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sábado, 9 de março de 2019

O futuro do campo democrático e progressista


O cenário mundial é de descrença na política e de abertura de brechas para o avanço do populismo de direita, que cresce na mesma proporção em que se enfraquece a ideia de democracia constitucional com livre confronto de ideias.

O populismo de direita não admite trocar ideias, avançar a partir das controvérsias e, assim, construir as maiorias democráticas, que respeitam e garantem a sobrevivência das minorias. O populismo de direita avança no sentido da aniquilação dos adversários democratas e na revisão da história a fim de implantar a sua hegemonia.

Sua relação com o grande capital financeiro é cada vez mais próxima e estratégica.

O objetivo é aprofundar o neoliberalismo a partir da exclusão social e ideológica. As mudanças nas relações de trabalho não vislumbram a reinclusão do trabalhador, mas o seu completo afastamento da nova sociedade do capital. A repressão popular, de caráter individual e coletivo, contra sindicatos e movimentos sociais, por exemplo, é o instrumento a ser frequentemente utilizado.

O alvo do momento são as democracias constitucionais e as estruturas dos Estados de Bem-Estar Social e de garantias de direitos humanos construídas seja pela social-democracia europeia, seja pelo nacional-desenvolvimentismo latino-americano ou qualquer outro veículo político que aponte um Estado democrático que una capitalismo com planejamento público, desenvolvimento autônomo e inclusão social.

Xenofobia, machismo, racismo, ataque ao modelo multilateral construído em 1948, macartismo temporão, ataque aos LGBT's, ataque às políticas sociais ou de seguridade social, ataque aos direitos trabalhistas e de aposentadoria, surgimento de lideranças ultra-conservadoras de direita com discursos reacionários, e tudo isso com apoio de grande parte da população trabalhadora e mais pobre, é o sinal claro dessa realidade descrita.


As narrativas tradicionais da política, pouco a pouco, foram sendo rompidas pelo fisiologismo político e pelo neoliberalismo nos últimos 30 anos. E a descrença na política como ferramenta de construção foi se consolidando no imaginário popular, abrindo brechas para o cenário de desastre observado no mundo e no Brasil.

E o avanço do populismo de direita só pode ser contido a partir do resgate das narrativas da política como ferramentas de construção social com participação popular. E essa é uma tarefa diária dos partidos políticos, dos movimentos sociais e dos intelectuais, em uma unidade ampla.

Sendo que unidade ampla significa unir os diferentes dentro do campo democrático. Todos, de partidos políticos a movimentos populares, em torno de uma agenda comum de oposição, proposição e reconstrução de diálogo com as pessoas.


Invisível, homem dorme na praça Coração de Maria,
na Vila Tibério, Ribeirão Preto

No mundo, essa unidade já se desenha, com a ascensão de Bernie Sanders nos EUA, de Jeremy Corbyn na Inglaterra, de Jean-Luc Mélenchon na França, de Antônio Costa em Portugal (atual Primeiro-Ministro pelo Partido Socialista) além dos já conhecidos Syriza na Grécia e Podemos na Espanha.

O diálogo que essas lideranças encaminham é o diálogo anti-neoliberal e de defesa de uma reaproximação moderna com as pautas de uma centro-esquerda democrática, de base popular e defensora de um mundo multipolar (compreendendo o papel jogado por Rússia e China diante da agenda de Trump), com desenvolvimento solidário, sustentável e respeitador das diversidades e das liberdades individuais e coletivas.

Uma narrativa que enfoca a importância da coisa pública frente ao privatismo generalizado, com participação e fiscalização da sociedade civil. Uma narrativa que pensa na adequação das pessoas frente à nova sociedade da tecnologia. Que pensa em novas formas de produção solidárias, sustentáveis e apoiadas na democratização do conhecimento.

Esse diálogo precisa se transformar em propostas e essas propostas precisam ser transformadas em uma agenda com objetivos de curto, médio e longo prazos.

No Brasil, esse debate sobre a unidade ampla está truncado. 

O esgarçamento da democracia provocado pelo impeachment sem crime de responsabilidade em 2016 e pela perseguição seletiva ao PT nos últimos anos, culminando com a eleição de Bolsonaro em 2018, trouxe confusão e mágoas tanto na esquerda quanto no campo democrático.

Hoje o campo democrático brasileiro tem apenas rascunhos de uma pauta de propostas e de uma agenda de ação. 

Na esquerda, o PT tem no Lula Livre a base de sua ação de momento e o PDT tem no discurso duramente crítico de Ciro a sua resposta imediata. Isto para focar nos dois partidos que apresentaram candidaturas competitivas na última eleição: Haddad e Ciro.

Parte da esquerda critica um suposto hegemonismo do PT e outra parte cobra do partido uma espécie de 'mea culpa' pelos erros que julgam cometidos. Já parte do PT se ressente da parte da esquerda que não encampou o Lula Livre como forma de resistência e de denúncia da atual situação política.

Também o conjunto dos movimentos sociais e sindicais encontram-se nessa condição de desorientação e divisão política.

Partidos, movimentos e intelectuais de centro, além de grande parte da sociedade civil, ainda não se desprenderam da toxicidade do período do impeachment, quando boa parte embarcou na canoa da Lava Jato e da grande mídia, o que, no final, nos levou à prisão de Lula, à divisão eleitoral e à eleição da extrema direita. 

E, se não bastassem as dificuldades no campo da esquerda, esses setores de centro do campo democrático, incluindo a maioria das denominações evangélicas e uma parte do movimento católico, são vistos com extrema desconfiança e rejeição pelo conjunto da esquerda que de alguma forma compuseram os governos de Lula e Dilma e se sentiram golpeados a partir de 2016.

Mas não haverá outra saída diante do atual cenário e da característica das forças que assumiram o poder em 2018.

Neste blog, defendemos que o atual governo é composto por quatro frentes: olavetes/obscurantistas (já em crise), militares, lavajatenses e ultraliberais. Uma vez que o grupo olavete caia, restam os três outros perfeitamente capazes de se aglutinar e dar um sentido ao governo: autoritário, persecutório e neoliberal.

E não podemos nos enganar: eles têm base popular e força de comunicação.

Mas haverá o momento em que todas as frentes do campo democrático terão que se aproximar e dialogar. Do diálogo deve sair uma pauta mínima e, da pauta mínima, uma agenda de ação, também, de curto, médio e longo prazos. E só uma unidade ampla pode ter a capilaridade necessária para alcançar as pessoas e fazer a diferença.

As eleições de 2020, que ainda acorrerão dentro do atual cenário, poderão servir de base inicial dessa aproximação das frentes do campo democrático, visando um programa e uma agenda que ao mesmo tempo em que se oponha ao atual governo busque proposições que restabeleçam a conexão com a população e as bases de um país democrático, em desenvolvimento e inclusivo.

As bases contidas na Constituição de 1988, as quais as forças do atual governo tentam subjugar. 


Blog O Calçadão


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