidade. É escolha política.


O alerta dos relatórios da Oxfam e da CPT  é claro: a desigualdade não é natural, nem inevitável. Ela é resultado de escolhas políticas que priorizam os interesses de uma minoria super rica em detrimento da maioria da população. 


Segundo a Oxfam (2025), “mantido esse modelo econômico, o mundo poderá, nos próximos dez anos, ter ao menos cinco trilionários, enquanto bilhões seguirão vivendo abaixo da linha da pobreza”.


Diante desse quadro, as propostas são diretas: taxação de grandes fortunas, fim das isenções sobre lucros e dividendos, combate aos paraísos fiscais, aumento dos impostos sobre heranças bilionárias e retomada de políticas efetivas de reforma agrária. Além disso, é fundamental investir massivamente em saúde, educação, segurança alimentar, proteção social e na transição ecológica justa.


O recado que emerge desses documentos é contundente: sem enfrentar a concentração de riqueza, renda e terra, qualquer promessa de combate à pobreza, à fome e às desigualdades seguirá sendo apenas discurso — como tantas vezes se observa nos salões fechados de Davos ou discursos de políticos de estimação.


Fontes e referências


OXFAM. Às custas de quem? – A origem da riqueza e a construção da injustiça no colonialismo. São Paulo: Oxfam Brasil, 2025.


OXFAM BRASIL. Terrenos da Desigualdade: terra, agricultura e desigualdade no Brasil rural. São Paulo: Oxfam Brasil, 2016.


COMISSÃO PASTORAL DA TERRA (CPT). Conflitos no Campo Brasil 2024. Goiânia: CPT, 2025.



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