Relatório cita falhas estruturais das escolas brasileiras, como a ausência de acolhimento, o predomínio de práticas punitivas, a precariedade das condições de trabalho e a insuficiente formação de profissionais para mediação de conflitos como causas institucionais para a violência
Um dos mais abrangentes diagnósticos já realizados sobre a violência extrema contra escolas no Brasil acaba de ser publicado pelo Grupo de Trabalho de Especialistas em Violência nas Escolas, instituído pelo Ministério da Educação em 2023. O relatório analisa a escalada dos ataques armados a instituições de ensino no país, identifica suas causas e propõe um conjunto de medidas urgentes e estruturantes para o enfrentamento do problema.
Ao todo,
o Brasil registrou 36 ataques a escolas entre 2002 e 2023, com um
crescimento expressivo a partir de 2017 — tendência que só foi interrompida
durante o ápice da pandemia. Os ataques resultaram em 164 vítimas, sendo
49 fatais e 115 feridos, segundo levantamento do GT. A maioria dos
atentados envolveu alunos ou ex-alunos motivados por ressentimentos e
cooptados por comunidades extremistas na internet, com discursos de
ódio, misoginia e racismo.
O estudo
rejeita explicações simplistas baseadas apenas em distúrbios mentais. Os
ataques são classificados como multicausais e imersos em um contexto
maior de violência estrutural, desigualdade social, cultura armamentista e
ausência de políticas públicas voltadas à convivência e à escuta nas escolas.
“Os
ataques são a expressão mais brutal de um ambiente escolar e social adoecido. É
preciso compreender o fenômeno para enfrentá-lo de forma séria e eficaz”,
afirma o relator do documento, Daniel Cara, professor da Faculdade de Educação
da USP.
Causas: entre o ódio digital e a negligência
institucional
O
relatório aponta que os agressores — todos do sexo masculino — foram
influenciados por comunidades virtuais de ódio, onde o humor violento, o
culto às armas e a misoginia são utilizados como ferramentas de recrutamento. A
maioria dos ataques segue o padrão dos chamados copycat crimes, inspirados
em atentados anteriores, especialmente o de Columbine (EUA, 1999).
Também
são mencionadas as falhas estruturais das escolas brasileiras, como a
ausência de acolhimento, o predomínio de práticas punitivas, a precariedade das
condições de trabalho e a insuficiente formação de profissionais para mediação
de conflitos.
Doze ações emergenciais
O
relatório apresenta 12 medidas urgentes que o Estado brasileiro deve
adotar, entre elas:
- Combate às comunidades
extremistas online e responsabilização das plataformas digitais;
- Controle rigoroso sobre o
acesso a armas de fogo, especialmente por menores;
- Implementação de políticas
de saúde mental nas escolas e ampliação da rede psicossocial;
- Promoção da cultura de paz e
da gestão democrática escolar;
- Atualização das leis sobre
crimes de ódio e bullying;
- Campanhas de comunicação e
protocolos de cobertura jornalística, para evitar o chamado “efeito contágio”.
Um novo olhar sobre a violência nas escolas
Mais do
que repressão, o relatório defende políticas preventivas centradas na educação
em direitos humanos, convivência democrática e formação cidadã. A
recomendação é que a violência seja tratada como fenômeno multidimensional,
que exige resposta intersetorial e federativa, integrando segurança,
educação, saúde, assistência social e comunicação.
A
pesquisa é resultado de mais de 2 mil contribuições recebidas por
especialistas de diversas áreas, e se consolida como referência para o
desenvolvimento de políticas públicas voltadas à proteção e à reconstrução
do espaço escolar como ambiente de vida, aprendizado e cidadania.
Leia o
relatório completo no site
do Ministério da Educação ou acesse aqui.
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