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quinta-feira, 20 de janeiro de 2022

Os limites da vereança não limitam a luta política

 


Muitas vezes fazemos uma discussão sobre a importância do papel de um mandato parlamentar em nível municipal, ou seja, de um vereador, vereadora ou, como tem ocorrido cada vez mais, de um mandato coletivo. 

Uns acreditam que o mais importante é a luta social, por fora da institucionalidade. Outros veem na vereança um poder concreto de atuação em prol da transformação através de políticas públicas.

Neste caso, acredito que o caminho está, de fato, no meio termo. A vereança tem limites dentro da institucionalidade mas tem um papel importante na organização da luta política dentro e fora dela. 

Essa é a perspectiva pela qual eu quero me pautar nesse diálogo sobre a participação dos mandatos populares e de esquerda na Câmara de Ribeirão Preto e a contribuição na luta política da cidade.

OS LIMITES DA INSTITUCIONALIDADE

A Câmara de Vereadores é conduzida pelo seu Regimento Interno, documento que integra a Lei Orgânica do Município. De acordo com esses documentos balizadores, a Câmara e os vereadores têm algumas funções básicas: elaborar leis, fiscalizar o Poder Executivo (realizando o controle externo), propor emendas à Lei Orgânica, votar e propor emendas às peças orçamentárias (LDO, LOA e PPA), função processante de vereadores, Prefeito e vice, propor Comissões parlamentares de Inquérito (CPIs) e Comissões Especiais de Estudos (CEEs), encaminhar requerimentos ao Executivo etc.

Isso além de usar da palavra durante as sessões ordinárias e extraordinárias (instrumento também regrado pelo Regimento sob controle da Mesa Diretora, principalmente do Presidente da Casa) e participar de comissões temáticas (permanentes ou temporárias).

A dinâmica de utilização de todos esses instrumentos passa pelo poder da Mesa Diretora e da maioria do Plenário. Na Câmara de Ribeirão, a Mesa Diretora é composta do Presidente, dois vice-presidentes e dois secretários. Cinco mandatos que expressam a maioria constituída em Plenário. 

Em 2021 e 2022, a Presidência será exercida por Alessandro Maraca (MDB), vereador próximo do projeto político do Prefeito Nogueira, cujo partido participa da Administração através da ex-candidata a Prefeitura Cris Bezerra (Coordenadora do Instituto do Livro) e que, em 2022, para ser reeleito, teve de alterar um acordo interno no denominado "grupo dos 18" que indicava que a Presidência seria exercida este ano pelo vereador de oposição Jean Coraucci (PSB).

VEJA AQUI E AQUI OS RESUMOS DE TODAS AS SESSÕES DO ANO DE 2021 COM AS ANÁLISES POLÍTCAS E POSICIONAMENTOS DE CADA GRUPO DE FORÇAS REPRESENTADO NA CÂMARA

Apesar do Plenário ser "soberano" nas decisões internas, o papel de um mandato individual ou de um conjunto minoritário de mandatos (como é o caso dos atuais 4 mandatos de esquerda: Coletivo Judeti, Coletivo Ramon, Duda e França) é limitado dentro da Casa pois o exercício de todos os instrumentos de atuação elencados no início do artigo dependem de articulação e aprovação da maioria. Às vezes uma maioria dos presentes, às vezes uma maioria simples do conjunto de vereadores eleitos, às vezes maioria qualificada de 2/3 dos mandatos eleitos.

Esse limite institucional não se expressa apenas na aprovação de leis, requerimentos e emendas, mas também se expressa na participação nas comissões temáticas, principalmente naquelas mais decisivas com relação aos interesses do Executivo e cujas presidências são exercidas pela definição da maioria do Plenário.

Hoje o Plenário é controlado por uma maioria de 18 vereadores, base da eleição e reeleição de Alessandro Maraca em 2021 e 2022. É o "grupo dos 18". Mas, do ponto de vista de apoio ao Prefeito, temos uma maioria de 13 mandatos alinhados: Alessandro Maraca (MDB), Eleizeu Rocha (PP), Gláucia Berenice (DEM), Igor Oliveira (MDB), Brando Veiga (Rep), Isaac Antunes (PL), Franco Ferro (PRTB), Bertinho Scandiuzi (PSDB), Matheus Moreno (MDB), Maurício Vila Abranches (PSDB), Maurício Gasparini (PSDB) Paulo Modas (PSL) e Renato Zucolloto (PP).

Nessa maioria de 13 mandatos, têm destaque três: Alessandro Maraca como Presidente da Casa, Isaac Antunes como líder do governo e Renato Zucolotto tido pelo governo como o voto "técnico" em defesa dos projetos do Executivo.

A oposição a Nogueira conta a rigor com 6 mandatos. Quatro integram a "frente de esquerda" (que não votou em Maraca nem em 2021 nem em 2022): Coletivo Popular Judeti Zilli PT, Duda Hidalgo PT, França PSB e Ramon Todas as Vozes PSOL. Os outros dois mandatos são de Lincoln Fernandes (PDT) e Jean Coraucci (PSB), integrantes do "grupo dos 18".

Essa oposição não é muito coesa e não tem uma articulação centralizada em um "líder da oposição".

Ainda considero existir três mandatos "independentes" com relação ao Prefeito. Zerbinato (PSB), Marcos Papa (Cidadania) e André Rodini (Novo). Neste grupo, Papa e Rodini entregaram votos importantes para o Prefeito nos projetos de reforma administrativa e terceirizações.

Esse arranjo interno, que demonstra claramente a correlação de forças dentro da Câmara, também se reflete na composição das comissões temáticas, principalmente as mais importantes como: Constituição e Justiça (há alguns anos sendo presidida por Isaac Antunes), Finanças e Orçamento (hoje presidida por Renato Zucoloto), Educação (presidida por Gláucia Berenice), Conselho de Ética e Obras e Planejamento (que encaminha as questões do Plano Diretor).

Qual o papel da oposição diante desse cenário? Qual a importância da atuação parlamentar na luta política em Ribeirão?

Claro que com uma oposição de 6 mandatos em um cenário de 22 (sendo que 13 desses constituem a maioria governista e dois dos mandatos de oposição não se somam ao campo de esquerda) impossibilita uma interrupção à política neoliberal implantada pelo PSDB de Nogueira em Ribeirão Preto desde 2016 e continuada após a reeleição em 2020.

Não é esse o papel dos mandatos de esquerda e eles não podem ser cobrados por isso. A luta não pode ser matemática ou simplesmente de registro de"resultados".

A realidade concreta tem mostrado que a luta política é dentro e fora da Câmara, feita não somente pelos mandatos, mas é uma luta articulada.

Ano passado tive a oportunidade de dialogar com o vereador Ramon Faustino, do Todas as Vozes, assim como faço frequentemente com integrantes dos outros mandatos de esquerda, e falamos sobre o papel da esquerda dentro da Câmara na luta institucional. Concordamos que o papel é "plantar sementes".

E é isso. Apesar de não haver força numérica para barrar o projeto neoliberal implantado na cidade, há a força da atuação política e o levantar de bandeiras que se somam ao esforço coletivo de diálogo com a população sobre a possibilidade de outro projeto de cidade.

Esse "plantar de sementes" tem de se dar dentro da Câmara e fora da Câmara. pelos vereadores de esquerda, pelos militantes, pelos partidos políticos e pelos movimentos sociais. É um esforço que exige articulação, atuação e projeto.

Convido para quem ainda não leu que leia os resumos do ano legislativo de 2021 (AQUI E AQUI). Foi a oposição, especificamente os mandatos de esquerda, que levou para o debate a contraposição à reforma administrativa, levantando a importância do serviço público e dos servidores. Foi a oposição que denunciou e segue denunciando os prejuízos da política irrestrita de terceirizações na educação e na saúde. Foi a esquerda que levou para dentro da Câmara a defesa de direitos básicos de cidadania para negros e negras, LGBTs, mulheres, sem teto, sem terra e pessoas em situação de rua. E todas essas lutas tiveram, em maior ou menor grau, uma conexão com o movimentos social, seja num diálogo ou mesmo na presença física dentro da Câmara nas votações. Foi a esquerda que alertou para o viés não social das peças orçamentárias aprovadas pelo governo.

Ou seja, a esquerda apontou, mesmo que de forma não literal, uma nova perspectiva de cidade. Uma cidade que se erga sobre a garantia de direitos sociais para todos e todas.

Tenho insistido há alguns anos e ainda insisto por acreditar que a unidade, a articulação e a confecção de um projeto popular sejam os caminhos para buscar o fortalecimento do campo popular na perspectiva de voltar a assumir o poder em Ribeirão.

Em 2016 foi criado pelos movimentos sociais, com a participação de O Calçadão, do Fórum de Movimentos Populares, que atuou por 2 anos. É preciso retomar essa ideia, integrar os mandatos de esquerda, integrar os partidos de esquerda e construir uma mínima unidade em torno da construção de um projeto que direcione a atuação em todos os espaços de luta.

O objetivo é levar a mensagem à população. E isso é possível apesar de não ser simples.

Sei que o ano de 2022 é complicado por conta da eleição nacional e das incertezas que cercam a constituição ou não das Federações. Mas fica aqui lançado o convite aos presidentes do PT, PSOL, PCdoB, PCB, UP e, mesmo com todas as divergências, com o PSB, PDT e Rede. Fica o convite aos companheiros do MST, dos movimentos por moradia, dos coletivos feministas, dos movimentos de juventude, LGBTs, coletivos negros, associações de moradores e mandatos parlamentares: por que não fazer uma Conferência Municipal do Campo Popular em 2023 em Ribeirão Preto? 

Poderia ser preparada esse ano a partir de diálogos setoriais e internos. Poderia ser um momento fundamental de fortalecimento para as tomadas de decisões e lutas políticas do também importante ano de 2024 para a nossa cidade. Unidade, projeto e luta. 

Ricardo Jimenez - Editor de O Calçadão e Membro do Diretório Municipal do PT de RP

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