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sábado, 4 de abril de 2020

Por que é importante o governo municipal de Ribeirão Preto desenvolver um plano de ação nas periferias da cidade? Por Thiago Scatena

O Blog O Calçadão reproduz o texto do amigo, sociólogo e pesquisador de pós-graduação do Instituto de Arquitetura e Urbanismo (IAU-USP)  Thiago Scatena.


Este texto é sobre a realidade municipal de Ribeirão Preto - SP e sobre o poder público do executivo municipal. E para localizar conceitos, irei conceitualizar Periferias como sendo territórios da cidade compostos, em sua maioria, por famílias de baixa renda e por estruturas de moradia inadequadas. 
Essas moradias podem ou não ser irregulares (as favelas) ou podem, ou não estar em conjuntos habitacionais (Habitação de Interesse Social – HIS), mas são configuradas como Periferias por dois motivos: a população é composta por famílias de baixa renda; e as moradias e apresentam patologias construtivas.
Desde que nos encontramos nessa vertigem intitulada pandemia do Coronavírus Covid-19, recebemos informações sobre o impacto do vírus sobre as pessoas que moram nas inúmeras periferias do Brasil como sendo as mais urgentes. A constatação é de que quem mora em periferia são pessoas que:


1) Possuem em um baixo conjunto de rendimentos na sua família (ver mapa de renda noi espaço urbano de RP), e as relações de trabalho são configuradas como informais e mal remuneradas, ou possuem relação de trabalho via CLT, ou são pequenos empresários (MEI);


2) A densidade urbana é maior nas periferias e, especialmente, nos assentamentos irregulares na cidade de Ribeirão Preto (ver mapa de densidade), ou seja, há mais pessoas por metro quadrado nesses locais do que em outros territórios da cidade;


3) A qualidade das habitações é precária, pois a grande maioria das habitações foram feitas por autoconstrução (ver vídeo da maior autoridade no assunto, Ermínia Maricato https://www.youtube.com/watch?v=iNcFZ6nQUzw) e essa construção não foi assessorada por técnicos como os profissionais da arquitetura ou da engenheira. Logo, as construções possuem problemas de telhado, janelas, banheiros e dormitórios, o que impacta na qualidade de ventilação e iluminação, causa problemas com umidade e provoca desconforto térmico nas moradias.

Por conta desses três pontos que definem uma periferia na cidade de Ribeirão Preto, o vírus do Covid-19 irá ter mais impactos na vida das pessoas por que:


1) Como as famílias possuem baixo rendimento e as relações de trabalho se configuram no formato "trabalhar para receber", sem a assistência de seguros sociais, essas famílias são impossibilitadas de permanecerem em suas casas e de estarem em uma quarentena correta. São essas pessoas que precisarão sair de suas casas para trabalhar e circular por todo o território da cidade, são elas que trabalham no setor da construção civil, são profissionais da limpeza e serviços domésticos (conheço vários moradores de comunidades que trabalham na limpeza da Câmara de Vereadores e da Prefeitura), são os coletores de resíduos sólidos, são os cuidadores de idosos, motoristas de ônibus, são os feirantes e ambulantes, atendentes de caixa de supermercados, entre outros serviços urbanos que geralmente não param. E são esses trabalhadores que o patrão não costuma dispensar. Essas pessoas acabam por circular no território da cidade e voltam para suas casas, ideal para a transmissão em massa do vírus;

2) Como esses territórios apresentam elevados padrões de densidade urbana, o contato humano entre essas pessoas é, inevitavelmente, maior do que em outros territórios da cidade, logo um isolamento vertical é impossível (http://agencia.fapesp.br/deficit-habitacional-e-obstacu…/…/…). O vírus terá uma transmissibilidade maior nesses territórios adensados;



3) Com habitações que possuem patologias construtivas que impactam na qualidade de iluminação e ventilação do ambiente doméstico, provocam mais umidade no interior da moradia, não possuem um conforto térmico adequado (no calor de Ribeirão Preto, morar sobe um teto de eternit é um convite a sair de casa), a probabilidade do vírus ser mais transmitido é maior. Em certas moradias de periferia em Ribeirão Preto, doenças de pele e tuberculose são comuns (https://portal.fiocruz.br/…/favelas-e-periferias-do-rio-de-…).

Portanto, voltemos a importância de um Plano Emergencial da prefeitura nesses territórios. Como esses territórios são especiais em relação a cidade de Ribeirão Preto, e essas famílias se encontram em situações de maior vulnerabilidade de renda e de saúde, seria indicado que o poder executivo municipal desenvolvesse um Plano que focasse nesses territórios, especialmente as comunidades-favelas (existem 87 assentamentos irregulares de baixa renda em Ribeirão Preto com um população estimada de 40.000 pessoas, ver o PLHIS de Ribeirão Preto).


Eu vou dar palpites para a prefeitura, e apontar o que deveria um Plano Emergencial deveria providenciar nesses territórios urbanos:


1) A comunicação entre lideranças de bairro, líderes sociais e religiosos, representantes de ONGs, lideranças de movimentos de moradia, entre outros deve ser fortalecida em relação às informações oficiais da prefeitura sobre o Covid-19 e informações do SUS e da proposta de Renda Emergencial recém-aprovada. As informações precisam ser objetivas, claras e encontradas.


2) Assegurar que a Renda Emergencial aprovada pelo governo federal e que será liberada a partir da semana que vem (https://agenciabrasil.ebc.com.br/…/caixa-lancara-na-terca-a…) seja de fato localizada para as pessoas que moram nesses territórios. Caso as pessoas não possuam cadastro único – CadUnico ou não saibam como proceder, o poder executivo poderá auxiliar nesse processo, inclusive providenciando mutirões de Assistentes Sociais nesses territórios para fazer os cadastros. Muitas pessoas das periferias não estão com seus planos de internet móvel em dia e estão desconectados.


3) O Departamento de Água e Esgoto – DAERP deve fornecer água potável nas comunidades que não possuem acesso à água. Ribeirão Preto possui 100% de abastecimento de água nos domicílios regularizados, os IRREGULARES não possuem abastecimento de água muito menos acesso a rede de esgoto. Em um decreto municipal a prefeitura determinou que o DAERP não corte o abastecimento de água por falta de pagamento por um período de 180 dias.

4) A Secretaria de Saúde Municipal e de Assistência Social poderia investir esforços em localidades específicas do município, como comunidades e bairros populares mais adensados. Chegar com informações, identificar possíveis focos de transmissão do Covid-19, assegurar um primeiro contato de assistência de saúde, fazer triagens, etc... Assim como distribuir produtos básicos de higiene e limpeza, como sabonetes, cloro, álcool em gel entre outros.



5) A prefeitura municipal poderia isentar pessoas que compõem famílias de baixa renda do Imposto Sobre Serviço – ISS por um período determinado, para dinamizar a futura e cambalida economia de serviços que virá após o Covid-19.


6) Após a pandemia do Covid-19, o poder público municipal deveria assegurar uma Assessoria Técnica em Habitação de Interesse Social – ATHIS que providenciasse melhorias habitacionais para afastar doenças respiratórias e de pele. Um investimento maciço nessa frente de melhorias habitacionais iria desobrecarregar o sistema de saúde público, e gerar menos custos desse sistema.
Assistência Técnica em Habitação de Interesse Social e qualidade das moradias.


Essas são algumas ideias vagas que pensei nesse momento de preocupação. O mês de abril será o pior mês segundo especialistas, e os próximos dias serão fundamentais para conter a disseminação do vírus. Um Plano Emergencial deveria ter sido desenvolvido a duas semanas atrás, estamos ficando sem tempo.

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