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domingo, 19 de maio de 2019

Os camisas amarelas: da anti-corrupção ao bolsonarismo neofascista

A saga neofascista dos camisas amarelas
Já eram favas contadas
O carnaval desse ano já havia sido uma prévia daquilo que as últimas pesquisas de popularidade já indicavam e o último dia 15 de maio comprovou: a figura de Bolsonaro derrete dia a dia diante de sua personalidade grotesca e de seu governo ideológico, escatológico, autoritário e incapaz.

Quantos dos 57 milhões de votos que Bolsonaro recebeu no segundo turno de 2018 já se somam aos 43 milhões que votaram em Haddad ou aos 50 milhões de decidiram não votar ano passado?

Certamente muitos milhões que, inclusive, já estão propensos a irem às ruas em defesa da educação (30 de maio) e contra a reforma da previdência (14 de junho).

Nessa perspectiva, é irresistível refletir sobre a saga dos 'camisas amarelas', marca que se tornou o indicativo das manifestações que ganharam força defendendo o impeachment de Dilma em 2015 e 2016.

Eles estarão nas ruas no próximo dia 26, convocados por movimentos bolsonaristas que buscam defender Bolsonaro diante da crise de seu governo e do cerco das investigações contra o filho senador Flávio.

Vão às ruas "contra o sistema", pelo fechamento do Congresso, pelo fechamento do STF e pela implantação de uma espécie de 'ditadura bolsonarista' ("cristã", "anti-globalista", "anti-comunista" e neoliberal).

Quantos ainda serão é difícil responder. Muitos democratas já abandonaram essa camisa faz tempo.

Mas, como os 'camisas amarelas' chegaram a esse fim, a ponto de defender uma agenda claramente neofascista, é possível especular.


Das jornadas de junho de 2013 aos xingamentos na Copa 2014

2013 foi o ano dos maiores movimentos de rua da história do Brasil. Um movimento que questionava a conjuntura política e econômica do país e tinha na pauta muitas coisas que cobravam, grosso modo, a consolidação dos direitos sociais contidos no artigo 6o da Constituição.

Saúde padrão Fifa, educação padrão Fifa, lembram?


Mas também tinha a bandeira "anti-corrupção" (e anti-partidos, também) que foi rapidamente encampada pela grande mídia e seria, em 2014, o mote do fortalecimento do padrão seletivo lavajatense de combate à corrupção: surgindo o anti-petismo como sinônimo, seletivo, de anti-corrupção.

As camisas amarelas foram vestidas durante a Copa, quando brancos de classe média, ajudados por apresentadores milionários da mídia, xingaram uma Presidente da República em pleno estádio de futebol.

As jornadas de junho mudaram de cor, de padrão social e de pauta.


A campanha de Aécio e o impeachment sem crime de responsabilidade

Para aqueles que gostam de recordar, em 19 de outubro de 2014, há uma semana do segundo turno, Aécio fechou a campanha em uma passeata em Copacabana. As imagens mostram que as cores da bandeira do Brasil e as camisas da seleção predominavam.

Copacabana 19/08/2014
O próprio Aécio, em 2015, enquanto ainda desfrutava de sua imagem de moralista da política e baluarte do anti-petismo, gravou um vídeo chamando para as manifestações pelo impeachment vestindo uma camisa amarela da seleção.

Foi com Aécio que o movimento pelo impeachment começou ainda antes da diplomação de Dilma, quando solicitou recontagem de votos e a própria diplomação no lugar da Presidenta reeleita. E, naquela época, Aécio era tido por liderança até por figuras como Olavo de Carvalho, hoje o guru extremista de Bolsonaro.

Outras figuras em alta conta nas grandes manifestações pelo impeachment de 2015, onde o mar de camisas amarelas dominava o cenário, eram Eduardo Cunha, Agripino Maia, Ronaldo Caiado, Sérgio Moro, Jair Bolsonaro e uma profusão de políticos e pretendentes a políticos buscando a fama através das manifestações transmitidas ao vivo na mídia.

Nascia ali aquilo que iria resultar nos movimentos de direita neoliberais, como o MBL, cujas lideranças estão, quase todas, com mandatos de deputados e deputadas, muitos pelo PSL, o partido bolsonarista.

Todos aninhados no guarda-chuva do anti-petismo, incluindo a mídia e o empresariado nacional interessado no programa econômico neoliberal rentista.

PS: aqui é importante dizer que uma parte dos camisas amarelas deixaram o movimento ainda na transição de 2015 para 2016, incomodados com grupos defensores da ditadura militar que, com faixas trazendo Dilma e Lula enforcados ou degolados, começaram a crescer dentro das manifestações.


O governo Temer

O início do governo Temer teve o apoio de muitos dos camisas amarelas. O programa neoliberal 'Ponte para o Futuro' teve o apoio entusiasmado do MBL. A reforma trabalhista, que retirou os direitos e jogou os trabalhadores na informalidade, idem.

O problema é que entre 2016 e 2017 a realidade revelou Aécio Neves, Eduardo Cunha e o próprio Temer como moralistas sem moral. Junto com essa derrocada, a partir do fracasso econômico, foram os partidos tradicionais, como PMDB e PSDB.

Sobraram Sérgio Moro (contando, até hoje, com o apoio da mídia tradicional) e Jair Bolsonaro como personagens pairando acima do processo crescente de deslegitimação da política e de radicalização de grupos de extrema direita herdeiros das camisas amarelas.


Bolsonaro e o risco à democracia

Os 57 milhões de eleitores de Bolsonaro não podem ser chamados, todos, de camisas amarelas. Não, grande parte deles votou sob o sentimento de ódio e desprezo pela política tradicional, construídos de 2013 para cá, mas, assim como os outros 50 milhões que não votaram e os 43 milhões que votaram em Haddad, são democratas e sonham com um país mais justo, como está escrito no artigo 6o da Constituição, e buscam divergir dentro do jogo democrático como sempre ocorreu desde 1988.

Mas o bolsonarismo é anti-democrático, incluindo aí Sérgio Moro e os lavajatenses. Não suportam a democracia, não suportam o contraditório, desprezam a Constituição no seu conjunto democrático e republicano.

Querem o fechamento do Congresso e do STF diante da clara incompetência, do fracasso governamental e acusações de corrupção e conduta inadequada da família do Presidente e de membros do governo.

No dia 26 próximo pretendem ir às ruas não para debater a educação ou a reforma da previdência, mas para destilar o ódio contra o "sistema", ou seja, contra a democracia e a República inscritas na Constituição.

Querem fazer passar a sua vontade na marra sobre a sociedade que cada vez mais demonstra que não concorda com suas pautas armamentistas, ideológicas e autoritárias.

Ameaçam o país com menos de seis meses de governo, afirmando, vergonhosamente, que o Brasil é "ingovernável".

Está na hora de colocar a democracia diante do que restou dos camisas amarelas bolsonaristas e lavajatenses e dizer bem claro que a sociedade brasileira quer encontrar seu caminho dentro da democracia, da convivência cidadã e da solução cívica das controvérsias, onde oposição e situação convivem democraticamente respeitando a Constituição e as instituições da República.

E esse respeito à Constituição é dever, também, das Forças Armadas, que nem por um momento podem permitir qualquer tipo de aventura anti-democrática.

É o momento de dizer um sonoro não em repúdio ao discurso de vencedor que Bolsonaro fez na Avenida Paulista, na noite de 28 de outubro de 2018, quando ameaçou, pela primeira vez na história da democracia pós-1988, os adversários políticos de prisão ou banimento, fazendo alusão, ainda, à tal 'ponta da praia', referência ao local de morte da repressão da ditadura passada.

É hora de dizer um não ao neoliberalismo de Paulo Guedes que despreza o caráter de bem-estar social constitucional e caminha em aliança ao autoritarismo de Bolsonaro e Moro.

Que as cores do Brasil voltem ao peito dos democratas brasileiros e que nossa tão necessária e desejada democracia permaneça viva e valorizada pelo seu povo através dos preceitos contidos na Constituição.

Blog O Calçadão




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