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sábado, 7 de julho de 2018

Futebol, racismo e política! Por Leonardo Sacramento


Trabalho como professor no bairro onde saiu Fernandinho. Morei neste bairro. 
Este bairro é esquecido pelo poder público. Não tem praça, não tem espaços de lazer, não tem nada. Tem um posto de saúde e escola.  
Os jovens ficam perambulando nas ruas em busca de algo para fazer. As perspectivas e expectativas sobre o futuro costumam ser muito baixas.
Quando a família de Fernandinho se instalou lá, não existia nem entrada para o bairro. Fizeram o bairro e esqueceram de interligá-lo com o resto da cidade. Se não me engano, há familiares do jogador no bairro até hoje.
Fernandinho quebrou uma sina no bairro. Para isso, escolheu a profissão mais democrática que existe no Brasil. 
Democrático neste texto não significa 'ser para todos'. 

Não é possível que todos se tornem jogadores de futebol. Digo isso porque, de todas as profissões existentes no Brasil, a de jogador de futebol é a que realmente tem as pessoas mais capacitadas. Por isso que um time ou uma seleção expressa a diversidade do país que nunca será vista nas arquibancadas, especialmente depois da elitização dos ingressos e da instituição do Padrão FIFA.
Você nunca verá a mesma diversidade na carreira de juiz, médico, advogado, engenheiro, funcionário público etc. 
Nunca verá porque essas profissões dependem das condições econômicas familiares, de tempo investido (o que precisa ter capital econômico, pois afasta o jovem do mundo do trabalho) e capital social (filho de médico costuma ser médico, filho de advogado costuma ser advogado, basta olhar os sobrenomes dos consultórios e escritórios, doados como se fossem herança). 
É o que chamo de meritocracia feudal. São preparados ao longo da vida para ocupar um feudo transmitido via herança.
Diferente das profissões da meritocracia feudal, no futebol estão quase todos os mais capazes para aquela atividade. Em um país que muita gente joga futebol e muitos tentaram ou apenas sonharam em ser jogador, é muito difícil se tornar jogador; portanto, ser jogador é muita coisa. 
A crítica que se deve fazer aos empresários do futebol, que agenciam jovens jogadores, deve se pautar na quebra de parâmetros históricos que até então garantiam a única coisa realmente meritocrática no país.
Fernandinho superou tudo isso. Ele já venceu! E aí precisamos conversar sobre o que isso significa.
Primeiro, significa que ele conseguiu e você que o critica (o que é razoável) ou o chama de macaco, não. Significa que ele venceu e você é um perdedor, levando em consideração os critérios da meritocracia laisse-faire. Você é um perdedor. Não se tornou jogador de futebol, e, no máximo, joga às quartas-feiras com os amigos em um jogo patético.
Segundo, Fernandinho e sua trajetória têm um papel absurdo no bairro onde morei. Há alguns outros jogadores também. O bairro é pródigo nisso. Não questione o papel social que esses jogadores têm na cabeça desses jovens que nunca serão juízes, uma profissão baseada na meritocracia feudal.
Terceiro, confesso que não torço muito para a seleção porque não me identifico com os jogadores. A maioria não tem história no Brasil. Coutinho? Nunca vi jogar aqui. Comparando com a seleção de 2002. Eu vi Rivaldo e Ronaldo jogarem e disputarem o Brasileirão quando este ainda tinha um nível internacional invejável. 
Lembra dos empresários? Mexeram na identidade entre jogadores e seleção. Mas ainda não alteraram substancialmente na ordem dos mais capazes. 
Você não conseguiu!
Quarto, os ataques racistas que Fernandinho sofreu vieram de fracassados. Não venceram na profissão mais meritocrática do país. Sim, meu caro. Comporta um Kaká ou um Sócrates como comporta um Fernandinho ou um Fio Maravilha. 
Fracassados! 
Quando vejo fracassados falando algo de um jogador que venceu, não vejo somente ranço, mas um mar de inveja por algo que não conseguiu.
Ah, se sonhou e não tentou, é fracassado também. Que jovem brasileiro não sonhou, não imaginou? Todos somos fracassados. 
Caia na real!
Quinto, os ataques racistas demonstram que o Brasil é uma nação fracassada e falida. E não é complexo de vira-lata. É uma nação que só comporta o negro bom, que nunca erra. Se erra, é macaco. Se não erra, é bom. Acho ótimo que uma nação dessa não tenha vitórias. Merece o fracasso mesmo. Não merece uma seleção que, por meio das vitórias dos mais capazes, esconda o rancor e o ódio dos menos capazes.
Espero que o Brasil entre na mesma fila que está a Argentina.

Leonardo Sacramento é professor em Ribeirão Preto

Um comentário:

Unknown disse...

Não virão muitos comentários. Permanecerá o silêncio de quando o que se ouviu não agrada, mas não se encontra resposta à altura.
Viva as redes sociais!
O ódio, a inveja, o rancor e, principalmente a perpetuação do processo de estratificação do ser humano emergiram de maneira límpida e transparente num espaço em que os olhos do interlocutor não estão diante do agressor.
A única exceção a tudo isso é o crítico contumaz. Ao invés de pregar o fim dessa miséria moral, ele a acentua, destaca, alimenta e aumenta. Ele é exceção porque ao achincalhar aqueles dos quais não é diferente, apresenta-se como se não o fosse.
Mas há outro caminho. E é um único. É o que Jesus ensinou. Mas nele não pode haver rancor, vaidade ou sentimento de vingança.
SÓ AMOR!
Que Deus nos abençoe.
Que Deus abençoe o Fernandinho.
Que as pessoas que o ofendem recebam o amor que demonstram nunca ter recebido. E é certo que essa missão cabe a quem tem discernimento.
Quem se habilita?

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