POR ÁLVARO MAIA
Há pessoas consciêntes (doeu?) que não entendem por que
mensagens tão belas de amor e fraternidade irritam alguns amigos que
aparentemente também são "bons".
Não é simples, mas é possível
entender.
Guillaume-Henri Dufour,
engenheiro militar, líder e vencedor da guerra civil suíça de 1847, dedicou-se
a construir escolas e pontes, e também criou a Cruz Vermelha Internacional. Ele
FEZ o que era preciso fazer, com guerra, com engenharia e atitudes coerentes
com tudo aquilo que aprendeu da trilogia de Rousseau -- Contrat Social, Discours et Emille
-- e ajudou a construir um país digno para todos. A força da educação: na
Suíça, as crianças recebem uma arma e aprendem a atirar com 9 anos de idade, e
essa mesma Suíça é um dos países mais pacíficos do planeta. Sobre Brasil e
Dufour, se interessar, vá a um post anterior: Sem a música, a vida seria um erro.
Assim, há cidadãos que entendem
muito bem o que se passa no país e no mundo, ou seja, sabem como poucos quais
são as regras do jogo que criam a opressão e a injustiça tanto de direita
quanto de esquerda. E essas pessoas se sentem, ainda que inconscientemente,
agredidas pela hipocrisia voluntária ou involuntária das mensagens de flores,
passarinhos, amor e bondade -- bem ao estilo Rubem Alves.
Sim, é inconsciente, mas
sentem-se agredidas... porque são mensagens compartilhadas, com bom coração,
tanto pelos ingênuos quanto por aqueles que são responsáveis por tudo o que
impede que o quadro de violência e opressão seja superado. Que as pessoas
aconselhem umas às outras a ser boas e pacíficas, com pena dos pobres e dos
desvalidos, é justamente o que interessa a todo governo que impede o acesso da
população à capacidade de pensar e decidir, seja negando-lhes escolas de
excelência, seja por controle midiático.
É delicioso ver vídeos, imagens,
ler textos, respirar fundo, olhar para o céu e sentir-se uma alma bondosa...
"ah, se dependesse de mim"... "por que há tanta maldade no
mundo?"
Nesse bolo de sensibilidade
encontra-se mesclado todo tipo de gente: os bons, os ingênuos, os egoístas, os
corruptos. Encontram-se aí os que saem às ruas para reivindicar tudo em nome de
seus grupos, mas que jamais sairiam para pedir mais verbas e qualidade para
educação. Ou seja, para pedir A ÚNICA MEDIDA que -- sabemos todos --
redirecionaria o país e ironicamente estancaria a necessidade de se mandar
mensagens de caridade e solidariedade.
Todo
mundo sabe, mas não faz. Ninguém bate panelas pelo ensino. Ninguém ocupa a
esplanada dos ministérios exigindo educação de excelência para todos. Os que
trocam mensagens solidárias são em grande parte os mesmos que condenam as
invasões nas escolas. Os mesmos que, consciente ou inconscientemente, mantêm a
população (e a si mesmos) naquilo que Kant chamou de menoridade.
Em 1983, Darcy Ribeiro criou um
projeto revolucionário de escola integral no Rio de Janeiro, os CIEPs.
Construiu pelas mãos de Oscar Niemeyer 512 unidades com capacidade para mil
alunos cada uma, ou seja, tirou mais de meio milhão de crianças de seus lares
desestruturados e as pôs em escolas que mais pareciam universidades de primeiro
mundo. Com todas as refeições e atendimento médico e odontológico. Aulas das 8h
às 17h todos os dias e programas especiais nas férias. Professores à tarde para
ensinar a fazer as tarefas da manhã. Isso funcionou de 1983 a 1987, mas a Rede
Globo de Televisão, a mesma que conduz o Criança Esperança, fez campanha contra
o projeto, proibindo divulgação dos CIEPs e mostrando buracos no asfalto e lixo
esquecido em bairros, para dar à população a ideia de que o Rio de Janeiro
estava desgovernado. Assim, fez Darcy Ribeiro perder a sucessão estadual para
Moreira Franco, o candidato apoiado pela grande mídia. Sim, foi isso mesmo que
você leu. Moreira Franco. O mesmo que hoje "luta" pela escola de
tempo integral. Ao eleger-se governador, o Angorá, como é chamado no esquema de
corrupção da operação Lava Jato, imediatamente desfez o projeto educacional de
Darcy, e devolveu todas as escolas ao antigo meio período, desativando tudo o
que se referia ao projeto original.
Moreira Franco e sua família com
certeza compartilham mensagens de amor às crianças e aos desvalidos.
Você, leitor jovem, nunca ouviu falar de Dom e Ravel. Era a
dupla musical popular mais famosa nos chamados anos de chumbo da história
brasileira. Apoiada pelo regime militar, a dupla fazia músicas positivas, de
amor e de esperança, que ajudaram a hipnotizar e imobilizar a população
inteira. Alguns dos sucessos: Só o amor
constrói, Eu te amo meu Brasil, Você também é responsável.
Escreva, no youtube: dom ravel so o amor
constroi.
Depois de ouvir, pode ser que
aprenda a perdoar as pessoas rabugentas que não curtem tanto assim as mensagens
de amor e bondade.
Quando os
brasileiros estiverem votando diretamente as leis, construindo seu próprio
destino, talvez essas mensagens venham a fazer algum sentido.
Álvaro Maia é professor e anarquista.
Seus textos são publicados no blog http://democracia-direta.blogspot.com.br/
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