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quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Entrevista com Marcos Sérgio - Republicação


PS: Terminamos o ano republicando a entrevista com o ativista Marcos Sérgio sobre o histórico de lutas no entorno do aeroporto Leite Lopes. Escolhemos esse assunto pois verificamos nesse nosso primeiro ano de atuação que é ali o foco de maior problema social da cidade. Nesse ano de 2016 voltaremos com mais informações, com mais entrevistas e com mais histórias das pessoas que vivem aquela realidade e lutam contra toda a hipocrisia e oportunismo político que rondam esta questão.
Leiam, informação é tudo!



Para a mídia tradicional eles não existem e o assunto da internacionalização do Aeroporto Leite Lopes é ponto pacífico em Ribeirão Preto. Ledo engano! O movimento contrário existe e há 20 anos luta contra esse projeto. Conheça Marcos Sérgio, esse ribeirão pretano de nascimento, e o Movimento Pró Novo Aeroporto (MPNA). Conheça um pouco mais sobre o histórico de lutas que se desenvolve há décadas no entorno do aeroporto, onde vive uma grande parte da população trabalhadora de Ribeirão Preto.

O Calçadão - Esse "projeto" de ampliação do Aeroporto Leite Lopes é antigo, vem desde a década de 90, como também vem de lá o movimento de oposição a ele. Como tudo começou? De onde partiu a ideia original de ampliar a pista do Leite Lopes?

Marcos - O Leite Lopes era apenas uma pista de pouso distante do centro urbano em 1929, quando foi criada. Nos anos 80, quando foi transformado em aeroporto, já existiam bairros em seu entorno desde os anos 40. Portanto, as moradias são anteriores ao aeroporto naquele local.
O Plano Diretor de 1995 (O Calçadão - Plano Diretor que ainda está em vigor pois o novo tem sido sistematicamente adiado por interesses políticos), debatido pelo COMUR, já previa a construção de um aeroporto fora dos limites do anel viário para preservar a população do entorno do Leite Lopes. Ali nascia o Movimento Pró Novo Aeroporto, congregando várias lideranças locais, incluindo eu mesmo.
Entre 1997 e 1999, a situação se inverteu. A administração do ex-Prefeito Jábali encomendou um estudo de uma agência americana para a ampliação do Aeroporto Leite Lopes. Porém, esse estudo era de baixa qualidade e repleto de falhas e foi derrubado no COMUR na época, com a mobilização do MPNA. Mas surgia ali a semente desse projeto que busca ampliar o Leite Lopes em detrimento da população local.
Após alguns anos, a questão voltou com força em 2005, iniciando nova batalha e tendo o Ministério Público como ferramenta fundamental de luta do MPNA. Em 2007 houve uma passeata de 300 pessoas pelas ruas do bairro Jd. Aeroporto, ignorada pela mídia oficial.
E a luta tem sido dura desde então. Mesmo com pareceres contrários do MP sobre a internacionalização, o Poder Público busca tocar o projeto em frente. Há um processo forçado de remoção de famílias do entorno do Leite Lopes desde 2008, disfarçado num pretenso plano de desfavelamento. Essa remoção forçada suscita denúncias de abuso contra os direitos humanos. Em 2012 uma lei municipal transformou bairros mistos do entorno em bairros exclusivamente industriais, apontando no mesmo sentido de tentar expulsar a população do entorno. Essa lei, pela mobilização do MPNA, foi considerada inconstitucional, mas a Prefeitura ameaça fazer uma nova lei no mesmo sentido.
A luta ainda é muito intensa naquela região.

O Calçadão - A mídia tradicional jamais menciona a existência de um movimento de oposição à ampliação do Leite Lopes e a população tende a acreditar que esse é um assunto de consenso. Então conte-nos agora, por que vocês são contrários a este projeto e qual a alternativa que propõem?

Marcos - Acredito que essa discussão não pode ser dar apenas no ser contra ou ser a favor. A que se atentar para os critérios técnicos e sócio-ambientais. e nesse quesito, a ampliação do Aeroporto Leite Lopes tem problemas insuperáveis. A Prefeitura tentou passar um EIA/RIMA (estudos de impactos ambientais) em 2006, numa audiência pública repleta de "cabos eleitorais". Mas a mobilização do MPNA junto ao MP conseguiu desmontar muitos pontos dos estudos, demonstrando seus problemas insanáveis de impacto na vida das famílias do entorno.
Não queremos um "Congonhas" dentro de Ribeirão Preto. Se a diretriz determinada no Plano Diretor de 1995 tivesse sido levada a diante, hoje já teríamos um novo aeroporto internacional operando fora do limite urbano da cidade.
Com relação à mídia tradicional, além de não divulgar nosso movimento de oposição ao projeto, tem uma emissora local que faz propaganda clara em defesa da ampliação do Leite Lopes com o slogan "O Amanhã se Constrói hoje".

O Calçadão - A região do entorno do Leite Lopes é bastante populosa e com sérios problemas urbanos e sociais. Esses problemas seriam resolvidos ou agravados com a obra em questão? Qual a opinião dos moradores?

Marcos- É uma região populosa onde a maioria é proprietária do seu imóvel. Há muitos problemas de falta de equipamentos públicos, favelas e ocupações, mas todos esses problemas são possivelmente sanáveis com políticas públicas adequadas. O que ocorre é que muitos dos problemas criados foram criados pelas incertezas com relação ao futuro da região. Investimentos foram adiados, o que criou um vácuo que permitiu vazios administrativos.
Nossa opinião é que, certamente, os problemas serão agravados com a ampliação do Leite Lopes. A começar pelas desapropriações dos imóveis legais, o que gerará prejuízos aos proprietários e uma explosão da especulação imobiliária. A remoção das famílias já fragilizadas em favelas e ocupações aumentará, gerando caos social e expansão dos já existentes desrespeitos aos direitos humanos. O ruído provocado pelas grandes aeronaves afetará a vida de bairros que permanecerão no entorno.
O fato é que o ganho econômico para a cidade com a ampliação do Leite Lopes ou com a construção de um novo aeroporto é o mesmo. Porém, a construção de um novo aeroporto evita inúmeros problemas urbanos e sociais, o que beneficia, certamente, a cidade como um todo.
Com relação à opinião dos moradores, nós enfrentamos uma batalha de propaganda e desinformação. As forças políticas defensoras do projeto e a mídia tradicional vendem a imagem do "Papai Noel Leite Lopes", prometendo um mundo de fantasias e tentando abater o ânimo das pessoas afirmando que a ampliação é algo já definido e acabado. Contra isso nós tentamos buscar novos instrumentos de mídia e lançamos até um gibi, que as pessoas podem encontrar aqui.

O Calçadão - Recentemente fizemos uma entrevista com o Padre Chico, histórico lutador de Ribeirão Preto e companheiro de luta do Movimento Pró Novo Aeroporto. Quais as outras forças políticas que apoiam o movimento de vocês?

Marcos- As forças politicas que apoiam o Movimento Pró Novo Aeroporto são todas aquelas que querem o progresso e o desenvolvimento sustentável da cidade e da região. Lideranças que  se preocupam com os problemas sociais e ambientais. Incluem-se, também, além dos movimentos sociais, profissionais técnicos e cientistas que se insurgem com a concepção da permanência de aeroportos de médio ou grande porte dentro de áreas urbanas.
Contamos com o apoio de advogados, como a doutora Raquel Montero, para fazermos as petições necessárias e importantes junto ao Ministério Público, o que tem sido fundamental para barrar o projeto e suscitar novos debates. Posso citar os companheiros da ONG Pau Brasil (também amiga do blog O Calçadão) e o Núcleo de Assessoria Jurídica Popular da USP como parceiros. Lançamos em 2013 junto com o Movimento Pró Moradia e Cidadania o manifesto "Aeroporto Internacional SIM - Congonhas no Leite Lopes NÃO"
Mas você citou o Padre Chico. Padre Chico é uma voz que se levanta contra a aberração do projeto e em defesa das famílias mais vitimizadas do entorno, principalmente em defesa das crianças. Sua voz se levanta em todos os momentos, como, por exemplo, na audiência pública ocorrida em junho passado na Câmara Municipal promovida pela União das Entidades Filantrópicas de Ribeirão Preto. Padre Chico é um amigo.
É preciso coragem para enfrentar a máquina de pressão do poder público. Eu mesmo sofro isso na pele desde 1997, inclusive sendo prejudicado como servidor público que sou. Vi muitos companheiros desistirem da luta por causa da pressão exercida, que inclusive aposta na cooptação das lideranças. Hoje nós tentamos reconstruir a combatividade da Associação de moradores do Jd. Aeroporto, da qual eu já fui diretor.

O Calçadão - Do outro lado, das forças políticas que buscam concretizar o projeto, há um claro apoio da mídia tradicional. Quem são essas forças? Há diálogo entre as partes?

Marcos - Quando os franceses estiveram em Ribeirão Preto no período da Copa do Mundo, um repórter afirmou que a elite da cidade era uma burguesia provinciana, excêntrica e tediosa. São essas forças de origem mais retrógrada que dominam a cidade politica e economicamente e que majoritariamente defendem a ampliação do Leite Lopes e a remoção da sua população do entorno. Quem tem o poder econômico dita as normas políticas e compra o apoio da mídia. Esse grupo busca passar uma imagem mentirosa de que a ampliação do Leite Lopes não tem movimento de oposição. Buscar esconder a nossa existência e oprimir as nossas ações.
Para eles o Movimento Pró Novo Aeroporto não existe e, portanto, não aceitam o diálogo.

O Calçadão - Qual a posição da Prefeitura, do governo do Estado e do governo Federal sobre essa questão?

Marcos- Todos servindo aos interesses do capital. É mais fácil para os interesses poderosos ampliar o Leite Lopes e remover a população mais pobre do que construir um novo aeroporto fora do perímetro urbano e investir em políticas públicas nos bairros do entorno do Leite Lopes.


O Calçadão - Como a população de Ribeirão Preto que queira buscar mais informações sobre o movimento de vocês pode entrar em contato e se engajar na causa?

Marcos- Compartilhando nossas publicações no facebook  (https://www.facebook.com/marcosaeroporto.aeroporto) e se cadastrando no nosso blog (/http://novoaeroportoribeiraopreto.blogspot.com.br/  )


obs: o blog apurou que hoje a maioria dos vereadores é favorável à ampliação e a Prefeitura tem junto ao governo estadual uma parceria para tocar as obras de ampliação. 
Recentemente, um grupo de veradores da cidade esteve em Brasília na companhia dos deputados Baleia Rossi e Léo Oliveira para debater a internacionalização do Leite Lopes com a Ministro da Aviação. A matéria você pode acompanhar aqui: Jornal Tribuna.


terça-feira, 29 de dezembro de 2015

Concentrada na zona sul, política de parques urbanos é ditada pelas empreiteiras!


Pare agora e pense. Cite o nome de dois parques urbanos em Ribeirão Preto. Se você pensou no Curupira e no Raia não se sinta culpado, isso é perfeitamente compreensível. As principais áreas verdes e parques urbanos da cidade estão concentrados na zona sul e por um motivo simples: é lá que a empreiteiras estão!

No último dia 28/12, o jornal A Cidade publicou uma reportagem sobre o futuro 'Parque do Retiro Saudoso', no Jd. Roberto Benedetti. Ali, as empreiteiras vão bancar as ciclovias, a pista de caminhada, o plantio de árvores e até quiosques. É um projeto bom, com interesse público, dando sentido social para uma área degradada e abandonada, mas é mais um nas proximidades da zona sul, no setor 'filão' das empreiteiras.

Não há problema algum em fazer parques e áreas verdes com auxílio da iniciativa privada. Essa boa ideia de gestão pública, aliás, surgiu em 2002, onde parte da compensação ambiental devida pelas construtoras pode ser usada para construir parques públicos e áreas verdes urbanas.

O problema surge quando é a iniciativa privada, no caso as empreiteiras, e não o Poder Público que decide onde, como e quando fazer essas intervenções. Sem capacidade de planejamento urbano, a cidade fica refém dos interesses financeiros e os parques e áreas verdes se concentram no microcosmo da zona sul.

Além dos parques citados e outras áreas verdes públicas mas, na prática, tornadas privadas, na região da zona sul, outros 3 parques estão previstos para a região: um ao lado do Ribeirão Shopping, outro no Jardim Irajá e outro no prolongamento da Fiúsa.

Na verdade essas áreas verdes servem como 'jardins de luxo' para valorizar os empreendimentos, assim como ocorreu no Parque Curupira. Aquela grande área localizada entre a Arnaldo Vitaliano e a Costábile Romano deveria ser toda ela transformada num parque, protegendo a biodiversidade que existia no local e a nascente do córrego dos Catetos. Mas não, em torno do parque existem hoje empreendimentos de alto padrão, com direito inclusive a uma entrada 'privé' para o Curupira. Ou seja, o parque serviu para valorizar a área e a questão ambiental foi posta em segundo plano.

Deixar o andamento da cidade à mercê dos interesses do capital cria enormes distorções. Enquanto a zona sul se 'embeleza' e se arboriza, os bairros populares das outras regiões (que incluem mais de 80% da população) apresentam índices de arborização abaixo do recomendado, praças abandonadas e projetos de parques paralisados. A OMS recomenda 12 metros quadrados por habitante de áreas verdes, mas na periferia de Ribeirão temos apenas 2 metros quadrados por habitante.

Por que os empreendimentos só ocorrem na zona sul? Porque a cidade não disciplina isso, não usa as ferramentas legais para forçar o investimento em outras regiões. Por que não se pensar em obrigar as empreiteiras a fazer a compensação ambiental na periferia? A empresa pode até fazer a obra na zona sul, mas fará um parque público na zona norte, por exemplo. Mas ocorre o contrário, as áreas verdes 'públicas' são criadas ao lado da obra e se tornam parte do condomínio, se tornam áreas privadas.

Com essa política, os parques como o Cidade da Criança (zona leste), o Pico do Mirante e da Pedreira (zona oeste) e mesmo parques já existentes como o Tom Jobim (no Alexandre Balbo) ficam esquecidos. Mesmos as enormes áreas verdes da região do Aquífero ficam sem proteção. Isso sem falar das praças públicas. Por que não desenvolver projetos de ocupação das praças existentes e a construção de outras?

Tudo depende do poder de planejamento da Administração Pública, de colocar o Estado a serviço do bem estar social.

A Prefeitura planeja realizar adequações legais que permitam levar a política de parques para o restante da cidade. Mas como acreditar nisso se o Plano Diretor, que pode disciplinar tudo isso, aguarda votação há anos?

Diz o Estatuto das Cidades, de 2001, que devemos construir cidades sustentáveis e participativas. Ribeirão Preto vai na contra-mão dessas diretrizes há 20 anos. Essa realidade só será mudada a partir da participação popular, da organização da sociedade civil e dos movimentos populares em torno de um projeto de cidade que contemple as necessidades reais da população.

2020 está aí, eleições vão ocorrer. É hora dos progressistas colocarem as mãos na massa e buscarem a construção de um projeto popular e democrático de cidade, onde o Poder Público seja de fato o condutor dos rumos políticos e não o poder financeiro.

Blog O Calçadão


segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Seimour Souza relata como foi a Ocupação do Otoniel Mota!

O estudante Seimour Souza relata como foram as primeiras horas e os 14 dias de ocupação da Escola Estadual Otoniel Mota em Ribeirão Preto. Os estudantes do Otoniel tomaram uma decisão política e cidadã ao decidirem ocupar a escola. O Otoniel não estava na 'lista de reorganização', mas os rumos da escola pública e o futuro de milhares de alunos estavam em risco, por isso decidiram entrar na luta solidária.



Foram 14 dias de ocupação!
Depois de 3 tentativas falhas por conta de vazamentos de informações e pessoas infiltradas, na 4ª, enfim, ocupamos o Otoniel Mota. 
Terça-feira, 1 de dezembro de 2015, 5h40 da manhã, todos em frente à escola: alunos e apoiadores.
Era a hora. Com apenas 7 alunos, entramos na escola e anunciamos para as 4 funcionárias que lá estavam que estávamos ocupando a escola, e elas, sem entenderem muito bem, saíram voluntariamente.
Menos de 15 minutos depois, a polícia já estava na porta, porém, os advogados também estavam. 

30 minutos depois, todos os docentes, discentes e a gestão estavam na porta da escola. Também 4 carros de polícia em frente ao portão de entrada. 

Logo em seguida veio também a mídia. 

Estávamos todos muito apreensivos lá dentro, não sabíamos o que se sucederia dali para frente. 
11h20- fizemos a primeira assembleia e decidimos os rumos que iríamos tomar. Como, por exemplo, quem cuidaria da limpeza, da segurança, da comida e da comunicação. 

Aos poucos as coisas iam se estabelecendo durante todo dia.
17h40- Recebemos a notícia que o juiz concedeu a reintegração de posse. Todos ficaram atônitos, sem acreditar na rapidez da justiça quando o assunto é de interesse deles. Um grupo de graduandos em direito nos acalmaram e nos deram algumas dicas do que aconteceria em uma provável reintegração. 
22h30- Primeira assembleia ampliada para as dezenas de pessoas do lado de fora da escola, algumas estavam lá desde as 05:40 da manhã.
Já era tarde, todos ainda muito perdidos, dividimos os quartos, começamos a fazer o jantar (com as doações que havíamos recebido durante todo o dia). Alguns tomaram banho com um balde de água fria, pois não havia chuveiro na escola. 
03h50- Todos acordados ainda, com a adrenalina a mil, ninguém conseguiu dormir, apreensivos de como seria o dia seguinte. 
06h30- Início da entrada dos alunos que estavam jogando o interclasse. Todos tínhamos que estar atentos para ter certeza de que não haveria qualquer tentativa de depredamento do patrimônio da escola, já que a administração da escola estava nas nossas mãos.
A partir daí as coisas começaram a se encaixar, fomos criando uma rotina, trocávamos turno durante a noite. Alguns ficaram responsáveis por fazer a agenda cultural, outros por fazer a comida, outros para a segurança e todos pela limpeza. E essa rotina se manteve sem muitas alterações até quinta-feira, quando havia sido marcada uma reunião ampliada com a Policia Militar, para explicarem como seria feita a reintegração. Nenhum de nós foi nessa reunião.
Estávamos fazendo uma assembleia, quando nos interromperam para nos trazer informações sobre a reunião e nos explicar o que foi passado lá, quando novamente fomos interrompidos com a informação de que o desembargador de São Paulo havia negado a reintegração de posse. 

Nos abraçamos, alguns visivelmente mais emocionados, outros mais felizes, mas todos com a certeza que a luta estava apenas começando.
Na sexta-feira, dia 4, fomos surpreendidos novamente com a notícia que o governador havia suspendido o decreto sobre a reorganização. E novamente nos abraçamos e nos emocionamos. 
Após o decreto sair no diário oficial, no sábado, começamos a pensar sobre desocupação e decidimos que ainda não era a hora, e que agora para além das nossas reivindicações estaduais, também tínhamos as nossas pautas locais, sobre problemas internos da escola. 
Na segunda feira, dia 7, começamos a escrever a carta e fomos na Diretoria Regional de Ensino tentar marcar um dia para que a Dirigente nos recebesse para entregarmos a carta de reivindicações. 

Marcamos para quinta-feira, para a entrega.
Na quarta-feira à tarde, fizemos uma reunião com pais, alunos e professores para terminarmos em conjunto a elaboração da carta de reivindicações.
Na quinta-feira, após 2 horas de reunião com a Dirigente, com a diretora e com a vice-diretora, saímos com a certeza de que se não lutarmos para conquistarmos o nosso direito, ninguém fará isso por nós.
No sábado, após uma assembleia pela manhã, decidimos que era a hora de desocuparmos, e por mais que isso doesse em cada um nós, que já havíamos criado mais do que amigos lá, devíamos ser racionais e coerentes e pensarmos em quais formas de luta travaríamos dali para frente. 
A desocupação foi marcada para segunda-feira, dia 14 de dezembro.

Passamos o domingo limpando a escola, devolvendo algumas coisas que fora emprestado para nós, como colchões, fogão, panelas e talhares. À organização da escola foi madrugada a dentro, até por volta das 04h30 da manhã.
Às 06h30, dois advogados chegaram para fazer a vistoria, junto conosco, de todo o prédio da escola. Às 07h10, um grupo da gestão entrou na escola para fazer junto conosco a vistoria e a assim entregamos a chave da escola para eles. 
La fora, nos abraçamos novamente, choramos bastante e nos despedimos.
Essas duas semanas nos fizeram pensar e sentir novas formas de viver e de ser, dignificando cada momento como único. 
Foram duas semanas que nos ensinaram muitas coisas. A ser mais solidários, a lidar com as diferenças, a ser unidos nas adversidades, ser altruístas, ser mais racionais e sentimentais. 
À desocupação não significa o fim da luta, mas o início de uma luta muito maior, que vai unir pais, professores, alunos e toda uma comunidade em busca de uma educação de qualidade e de uma escola que não seja mera sessão de repetição de conhecimentos rasos, mas escolas que formem cidadãos, sirvam de espaço de convívio, incentivem a criança e o adolescente a seguir nos estudos.

Seimour Souza, estudante.



O Calçadão mais uma vez felicita a luta intensa de alunos, professores e pais em defesa da escolapública democrática e de qualidade! A ocupação do Otoniel Mota e a consciência política de seus alunos são exemplos para todos.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Balanço de 2015. Agradecimento e continuaremos juntos em 2016!


O ano de 2015 foi o ano de estreia do blog O Calçadão!

Um ano de muito trabalho e muito aprendizado.

Foram mais de 420 artigos (tratando de temas nacionais, estaduais e municipais), 9 entrevistas, 60 poemas (um diferencial do blog e que tem atraído muitos leitores) e mais de uma dezena de reportagens que nos colocaram em contato com os movimentos sociais de Ribeirão Preto e nos deram condições de descobrir e contar histórias de lutadores anônimos, de comunidades inteiras que encontraram em O Calçadão um parceiro e um canal de voz.

Estivemos presentes na campanha de 'descomemoração' dos 50 anos da Globo, nos dois atos da Frente Brasil Popular na Esplanada do Pedro II, na marcha das mulheres 'Fora Cunha', cobrimos vários encontros e eventos do movimento negro, estivemos nas ocupações de escolas, na luta contra a internacionalização do Leite Lopes, divulgando os atos da luta por moradia, enfim.

Consolidamos o blog como um canal político à esquerda e ligado ao movimento popular progressista.

Tivemos mais de 90 pessoas presentes no ato político em comemoração ao nosso primeiro aniversário no dia 4 de dezembro no Centro Cultural Palace.

Hoje temos um média de 3800 visualizações mensais, 1800 seguidores no facebook, um alcance de mais de 5 mil pessoas nas postagens mais populares. E vem mais por aí em 2016!

O blog vai mudar de plataforma para ganhar mais qualidade e interação, vamos produzir mais vídeos e reportagens.

Vamos intensificar nossa atuação junto ao movimento social já a partir de janeiro, servindo de vínculo para o encontro e o diálogo político e vamos estar preparados para a cobertura das eleições municipais do ano que vem sempre defendendo as bandeiras progressistas e atuando como um contra-ponto à mídia tradicional.

Agradecemos a todos os nossos amigos, leitores, parceiros, colaboradores. Contamos com todos vocês para tornar O Calçadão ainda mais forte em 2016!

Tiraremos esses dias de férias mas já no dia 1o de janeiro estaremos de volta com a corda toda.

Abaixo publicamos algumas fotos desse ano de 2015.

Viva O Calçadão e viva o movimento popular de Ribeirão Preto!

Grande abraço,

Equipe O Calçadão


terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Feliz Natal na comunidade Margarida Alves no Ipiranga!


Na tarde desta terça-feira, 22/12, o blog O Calçadão esteve na comunidade Margarida Alves, conhecida como 'Sete Curvas', no bairro Ipiranga em Ribeirão Preto, na companhia de Ádria Maria Bezerra e Sílvia Diogo, Presidente e Coordenadora da ong Casa da Mulher, e de Denise Marina Gonçalves, representando o Rotary Distrito 4540.

Foi uma visita de festa onde foram distribuídos brinquedos e bolachas para as crianças do local. Ali a ong Casa da Mulher desenvolve um importante trabalho o ano todo, levando assistência e informação para as pessoas da comunidade.

"Estamos concluindo uma parceria com a Secretaria da Saúde para que possamos fazer aqui um mutirão de limpeza e conscientização sobre a necessidade de se evitar o mosquito da dengue, da zica e do chicungunha", nos disse Ádria Bezerra.

A comunidade Margarida Alves é um dos mais de 50 núcleos de favela em Ribeirão Preto. São atualmente 30 mil pessoas morando em condições precárias na cidade e que sofrem também com a falta de endereço fixo e acesso aos equipamentos públicos de saúde, educação e assistência social.

Assim como em outras comunidades que o blog O Calçadão tem visitado, ali na Margarida Alves, entre as mais de 30 famílias do local, habitam sonhos, esperanças e luta de pessoas, de mães, de pais e crianças. O próprio nome da comunidade remete à luta da mulher brasileira: 'é melhor morrer na luta do que morrer de fome' é a frase eterna da líder sindical paraibana morta pela pistolagem.


O grave problema da moradia em Ribeirão Preto jamais será resolvido com remoções forçadas e exclusão, mas com uma visão social, humana e inclusiva. Com a solidariedade mostrada pelos próprios moradores, como nesta horta comunitária existente ao longo da antiga via férrea e que tem servido a todos.


Caminhando pela comunidade, na companhia da dona Joana Dárc Venâncio, vamos colecionando histórias de luta e superação.


No final, a alegria das crianças com os presentes doados pela Casa da Mulher e pelo Rotary.


O blog O Calçadão agradece à ong Casa da Mulher, ao Rotary e novamente se coloca à disposição para trazer ao conhecimento público os recantos esquecidos da cidade, recantos onde seres humanos lutam dia a dia com a ajuda e parceria de companheiros e companheiras valorosas como são neste caso as mulheres da Casa da Mulher e do movimentos de Mulheres Negras. Uma luta que não se esgota na conduta assistencial, mas que se prolonga na atuação de conscientização política e de busca pelos direitos de cidadania e moradia digna.

Voltaremos em breve à comunidade Margarida Alves e às outras comunidades para descobrir e contar mais histórias de luta e de vida, dando vez e voz ao movimento popular.

Ricardo Jimenez

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Os Trinta Anos do Axé! Por Rilton Nogueira



Até o inicio dos anos 80, as músicas tocadas pelos trios elétricos em Salvador eram apenas instrumentais e geralmente na linha dos frevos pernambucanos. Quando as músicas começam a ser cantadas, somente os homens podiam puxar os trios, ou seja, serem os vocalistas.

Os empresários, donos dos trios, achavam as vozes femininas muito agudas e acreditavam que os associados não aprovariam cantoras.  Nessa época, a música feita para o carnaval ficava restrita apenas a Salvador, Bahia e, quando muito, a alguns estados do Nordeste.

Somente em 1985 que um sucesso do carnaval soteropolitano sai da Bahia e se torna um hit que toma conta das rádios de todo o país, tratava-se de Fricote, primeiro sucesso do cantor Luiz Caldas.



No carnaval de 1987, a música Faraó, divindade do Egito, do grupo Olodum, aparece como um grande sucesso local e se torna um divisor de águas dentro da nova musica baiana. A letra fala sobre a criação do mundo utilizando para isso a historia egípcia. Com letras mais críticas e apenas instrumentos de percussão, o Olodum passa a influenciar os cantores de trio e preparava o que viria a ser o maior fenômeno musical dos anos noventa no Brasil, o Axé Music.

Dentro de um projeto musical chamado musica ao meio dia, em meados de 1992, um show no vão livre do museu de arte de São Paulo (MASP) se torna um marco na historia do Axé e da carreira da cantora que a partir daquele momento passa a ser a maior porta voz do ritmo que embalaria o país, Daniela Mercury.

Os shows desse projeto eram todos feitos por artistas iniciantes e que invariavelmente não chegavam a reunir mais do que três ou quatro centenas de pessoas. Ninguém sabe ao certo, mas o fato é que o show de Daniela Mercury no vão livre do Masp reuniu mais de 20 mil pessoas e parou a avenida Paulista. Menos de 40 minutos depois de iniciada a apresentação, a diretora do museu sobe ao palco e puxa a cantora pelo braço exigindo que o show fosse interrompido, pois a trepidação causada pelo grande aglomerado de pessoas pulando freneticamente colocava em risco as obras de arte ali expostas.

No outro dia todos os jornais da cidade estampavam em suas capas, ‘uma baiana para São Paulo’. Não sabiam nem o nome da cantora.

O show é transferido para o domingo na USP, onde reúne 30 mil pessoas e é transmitido ao vivo para todo o país pela tv cultura dentro do programa Bem Brasil. Nesse dia o programa bate recorde de público.

Manoel Poladian, grande empresário da música, fica preso no engarrafamento causado pelo show de Daniela e pede para que um ‘olheiro’ vá até o show da USP para se informar melhor de quem se tratava a tal baiana que havia ‘parado a Paulista’.

Depois disso, Daniela Mercury passa a ser empresariada por Poladian e assina contrato com a poderosa  Sony Music vindo no final daquele ano a gravar o álbum O canto da cidade , hoje  considerado pelos críticos especializados em música,  como o mais importante do Axé Music , passando a  figurar também na lista dos cem melhores discos do cancioneiro nacional de todos os tempos.

Mercury lembra que depois de assinado o contrato, a gravadora não queria que ela continuasse a cantar samba-reggae, uma vertente do Axé. Conta também que ao ouvirem a musica O canto da Cidade,  que tem como refrão os versos A cor dessa cidade sou eu, o canto dessa cidade é meu, acharam arrogante demais e ficaram com medo de que o público assim também pensasse. Mercury teve que explicar que ela não estava a falar de si nos versos dessa canção e sim do povo de Salvador. Foi também com a explicação de que ao contrário dos versos do rock Que país é esse ? que parece dizer ‘não quero esse país’ ou ‘que droga de país...’, o Axé dizia, não diga que não me quer, não diga que não quer mais, eu sou o primeiro que canta, eu sou o carnaval,  se tratava da autoafirmação de um povo que tinha no carnaval o seu momento de ir para rua, de se manifestar e fazer a sua revolução através da música, fazendo , por meio da arte, a sua crítica social.

Vencida essa batalha com a gravadora, o show O canto da cidade ganha um especial de fim de ano na tv Globo e a partir daí nasce o fenômeno Daniela Mercury. Nelson Mota, assim define a aparição da cantora: “uma Iansã vingadora, uma guerreira de espada na mão e pernas de fora, abrindo uma clareira de luz e alegria no meio das trevas ‘colloridas’ (alusão ao então presidente)” .

Com o álbum O canto da cidade, Mercury vende mais de 2 milhões de cópias e abre as portas para uma série de artistas baianos que na primeira metade dos anos 90 dominam o hit parade brasileiro. Banda Mel, Cheiro de amor, Kassia, Zé Paulo, Olodum, Simone Moreno Margareth Menezes, Timbalada, Banda Beijo e Netinho, entre outros artistas, a partir da vereda aberta por Mercury multiplicam seus shows com o destaque dado pela mídia.

Na segunda metade dos anos 90 ganham espaço na mídia novos artistas vindos da Bahia e com eles músicas de duplo sentido passam a dominar as rádios nacionais, o maior representante desse estilo é o grupo Gera Samba. Os refroes: E diga yes, diga yes, sou negão/ minha jangada vai sair pra o mar, vou trabalhar, meu bem querer/  minha pele de ébano é minha alma nua/ Não me pegue não, me deixe a vontade, deixe eu curtir o Ilê, o charme da liberdade/A gente não pode comer arroz, a gente não pode comer feijão, ainda tem que andar descalço sem ter que pisar no chão... foram substituídos por segure o tcham, amarre o tcham, segure o tcham , tcham , tcham, tcham, tcham/ e vai descendo na boquinha da garrafa/ é a dança do maxixe, é um homem no meio com duas mulheres fazendo sanduiche/ bota a mão no joelho, dá uma impinadinha, vai descendo gostoso balançando a bundinha.

Apesar do grande sucesso, esses cantores de axé surgidos a partir da segunda metade dos anos 90 se tornam alvo de crítica pelo conteúdo fraco de suas letras e pela sexualidade exacerbada através de suas danças. Quem não se lembra de Carla Peres?

Em 1996 o som dos tambores do Olodum ecoa pelo mundo através do vídeo clipe que o cantor Michael Jackson vem gravar com o grupo no Brasil. Trata-se da música They don’t care about us.

 E quem pensa que essa é a primeira vez que os tambores do Axé fazem a cabeça de ícones do pop internacional está errado, pois, em 1990, Paul Simon já havia gravado uma música e um clip com o Olodum no Pelourinho, trata-se da música the obvious child.

 É importante frisar que o Olodum não é apenas uma banda, mas também um bloco afro e   uma organização não governamental que nasceu no final dos anos 70 em Salvador. O grupo tem como objetivo o combate à discriminação racial, a preservação da cultura afro-baiana e o ensino de percussão para crianças e adolescentes, tirando-os das ruas. A primeira vez que o bloco desfila foi no carnaval de 1980. A ideia era que as pessoas das comunidades pobres também pudessem brincar o carnaval, para isso utilizaram como instrumentos musicais os tambores das fanfarras disponíveis nas escolas públicas. Como em Salvador existem centenas de terreiros de candomblé e como todos sabem que para se realizar os rituais dessa religião os instrumentos de percussão são imprescindíveis, já se tinha na comunidade um considerável número de músicos para o desfile. 

O que se fez com o passar do tempo foi aperfeiçoar a batida. A inovação veio com a utilização de baquetas de bambu ao invés das tradicionais, essas, mais tarde foram substituídas por baquetas plásticas, o que veio a gerar um som característico que, sob a regência do maestro Neguinho do Samba, deu vida ao que foi batizado como samba-reggae.

Em 1997 um disco gravado ao vivo pela Banda Eva, que tem Ivete Sangalo como vocalista, começa a ganhar as rádios de todo o país e em poucos meses salpica o verão de 97 e 98 de hits como Vem meu amor, Pequena Eva, Arerê e Beleza rara. Ivete Sangalo passa a disputar com Daniela Mercury o titulo de rainha do Axé, assim como foi no passado a disputa entre Emilinha Borba e Marlene pelo titulo de rainha do rádio. 

Obviamente que a disputa não se dá entre Mercury e Sangalo, mas sim entre os fãs que eram e são alimentados pela mídia para enxergar uma disputa e até mesmo rivalidade que não existe entre as duas cantoras. No ano de 1999 Sangalo deixa a banda Eva e segue carreira solo, emplacando o hit daquele verão, Canibal, música que lembra muito o estilo da paraibana Elba Ramalho no inicio da carreira.

Os anos 2000 chegam e uma nova cantora de Axé surge no cenário musical, Claudia Leite, ainda à frente da banda Babado Novo. Como era de se esperar, após alguns sucessos radiofônicos a cantora deixa a banda e segue carreira solo. A partir daí a disputa passa a ser entre Leite e Sangalo. Mercury dá outro rumo a seu trabalho e passa flertar com a MPB e com a música eletrônica. Em seu álbum intitulado Sol da liberdade, gravado em 2000, faz parceria com Milton Nascimento, Lenine, Vanessa da Mata, Dudu Falcão e Caetano Veloso. A regravação de Como vai você , de Antonio Marcos, entra na trilha sonora da novela Laços de Família e se torna a música mais executada no Brasil naquele ano.

Os anos se passaram e outros gêneros musicais foram ganhando destaque na mídia e o Axé encolhendo. No entanto, sabemos que isso é natural e ocorreu com todos os ritmos, a mídia precisa de novidades. O fato é que os artistas que tinham talento e que apareceram para o país e para o mundo através desse gênero se estabeleceram e consolidaram suas carreiras. Prova disso são as musicas do filme americano Rio, que foi composta por Sergio Mendes e Carlinhos Brown que chegou a concorrer ao Oscar como melhor trilha sonora, ou o convite feito à Daniela Mercury para participar do álbum em tributo a Ênio Moricone, compositor de trilhas sonoras de diversos clássicos hollywoodianos.

Segundo Motta, hoje ninguém sabe a fronteira entre o axé e a música baiana de festa, mas todos concordam que o estilo está em transformação permanente e que fundou um novo mercado para a música da Bahia, que produz grandes músicos e grandes marqueteiros.

Rilton Nogueira é professor e responsável pela parte cultural do blog O Calçadão



sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Sem golpe e sem Levy. O bom fim de ano de Dilma!


Temos muito pouco a comemorar politicamente neste ano de 2015, pois graças a uma posição irresponsável e baixa do PSDB, e de seu candidato derrotado, o Brasil perdeu um ano!

Pior, nesta louca caminhada golpista, os derrotados tucanos, e a mídia amiga, encontraram Eduardo Cunha, e sua bancada formada na base de (até agora) 90 milhões em propinas, e Temer, com suas cartas, aliados, infidelidades e desejos conspiratórios.

O Brasil passou a conviver com a mais sórdida estrutura política já montada para cassar à força a vontade popular expressa no voto e, de quebra, avançar com uma agenda retrógrada sobre direitos individuais e coletivos conquistados ao longo de décadas, além de implantar o neoliberalismo sem o consentimento popular.

Também não há muito o que comemorar quanto ao governo. A inacreditável guinada na economia feita por Dilma logo ao assumir o segundo mandato ainda reverbera na população. Movimento catastrófico que inclusive fortaleceu seus inimigos, que passaram a apostar no 'quanto pior, melhor' para pavimentar o golpismo, tendo como um de seus braços os movimentos de rua proto-fascistas.

Mas o fim do ano termina bem para Dilma. Ela acaba de se livrar do incompetente Joaquim Levy e, peitando a Globo (que tratava Levy como um super ministro, como o braço tucano dentro do governo), nomeia o bom e estratégico Nelson Barbosa. Dilma mudou. Boas perspectivas à vista.

Essa mudança vai para a conta da Frente Brasil Popular. Colocar 50 mil na Paulista e 20 mil na Cinelândia numa quarta-feira  foi fundamental. Em torno da pauta acertada e ampla (Contra o golpismo, Fora Cunha e Muda Dilma) se uniram sindicatos, movimentos sociais, artistas, intelectuais, juristas. Foi o grande movimento do ano e, ao que parece, o governo ouviu.

Dilma vai para o fim do ano com batalhas postadas no horizonte, mas confiante diante da atuação do STF. Garantindo a legalidade, o Supremo aponta um futuro mais seguro. Dilma ganhou força para enfrentar o impeachment no Parlamento e o Brasil ganhou esperança do afastamento de Cunha, conforme pediu o Procurador-Geral.

Outro ponto importante é com relação à Lava-Jato. Tudo também vai se decidir no Supremo e, além disso, a prisão de Delcídio pela primeira vez joga as investigações para além de 2003, incluindo o governo FHC (que já devia estar sendo investigado há tempos). É aguardar.

Terminamos 2015 vivos, unidos, atuantes e vigilantes.

Bom fim de ano, Dilma.

Em frente!

Ricardo Jimenez


Carroças e animais: uma combinação anacrônica. Por Marcelo Botosso



       Ao longo do tempo o animal humano desenvolveu a consciência, característica essa que o colocou numa categoria particular em relação às demais espécies existentes no planeta Terra. Com isso ele percebeu que poderia subjugar outros seres vivos ao seu favor, incluindo seus pares. Foi o que ocorreu com a submissão de espécies como cães, gatos, cavalos, suínos, aves, plantas, pessoas tiradas à força da África, entre tantas outras. O Humano tornou-se o único animal agro pastoreio da Terra. Para tanto, ele desenvolveu um mecanismo que hoje chamamos de domesticação. 
            
     A palavra domesticação, bem como domicílio, tem o seu radical na palavra latina “domus”, que por sua vez remete-se a domínio. Portanto, colocar alguém sob o seu “domus”, em linhas gerais, é o mesmo que dominá-lo. Se conseguir fazer com que um ser sobreviva em sua casa, fora de seu habitat originário, seja por coerção ou por meios sutis de cooptação, você o terá dominado em seu domicílio, logo, o domesticado. 

    Na origem, ele não pertence àquele lugar. Sendo assim, podemos concluir que domesticar aplica a uma forma eufemística de escravizar (As domésticas que o digam. A conquista por garantias trabalhistas dessa categoria profissional estremeceu os herdeiros da “Casa Grande”). Transforma-se aquele agregado domiciliar em um dependente seja pela via do alimento, do abrigo, do afeto, da ideologia e até mesmo do salário, este o maior instrumento escravizador da era moderna.

     Com a capacidade de domesticar, o bicho homem não poupou em utilizar a força muscular de animais mais fortes a seu bel-prazer. O maior exemplo disso e que transcende séculos é o uso de equinos e muares como um meio de transporte e de deslocamento de cargas. Exemplo corrente, sobretudo, nas zonas rurais e subúrbios das grandes cidades brasileiras como Ribeirão Preto, no Estado de São Paulo. Na esquecida zona norte ribeirão-pretana, o trânsito de carroças e o confinamento de animais em terrenos baldios são marcantes.

      Uma verdadeira rede de (re) produção e comércio se fez entorno da força muscular animal. Bois, junto de animais humanos, tocaram engenhos, transportaram cargas pesadas em carros tão pesados quanto eles. Cavalos agilizaram o transporte muitas vezes vencendo distancias inimagináveis com força e rapidez. Assim como mulas, burros e jumentos carregaram no lombo produtos de interesse comercial que subiam e desciam às serras no vai-e-vem entre portos litorâneos e as minas das Gerais.

        É inegável o quanto a humanidade se beneficiou com a força animal, propiciando um desenvolvimento tecnológico que hoje, através de máquinas, possibilita o deslocamento de cargas que nem o maior dos mamíferos sequer moveria. São quilos e toneladas. A engenhosidade humana parece não ter limites. Contudo, uma realidade persiste: a existência de carroceiros. Estes são condutores de primitivos veículos de tração animal - as carroças, charretes e carruagens - muitos deles de construção artesanal, que parecem fossilizados no tecido civilizatório frente às novas tecnologias.

      A existência do carroceiro não condiz com a atual realidade, seja ela de peso de cargas, trânsito de veículos, ruas e avenidas movimentadas, temperatura, composição atmosférica, qualidade do ar, exposição solar e mesmo de valores que se modificam e evoluem ao longo dos anos.  O carroceiro tenta impor ao animal o ritmo dos novos tempos. Quando este fisicamente não aguenta, adoecendo e indo a óbito, de maneira rápida é substituído por outro que poderá ter o mesmo destino, antes passando por muito sofrimento e dor.

     Mesmo os animais aparentemente bem cuidados pelos seus carroceiros, não fogem à regra de algo cujo tempo ficou para trás. O conhecimento humano, na sua forma mais ampla, se incompatibiliza com a existência do uso de veículos de tração animal.

      Urgem leis e políticas públicas que transformem essa realidade e que sejam elaboradas para sua efetiva aplicação, seja no âmbito municipal, estadual ou federal. Mas não basta a proibição com um simples decreto que, como num passe de mágica, mudaria essa situação de animais humanos e não humanos. A complexidade e a urgência necessitam de rápida reflexão e, por conseguinte, ação. O sofrimento de outras espécies não se compatibiliza com a cultura de paz que todos nós desejamos.

      Espera-se das autoridades maior sensibilidade a essa questão, pois a sociedade está cada vez mais atenta e organizada. O próprio mercado já sabe disso. Vide os produtos veganos, aqueles que não têm origem animal direta ou indireta. Eles se proliferam nas redes de comércio em lojas virtuais e prateleiras de supermercados.

       Portanto, deseja-se a sobrevivência, tão somente, de veículos de tração animal que são impulsionados por aqueles bichos chamados de racionais.


         Vão-se as carroças, ficam as bicicletas.

Marcelo Botosso é historiador e montanhista clássico

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