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segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

 É preciso derrotar o bolsonarismo, mas necessário vencer Dória

A aprovação ontem pela Anvisa da vacina Coronavac, fabricada pelo Instituto Butantan em parceria com o Laboratório chinês Sinovac e, logo em seguida, o espetáculo midiático em torno da vacinação da 1ª pessoa no Brasil (realizada com própria Coronavac), deu ao Governador de São Paulo, João Dória (PSDB), uma vitória importante na corrida presidencial de 2022.

A transmissão de ontem correu o Brasil e está hoje estampada em todos os jornais. É uma vitória especialmente para a ciência e para os cientistas, uma vez que, em um curto intervalo de tempo, os pesquisadores conseguiram criar e testar uma vacina que seja minimamente eficaz contra o novo coronavírus, mesmo com poucos recursos (caso do Brasil) e com tantos obstáculos (um pesquisador ontem relatou até ameaças de morte).

João Doria, esperto como um político oportunista, aproveitou e esteve presente durante toda a transmissão, apareceu no quadro da foto da 1ª imunizada e, por fim, atacou o presidente Jair Bolsonaro e sua política negacionista em torno da pandemia e da vacinação. Dória fez do presidente Bolsonaro seu principal adversário político, aproveitado a alta rejeição do presidente, seu discurso negacionista e os péssimos números da economia.

Desde o início da pandemia, Doria e Bolsonaro intensificaram a troca de acusações (que já vinha ocorrendo logo após as eleições de 2018). Aproveitando o discurso negacionista (e mortal) do presidente, Dória se contrapôs a ele e, desde então, adotou um discurso embasado pela ciência, em favor da vida, posando ao lado de médicos, especialistas e pesquisadores. Também cuidou de acenar ao empresariado dando participação nas decisões acerca da pandemia e fazendo concessões em relação a reabertura da economia.

Doria também foi esperto ao aproveitar que o discurso negacionista do presidente iria se estender às vacinas. Apostou na vacina do Instituto Butantan e contou com a incompetência administrativa do Governo Federal que não conseguiu comprar e adquirir outros imunizantes e teve de se render ao Estado de São Paulo para conseguir imunizar (ao menos, acalmar) os brasileiros: a requisição do Governo Federal ao Instituto Butantan via ofício de todas as doses que estão em posse do Estado é um atestado de incompetência do Governo Federal e uma ótima propaganda política ao governador.

Assim, depois de surfar na onda antipetista, lavajatista e bolsonarista, Doria agora surfa na onda antibolsonarista. Mas é preciso destacar que em termos práticos, para todos nós trabalhadores: Doria é Bolsonario e Bolsonaro é Doria. Bolsodoria foi o slogan vencedor do 2º turno das eleições em 2018 e o projeto político que os une é muito maior que a pequena diferença ideológica em torno da pandemia que os separa (se é que há???!!!!).


Devemos lembrar que em 2016, a campanha de Doria pela Prefeitura de São Paulo foi embalada pela Operação Lava-Jato que desde 2014 arrasava os quadros do PT (que à luz atual se mostrou extremamente parcial,  seletiva e destrutiva de nossa economia) e pelo Golpe contra a presidenta Dilma encabeçado e aplaudido por uma seleta parte da população (e ‘com o Supremo com tudo!’) vestidos de camisas verde amarela na ruas em cantos entoados ‘contra a corrupção’. Doria venceu ainda no 1º turno a disputa pela maior cidade do país, São Paulo, contra o então prefeito Fernando Haddad do PT que tentava sua reeleição. A vitória ainda no 1º turno embora tenha sido uma surpresa, foi apenas o resultado da onda antipetista que naquele ano dizimou os quadros do partido reduzindo drasticamente o seu alcance nas prefeituras em todo o país.

Já naquele ano, Doria foi esperto, percebeu o movimento antipetista e ‘antipolítico-partidário’ das manifestações que tomaram as ruas do país, se colocou como uma via alternativa, como um ‘outsider’, como um empresário bem-sucedido que trazia para a carreira pública toda aquela bagagem e disposição para arrumar as contas da prefeitura. Com apoio a mídia paulista, o discurso ganhou coro e venceu com até certa facilidade aquela eleição.  

Em 2018, mesmo tendo assinado e registrado um documento se comprometendo a terminar o seu mandato como prefeito na capital paulista (prática comum entre mandatários PSDBistas), João Doria disputou e venceu as conturbadas prévias do PSDB para o governo do estado (comandado pelo partido desde 95!). Ele renunciou ao cargo de prefeito tendo cumprindo apenas 2 anos de mandato. Durantes as prévias, o próprio PSDB rachou e foi tomado por inúmeras acusações. Há de se destacar também, que já naquele momento Doria se interessava na disputa pela Presidência da República. Porém, naquele momento, a sigla optou pelo então governador de São Paulo Geraldo Alckmin, mas a disputa interna nos bastidores deixou muitos ruídos. 

 

A disputa pelo Palácio dos Bandeirantes em 2018 foi para o 2º turno entre Doria (PSDB), que vinha de uma vitória acachapante em 2016, e Marcio França (PSB) vice-governador de Geraldo Alckmin por duas vezes (2010 e 2014) e atual governador do Estado (após a renúncia de Alckmin que veio a concorrer à presidência). Novamente oportunista, Doria percebeu a onda bolsonarista e conservadora que se alastrava no país e no Estado de SP. Oportunista, buscou se associar ao candidato à presidência, que tinha a preferência dos votos no Estado e associou o seu oponente ao petismo por seu partido (PSB) ter apoiado a presidenta Dilma em seu governo: era dobradinha BolsoDoria versus a dobradinha FrançaHaddad. Em uma eleição muito disputada, mesmo estando um pouco atrás nas pesquisas nos últimos dias, Doria venceu a eleição por uma pequena margem que provavelmente foi garantida pelo bolsonarismo conservador naquela eleição marcada por propagação de fake-news e discurso de ódio nas redes sociais e grupos de whatsapp.

Há um ditado que diz: “Não há vácuo na política”. Enquanto a esquerda e centro-esquerda não entram em acordo em torno de um nome viável e uma grande parcela da população não se sente nem um pouco representada pelo projeto bolsonarista, Doria vai se colocando com um nome altamente viável para a disputa em 2022 se contrapondo ao discurso bolsonarista. A cena de ontem não foi obra do acaso! Ela foi minimamente planejada ao longo dos últimos meses e ocorreu conforme esperado com grande apoio da mídia hegemônica. A cena de ontem e toda a disputa em torno das medidas contra o novo coronavírus projetou o nome de Doria para além das fronteiras do Estado de São Paulo de forma bastante positiva como um gestor assessorado por especialistas e preocupado com a população em contraposição ao discurso bolsonarista (que parece só se preocupar com sua própria família).

Esse discurso além de ganhar projeção, ganha aderência, em especial dos desavisados que não sabem que o projeto político de Doria é o mesmo de Bolsonaro e Guedes: um projeto privatista, de desmonte dos serviços públicos e de ataque ao funcionalismo, aos aposentados, aos benefícios e programas de assistência. Não nos enganemos: em última instância Doria é o Bolsonario de pulôver.


 

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