Debate na Câmara destacou a necessidade urgente de reformulação no sistema educacional brasileiro para romper com valores eurocêntricos e promover uma educação antirracista
É preciso formar profissionais da educação antirracistas |
Após duas décadas da implementação da lei que obriga o ensino de história e cultura africanas e indígenas nas escolas, especialistas chamaram atenção, durante audiência pública na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados nesta quinta-feira (23), para a insistência de uma abordagem educacional fortemente direcionada a valores europeus no Brasil.
Necessidade de formar profissionais da educação antirracistas
O debate destacou a necessidade urgente de uma
grande mudança nos sistemas de ensino, incluindo a formação dos profissionais
da educação antirracistas como requisito fundamental para a construção de uma
educação antirracista.
O professor Amilcar
Araújo Pereira, da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de
Janeiro, destacou que a perspectiva europeia, adotada na construção do sistema
educacional durante a primeira República, tinha como objetivo
"embranquecer a população". Essa concepção, segundo Pereira, continua
presente nas instituições de ensino brasileiras, com um foco desproporcional na
história europeia em detrimento da valorização da diversidade cultural local.
“Na Europa, em geral, na Inglaterra, na França e na Espanha, pelo menos, que são os casos que eu estou estudando mais de perto, se estuda menos história europeia do que no Brasil. Na UFRJ, nas universidades brasileiras em geral, se dedica muito mais espaço curricular a estudar a história da Europa que os próprios europeus fazem, numa população majoritariamente negra”, afirma.
Negação da história dos povos indígenas
André Baniwa,
Coordenador-geral de Promoção da Cidadania e Combate ao Racismo do Ministério
dos Povos Indígenas, ressaltou a negação oficial da existência dos povos
indígenas e a necessidade de contar a história de forma verdadeira como uma
forma de reparação. Ele destacou a importância de materiais didáticos corajosos
que abordem a violência histórica e a reivindicação dos indígenas por um
sistema nacional de educação.
A deputada Célia
Xakriabá compartilhou sua experiência em uma escola indígena, onde não foi
ensinado o tradicional relato do descobrimento do Brasil por Pedro Álvares
Cabral. A deputada está preparando um projeto de lei para proibir essa versão
da história nas escolas.
Transformação radical nas relações, comportamentos, ética escolar, nos materiais didáticos e no projeto político-pedagógico
A professora Iracema
Santos do Nascimento, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo,
destacou a falta de formação sobre cultura africana e indígena na educação
básica e destacou que a formação dos profissionais é apenas o primeiro passo.
Segundo ela, uma mudança efetiva para uma escola antirracista exige uma
transformação radical nas relações, comportamentos, ética escolar, materiais
didáticos e no projeto político-pedagógico.
A
deputada Professora Luciene Cavalcante, que solicitou o debate, enfatizou que
uma sociedade democrática e menos violenta só será possível com uma educação
antirracista. Ela ressaltou o papel crucial da escola como espaço privilegiado
para promover essa mudança de mentalidade, questionando a normalização de
injustiças e exclusões no país.
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